José Vieira da Cruz – Historiador e professor da UFS
As universidades no ocidente, enquanto instituições emersas na transição do medievo para época moderna, além de seu papel formativo, científico e cultural, também atribuem títulos, honrarias e reconhecem méritos. Nesse sentido, elas, cada uma a seu modo, ressignificam tradições, ritos e cerimoniais – deslocando o centro das atenções do campo de imposições das armas, violência e barbárie para o campo da legitimidade dos escritos, argumentos e civilidade.
Entendimento e cena bem delineados nas duas iluminuras da capa do livro O Processo Civilizador: a formação do Estado e da Civilização, volume II, de autoria de Norbert Elias, publicado pela Zahar editora, em 1993, na qual a violência de guerreiros em combate é contraposta a homens e mulheres escrevendo, lendo e debatendo – deixando claro o êxito, sucesso e leveza sustentável do conhecimento superando a força, sangue e demais horrores das guerras, intolerâncias e barbáries.
Dessa forma, em lugar das tradições, cerimoniais e ritos militares, eclesiásticos e /ou da nobreza, as universidades os/as reinventa e/ou ressignifica, a exemplo da atribuição de méritos intelectuais, de serviços prestados e/ou erudição de seus partícipes – seja pela dedicação demonstrada à instituição, contribuições aos estudos acadêmicos e/ou extensão de ações de ensino, cultura e/ou de inovação para autodesenvolvimento da sociedade e da humanidade.
Entre essas honrarias a conferência de títulos de eméritos(as) aos(às) professores(as) merece atenção. De um modo geral, professor emérito é um título honorífico concedido a um(a) indivíduo(a) por ter realizado por um longo período distinto serviço para uma instituição, comunidade e/ou sociedade. Em regra, ele é concedido a professores(as) quando de sua aposentadoria – em razão de terem sido reconhecidos pelo bom exercício de sua atividade acadêmica, profissional e/ou política.
A Universidade Federal de Sergipe (UFS), a exemplo, concede o referido título em conformidade com o artigo 90 do seu estatuto, segundo o qual o título de Professor(a) Emérito(a) é conferido aos docentes aposentados que tenham alcançado posição eminente no ensino, pesquisa e extensão. Mas, como em outras universidades, o referido título, apesar de previsto, somente é concedido em casos de consenso, distinção e como claro reconhecimento da comunidade acadêmica e institucional.
A título de ilustração, no curso dos quatro anos em que estive a frene da vice-reitoria da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), não tive conhecimento da atribuição de nenhuma honraria dessa monta. E, apenas e tão somente, assisti e participei da concessão de um título de Doutora Honoris Causa à arquiteta e professora Zélia Maia, uma das responsáveis pela fundação dos cursos de arquitetura em Alagoas – falecida em maio deste ano.
Desse modo, ciente dos significados acerca da concessão de um título universitário, recebi com satisfação, de um dos novos eméritos professores da UFS, o convite para prestigiá-lo na cerimônia de entrega da referida homenagem.
Nessa safra, o Ato da Reitoria nº 19/2023/UFS, de 05/05/2023, embasado na Resolução CONSU/UFS nº7/2023, conferiu o Título de Professor Emérito a 16 docentes de diferentes departamentos, centros e campi. No curso das experiências junto à UFS, desde 1986 – seja como office-boy, discente de história e do mestrado em sociologia, monitor de disciplina, professor substituto e/ou contratado por mais de duas ocasiões e atualmente professor efetivo, tive a oportunidade de trocar experiências acadêmicas, profissionais e de aprendizados com alguns deles.
Entre as eméritas professoras, conheci a professora Maria da Conceição Vasconcelos Gonçalves, mais conhecida por todos como professora Lika, do Departamento de Serviço Social. Eu, o jornalista Marcos Santana, os professores Péricles Moraes e Dilton Maynard e outros, tivemos a oportunidade de cursar com ela e a professora Maria Helena a disciplina de metodologia em pesquisa científica nos primeiros anos de afirmação do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da UFS. Naqueles tempos enfrentamos muitos desafios financeiros, institucionais e de embates com o discurso neoliberal da época que era mais favorável aos centros de excelência do Sudeste e do Sul do país.
A professora Maria Neide Sobral, do Departamento de Educação, o contato de trabalho é atual, junto dela e da professora Tereza Cristina Cerqueira da Graça somos responsáveis pelo Conselho Editorial da centenária Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (RIHGSE) – um periódico de grande relevância historiográfica e histórica.
Já com a professora Suely Gleyde Amâncio Martinelli, do Departamento de Arqueologia, além de suas contribuições no campo da arqueologia e do Programa Xingó, o contato profissional mais significativo ocorreu no curso de História da Universidade Tiradentes, onde ela se mostrou uma profissional experiente e de referência para aqueles que passaram por lá como docente, dentre eles: Maria Nely, Antônio Bittencourt, Pedro Abelardo, Joceneide Cunha, Itamar Freitas, Sheyla Farias, Dênio Azevedo, Vladimir e tantos outros.
Dentre os eméritos professores destaco o professor Antônio Edilson do Nascimento Departamento de Fisiologia, singular diretor do Departamento de Administração Acadêmica (DAA). Ele além da atenção e da prontidão na resolução das demandas de matrículas, diários e outros embrolhos acadêmicos, também me ajudou a avançar em minhas pesquisas sobre os estudantes universitários em Sergipe entre 1957 e 1964 – naquele contexto além das poucas vagas existentes o número de pardos e de negros matriculados identificados era muito pequena. A exemplo em cerca de 750 matrículas apenas um estudante negro matriculado foi identificado.
O outro emérito professor é José Afonso do Nascimento, do Departamento de Direito. Ele foi Pró-reitor de Assistência Estudantil nos meus tempos de graduação. Eu e minha turma, Maria Zelita, Gildo Bezerra, Magna Sales e Maria Cleide, vez em quando, tínhamos uns arranhões com ele, coisa do movimento estudantil, que como gostávamos de dizer tinha que cultivar a rebeldia para não sermos servos precoces. Mas ele também foi responsável pelo estudo sobre o desenvolvimento estadual, refiro-me às publicações produzidas pelo fórum “Pensar Sergipe” – experiência, legado e aprendizado que deveria ser retomado pela universidade e pelas autoridades estaduais e municipais dos mais diferentes níveis. Fez parte da Comissão Estadual da Verdade de Sergipe e foi o introdutor das ideias do Direito Alternativo nas terras de Sergipe. Ah! E antes que me esqueça, ele com seus textos de opinião, por vezes polêmicos, mas sobretudo contundentes e críticos, é uma leitura balizada sobre a política e a sociedade nesses tempos desafiadores para a universidade, democracia e a lide humana.
Realizado esses registros, parabenizo os(as) envolvidos(as) nas articulações e processos que resultaram na aprovação e conferência dos 16 Títulos de Professor(es) Emérito(as), dia 17 de julho do corrente. Data em que estarei em São Luís, Maranhão, coordenando um simpósio temático sobre os “Ser-tões, seus sujeitos, acontecimentos e temporalidades”. Por conta dessa ausência justificada deixo aqui minhas congratulações aos novos eméritos(as) de nossa querida UFS.
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