No mês em que a Campanha Janeiro Branco chama a sociedade para refletir sobre a saúde mental, o teatro também ganha destaque e tem beneficiado pacientes psiquiátricos em Sergipe. Audevan Caiçara é ator e professor de teatro, graduado pela UFS e especialista em Psicodrama. Há quase 3 anos na Equilíbrio Clínica Dia em Aracaju, ele faz com que através da técnica os pacientes possam expressar sentimentos, emoções e situações que gostariam de ressignificar.
Em entrevista, o instrutor explicou como a arte traz melhorias aos quadros dos pacientes. “Através da expressão, conseguimos desenvolver habilidades como criatividade, espontaneidade, ludicidade, comunicação objetiva e assertiva, integração, protagonismo, entre outras. Temos a possibilidade de diversão, reflexão e experimentação em quatro dias da semana, em dois dias eu facilito as aulas, e em outros dois dias ficam com o professor de teatro, o ator Tinho Torquato”, explica.
A sala do teatro representa um laboratório sensível. “Lá podemos encontrar diversas maneiras de expressão daquilo que se apresenta como urgente, e que podemos compartilhar e refletir sobre, a partir dos parâmetros teatrais. É pela improvisação, por exemplo, que se pode encenar uma inquietação, uma ideia, um pensamento. E também, a partir do teatro, podemos ressignificar tal pensamento. Reelaborar. Gosto da palavra elaborar porque nos dá uma perspectiva de trabalho, de labor, e assim o é. Exige realmente um esforço físico e mental para pensar, repensar, olhar e reolhar para um acontecimento, para uma relação, para um personagem, e executá-lo em cena”, afirma.
Em resumo, as aulas são práticas, permeadas de conteúdos e técnicas teatrais aliadas a comunicação com as vivências dos pacientes e suas individualidades. “Pelo poder de versatilidade, as aulas são divertidas, intrigantes, confrontantes, mas são sempre dinâmicas, vivas. Há uma pulsão de vida. É preciso se deixar disponível para a aula. Tudo o que a minha formação teatral me trouxe e traz, já que estou sempre em busca de aperfeiçoamento, tento levar às aulas de teatro. A improvisação e interpretação são, com certeza, as técnicas que mais estão presentes. O Teatro Esporte acaba servindo de inspiração e campo para experimentar temas e situações divertidas, extra cotidianas”, destaca.
As técnicas oriundas do Teatro do Oprimido, desenvolvidas por Augusto Boal, também estão sempre presentes no cotidiano de atividades. “Elas tratam os participantes como espectadores, agentes ativos que assistem, mas também atuam na cena proposta, a partir de temas que são demandas coletivas. Já o Psicodrama, que traz elementos do teatro e da psicologia, nos possibilita desempenhar inúmeros papéis do cotidiano e, imediatamente, ressignificar no presente um acontecimento do passado. Tudo acontece em grupo, empaticamente. Em todas essas técnicas buscamos jogar luz ao teatro como ferramenta de aperfeiçoamento das relações humanas e de promoção à saúde coletiva. Quando a gente ajuda um indivíduo, a gente ajuda a sociedade, como pontua ‘Moreno’ no Psicodrama”, relata.
Quanto mais o paciente faz teatro, mais ele desenvolve e melhora habilidades. “Visivelmente os pacientes tornam-se mais autônomos e resolutivos, porque as cenas de improviso dão aos participantes a oportunidade de protagonizar e tomar decisões; conseguem se expressar melhor, tanto vocal quanto corporalmente. Como as aulas são sempre permeadas de debates e discussões sobre as situações e temas, os participantes passam por experiências de psicoeducação e inteligência emocional; se tornam mais espontâneos e criativos. Essas características que são desenvolvidas no teatro acabam permeando e semeando em outras áreas da vida de cada um, nas relações afetivas, no trabalho, na família e nos estudos”, conta Audevan.
O período de isolamento social em que as pessoas precisaram e puderam ficar em casa acabou provocando o encontro de muitos indivíduos com a arte nas suas variadas formatações de linguagem para ter suporte emocional. “Muitos de nós nos divertimos com lives, livros, poesias, músicas e filmes nesse período. A população não dá a importância devida para arte e os artistas têm o poder de nos salvar cotidianamente. É pela arte que a gente consegue reelaborar questões subjetivas, individuais e coletivas. O teatro na saúde mental é um exemplo muito nítido de como a arte cura, claro, dentro de um conjunto de atividades integradas. Mas, ainda que fora desse conjunto, as experiências artísticas possibilitam a expressão dos sofrimentos e alegrias que estão presentes no nosso viver. A campanha do Janeiro Branco aponta a importância de buscar novos conhecimentos, autonomia, autoconhecimento e prática de hobbies terapêuticos. O teatro é uma ferramenta possível para promoção desses percursos, e, assim, promove a saúde mental do indivíduo”, finaliza.
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Fonte: Rodrigo Alves
Foto: Rodrigo Alves
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