GILFRANCISCO [*]

 

O nome de Rui Barbosa (1849-1923) é indissociavelmente ligado à criação dos Tribunais de Contas do Brasil. Durante o Período Imperial, muitos juristas e homens públicos preocupados com o uso adequado das verbas governamentais; manifestaram a necessidade de se criar um Tribunal de Contas no país. Mas somente após a Proclamação da República, em 1889, o ideal do estabelecimento de um órgão fiscalizador das contas do governo foi concretizado, dado o efusivo empenho de Rui Barbosa. Então Ministro da Fazenda do governo de Deodoro da Fonseca, Rui Barbosa que considerava o Tribunal de Contas uma peça vital no organismo do Estado conseguiu dar-lhe existência, na União, pelo Decreto nº 966-A, de 7 de novembro de 1890.  Todavia foi à primeira Constituição Republicana, datada de 1891, a qual Rui Barbosa ajudava a redigir, que efetivamente criou em seu artigo 89, uma Corte de contas no país. A instalação do Tribunal de Contas da União ocorreu em 17 de janeiro de 1893, dois anos após a promulgação da Carta Magna

Em março, completou 85 anos da criação do primeiro Tribunal de Contas do Estado de Sergipe, conforme Decreto nº 285 de 7 de março de 1935, sancionado pelo Interventor Federal Augusto Maynard Gomes, que sentindo   próximo os últimos dias do seu governo, criou cargos comprometendo, assim, a já gravíssima situação financeira do Estado de Sergipe:

“O Interventor Federal no Estado de Sergipe, no uso de suas atribuições legais: atendendo a que entre os “órgãos de cooperação nas atividades governamentais” institui a Constituição Federal o Tribunal de Contas, como regulador da execução orçamentária e julgador das contas dos responsáveis por dinheiro, ou bens públicos; atendendo a que a fiscalização financeira da administração pública deve ter órgão próprio, autônomo, separado  das repartições arrecadadoras; atendendo a que o registro de créditos, impondo um controle mais direto na aplicação das verbas orçamentárias, assegura melhor a responsabilidade dos funcionários aquém estão confiados os valores do erário público; atendendo a que entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo o Tribunal de Contas chamado a desempenhar importante missão, acudindo, de pronto, a qualquer pedido de informações e apresentando sugestões na elaboração anual da lei de meios; atendendo a que, como norma ainda da Constituição Federal os membros do Tribunal devem participar das prerrogativas e vantagens da alta magistratura do Estado de modo a lhes assegurar o pleno êxito de suas funções”.

Quando a Constituição Federal obrigou aos Estados criarem os seus Tribunais de Contas, teve em vista, determinar o órgão de fiscalização mais diretamente ligado ao exame das administrações locais. Houve na época, certa reserva ao funcionamento do Tribunal de Contas suspeito de ser em Sergipe, mais um órgão de empreguismo e de manobra políticas para servir a uns e condenar a outros. Os meios políticos animaram-se com a criação, pela tranquilidade que esperavam na convivência do Governo estadual com o silêncio e as dificuldades na apresentação de balanços e contas.

Sem dúvidas, tivemos alguns problemas entre o recém-criado Tribunal de Contas do Estado e órgãos que resistiram em submeter-se à fiscalização, não somente em Sergipe, mas também na capital federal. Vejamos o registro do Sergipe-Jornal sobre o incidente entre o Tribunal de Contas e o ministro da Marinha:

Rio, 17 – Consta que, entre o Tribunal de Contas e o ministro da Marinha, houve um forte incidente. O incidente, segundo se afirma, foi motivado por não querer o titular da pasta da Marinha submeter-se à fiscalização da delegação do Tribunal.[1]

 

Criação

Fotos: Divulgação

A primeira notícia divulgada na imprensa local sobre a criação do Tribunal de Contas do Estado, veio através do Correio de Aracaju, na mesma época em que foram criados outros Tribunais de Contas no Brasil: Rio Grande do Sul (1935, extinção pelo Estado Novo em 1939); Minas Gerais (1935, extinção pelo Estado Novo em 1939) e Ceará (1935, fechado em 1939):

“Amanhã segundo estamos informados será criado o Tribunal de Contas do Estado por um decreto do Sr. Interventor Federal, tendo cada juiz um conto de reis de vencimento mensais.

