GILFRANCISCO [*]

Seu descobrimento é atribuído ao navegador florentino Américo Vespúcio, que navegou em sua foz em 1501. A 4 de outubro desse mesmo ano, uma expedição de reconhecimento descia a costa brasileira, rente ao litoral comandada por André Gonçalves e Américo Vespúcio e vinda do Cabo de São Roque. O nome é homenagem a São Francisco de Assis, festejado naquela data. Outra expedição em 1503 chegou a foz comandada por Gonçalo Coelho, outra vez com Américo Vespúcio.

O Rio São Francisco nasce no Chapadão da Zagaia na Serra da Canastra, no município mineiro de São Roque, a mais de 1000 metros de altura. O chapadão é varrido por fortes ventos devido a sua altitude, e não tem vegetação de grande porte. É uma área quase de difícil acesso. A poucos metros de sua nascente, o rio já se mostra vigoroso. Logo ao passar sob a primeira ponte, a 100 metros de onde começa seu caminhar, as pedras do leito em formação o faz cantar.

Vinte quilômetros à frente, robustecido com as águas de diversos mananciais, o Velho Chico dá seu primeiro grande salto: a cascata de Pedra D’Anta ou Casca Danta, no dizer do povo da região. A queda tem 200 meros de altura. E se localiza em um ponto totalmente inexplorado, por seu acesso muito dificultoso.

Descendo a serra, o São Francisco atravessa um mundo diversificado de paisagens e de acidentes na topografia. A partir do salto de Pirapora, próximo à cidade homônima, ainda em Minas Gerais, inicia-se o chamado médio curso, entre cerca de 480 e 370 metros de altitudes, em que o rio é navegável, por 1.300 km, até Juazeiro (BA) e Petrolina (PE), que são ligadas por uma ponte sobre o volumoso curso d’água.

Esse é o trecho em que o rio atravessa o sertão semiárido, onde a maioria de seus afluentes é temporária e em que o São Francisco assume um papel fundamental, quer como fonte de abastecimento de água, quer como via de comunicação.

Apesar de relativa perda de importância do transporte fluvial devido à expansão da malha rodoviária, as embarcações denominadas gaiolas ainda navegam entre Pirapora e Juazeiro, transportando passageiros e mercadorias. Aí se criou toda uma cultura regional fortemente influenciada pela presença do rio na vida da população ribeirinha – Barra e Bom Jesus da Lapa, dois centros urbanos à margem do Velho Chico na Bahia, são dois centros de peregrinação religiosa.

Um longo trecho encachoeirado, abaixo de Juazeiro, marca a passagem do planalto para a planície. Situam-se aí as quedas de Paulo Afonso – o sumidouro dos antigos – que despenca, em colchões, suas volumosas águas numa queda de 80 metros que só véu de noiva, frequentemente enlaçado, nas horas de sol, das cores do arco-íris.

Depois vem Itaparica. O restante do baixo curso, até a foz no Atlântico, desenvolve-se na planície litorânea. É significativo o aproveitamento do potencial hidroelétrico do São Francisco no seu alto curso: a Usina de Três Marias abastece parte da região sudeste, as usinas de Paulo Afonso, Itaparica e Moxotó, no baixo curso, fornecem energia para o Nordeste.

A necessidade de regularização do débito no médio curso, sujeito aos efeitos das secas prolongadas, levou à construção da barragem de Sobradinho e à formação de um lago que, em alguns trechos, tem mais de 30 quilômetros de largura. Até chegar à sua foz, o generoso rio serve a cinco Estados – Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas, passando por 521 municípios, formando uma bacia de 603 mil quilômetros quadrados de área, que têm no São Francisco a base de seu desenvolvimento social e econômico.

O Rio São Francisco proporciona às populações ribeirinhas a pesca artesanal ou industrial, fornecendo o sustento do pescador e de sua família, abastece as comunidades de água, movimenta grandes usinas hidroelétricas e irriga vastas extensões de terras, permitindo a prática de uma agricultura moderna e lucrativa.

É ainda o Velho Chico portentosa via de comunicação com mais de dois mil quilômetros navegáveis. Como se isso não bastasse, às suas margens desenvolvem-se ainda atividades artesanais variadas. O rio é, também, fonte de inspiração para a literatura brasileira.

Mas, todo esse poderio, toda essa generosidade, está ameaçado, de pouco valendo o seu caráter de rio da unidade nacional. Caso não sejam tomadas urgentes medidas, cuidados essenciais, dentro de aproximadamente cinco décadas o São Francisco estará completamente esgotado.

Estado e sociedade civil somam esforços para revitalizar e promover desenvolvimento humano e ambiental numa das áreas mais frágeis e vulneráveis de Sergipe, o território do Baixo São Francisco, composto por 13 municípios ribeirinhos: Canindé do São Francisco, Poço Redondo, Porto da Folha, Gararu, Nossa Senhora de Lourdes, Canhoba, Amparo do São Francisco, Telha, Propriá, Neópolis, Santana do São Francisco, Ilha das Flores e Brejo Grande. Do lado oposto, a região alagoana banhada pelo Velho Chico e também pelo litoral oceânico, tem em seu patrimônio natural, cultural e arquitetônico uma característica marcante. São 11 municípios: Delmiro Gouveia, Olho D’água do Casado, Piranhas, Pão de Açúcar, Belo Monte, Traipu, São Braz, Real do Colégio, Igreja Nova, Penedo e Piaçabuçu.

(Texto do livro Esboço Histórico e Geográfico do Baixo São Francisco, de Antônio Xavier de Assis, 1870-1939)

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[*] Jornalista e escritor. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com