O Ministério Público Federal (MPF) voltou a defender o direito das comunidades tradicionais de Aracaju (SE) a serem ouvidas no processo de revisão do Plano Diretor do Município, em audiência pública promovida pela Justiça Federal, em Aracaju, nesta sexta (25).

A audiência pública foi determinada na ação judicial ajuizada pelo MPF em 2022, após a Prefeitura de Aracaju promover audiências sobre o tema de forma restrita e de não realizar consultas às comunidades tradicionais como prevê a legislação brasileira e convenções internacionais.

São autores da ação o MPF, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo Seção Sergipe (CAU/SE), a Criliber Criança e Liberdade – Quilombo Urbano da Maloca e a Associação Padre Luiz Lemper de Catadoras e Catadores de Mangaba. Participaram da audiência representantes de comunidades tradicionais, movimentos sociais, sociedade civil organizada, além de representantes do legislativo Municipal e Estadual e de órgãos públicos com interesse na causa.

O procurador da República Ígor Miranda destacou, durante a audiência, que qualquer “decisão política pelo nosso ordenamento democrático impõe que estejam sentados à mesa representantes dessas comunidades para serem ouvidos”. O procurador destacou que a convenção 196 da Organização Internacional do Trabalho determina a consulta prévia, livre e informada às comunidades tradicionais, que não foi feita neste caso. E a juíza da ação, Telma Maria Machado, destacou que a audiência realizada não substitui a exigência determinada pela OIT.

O advogado da Associação Padre Luiz Lemper de Catadoras e Catadores de Mangaba, Robson Barros, destacou as repetidas violências sofridas pela comunidade com o silenciamento de suas demandas e a invasão do território. “Novamente, no processo de revisão do Plano Diretor do Município, pleiteamos o direito da comunidade ser ouvida, como determina a legislação”, enfatizou. A presidente da associação, Maria Aliene dos Santos, destacou que a reserva de mangabas do Bairro Santa Maria, ocupada há mais de 80 anos por essas famílias, representa o pulmão de Aracaju e é fundamental para o meio ambiente da cidade e para o sustento do modo de vida da comunidade.

O município foi representado pela Procuradoria-Geral do Município.

Irregularidades – A presidente do CAU/SE, Heloísa Diniz de Rezende, enumerou, na audiência, as irregularidades no processo de revisão do Plano Diretor que levaram à ação judicial. Entre elas, destacou a falta de acessibilidade aos documentos disponibilizados pela Prefeitura de Aracaju, que, por conterem linguagem muito técnica, não eram de fácil entendimento pela população. Além disso, as consultas presenciais foram realizadas em número reduzido, apenas oito, sendo insuficientes, de acordo com Heloísa Rezende, para atender uma cidade de mais de 600 mil habitantes. Os documentos, além de usarem termos técnicos, “não trazem diagnóstico dos problemas da cidade, a partir dos quais a população poderia sugerir, opinar e colaborar na construção de estratégias para a solução desses problemas”, enfatizou a presidente do CAU/SE.

Andamento – O superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em Sergipe, Cassio Costa, e a superintendente substituta do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Sergipe, Evelyne Carvalho, informaram, na audiência, que seus respectivos órgãos peticionarão na ação para participar como amigos da corte (amicus curiae).

A juíza Telma Machado, ao fim da audiência, determinou prazo de dez dias para manifestação das partes e afirmou que, após analisar essas manifestações, avaliará se são necessárias novas diligências ou se o mérito do caso poderá ser julgado.

Liminar – Desde outubro de 2022 está vigente a liminar da Justiça Federal que impede o Executivo local de enviar o novo projeto de Plano Diretor à Câmara Municipal, até nova decisão sobre o tema. A liminar também determinou que os documentos relativos ao projeto sejam disponibilizados na Internet para que todas as entidades e a população local possam consultá-los.

Plano Diretor – O Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana, sendo obrigatório para cidades com mais de 20 mil habitantes. O documento deve ser elaborado pelo Executivo local e aprovado por lei municipal, sendo obrigatória a ampla participação da sociedade na construção do projeto, conforme prevê a Constituição Federal e o Estatuto das Cidades.

A ação tramita na Justiça Federal sob o número 0801588-72.2022.4.05.8500.

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Fonte: MPF

Foto: Ascom / MPF