Está apontado como um dos seus membros o Dr. Alceu Dantas Maciel, atual chefe de Polícia do Estado. A secretaria caberá ao Sr. Freire Ribeiro, auxiliar do Gabinete da Interventoria”.[2]

No dia seguinte o Diário da Tarde, órgão do Partido Republicano de Sergipe, publica a seguinte nota “Tribunal de Contas do Estado”, sobre a publicação do decreto de criação, no Diário Oficial:

No apagar de luzes da atual administração do Estado, grandes, incontáveis mesmo têm sido os decretos efetivando, nomeando, aposentando e criando novos lugares, com o fim único e exclusivo de premiar amigos e embaçar a futura administração constitucional do Estado.

Hoje, o Diário Oficial publicou o decreto número 285 da interventoria federal, que cria o Tribunal de Contas do Estado. Não entramos, no momento, na apreciação do decreto em questão, porém, como estamos na obrigação de tudo informar aos nossos ledores, podemos garantir, segundo colhemos em fontes autorizadas, que serão nomeados juízes do Tribunal recém-criado, os Sr. Alceu Dantas Maciel, chefe de polícia do Estado, Álvaro Fontes da Silva e Alexandre Lobão, juízes de Direito em disponibilidade, e o Sr. Aureliano Luiz Bettamio, será nomeado procurador junto ao mesmo Tribunal.

Para as funções de secretário, vai ser nomeado o Sr.  Freire Ribeiro, oficial de gabinete da Interventoria .

Faltará ainda alguém a ser premiado?…[3]

 

Vejamos alguns artigos do decreto nº285 de 7 de março, sobre a criação do Tribunal de Contas:

“O Interventor Federal no Estado de Sergipe, no uso de suas atribuições legais:

– atendendo a que entre os “órgãos de cooperação nas atividades governamentais” institui a       Constituição Federal o Tribunal de Contas, como regulador da execução orçamentária e julgador das contas dos responsáveis por dinheiro, ou bens públicos;

– atendendo a que a fiscalização financeira da administração pública deve ter órgão próprio, autônomo, separado das repartições arrecadadora;

– atendendo a que o registro de créditos, impondo um controle mais direto na aplicação das verbas orçamentárias, assegura melhor a responsabilidade dos funcionários aquém estão confiados os valores do erário público;

– atendendo a que entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo o Tribunal de Contas chamado a desempenhar importante missão, acudindo, de pronto, a qualquer pedido de  informações e apresentando sugestões na elaboração annua da lei de meios;

– atendendo a que, como norma ainda da Constituição Federal os membros do Tribunal devem participar das prerrogativas e vantagens da alta magistratura do Estado de modo a lhes assegurar o pleno êxito de suas funções”.

O Art.10 do Capítulo 1 Seção 1ª diz que:

             O Tribunal terá uma Secretaria com os seguintes funcionários: um secretário, que será o diretor da Secretaria; um cartorário-arquivista, que desempenhará a função de escrivão; um 1º oficial-datilógrafo, um 2º oficial-amanuense e um porteiro-servente.

O Tribunal de Contas do Estado de Sergipe foi instalado na sala térrea do lado direito da Assembleia Legislativa do Estado. Quanto aos vencimentos dos servidores do TCE, respeitam as disposições do Regimento da Secretaria Geral e do Estatuto dos Funcionários Públicos.

 

Juízes Nomeados               

Alceu Dantas Maciel – Presidente

Alceu Dantas Maciel 

 

Filho do bacharel Guilherme Nabuco Maciel e D. Joana Dantas Maciel, nasceu a 13 de maio de 1899 no engenho Salobro, município de Divina Pastora. Fez os seus primeiros estudos em Maruim, Aracaju e na cidade do Recife, onde cursou o primeiro ano do curso de Ciências Jurídicas da Faculdade de Direito, seguindo depois para o Estado de São Paulo para continuar os estudos, recebendo o grau de bacharel a 25 de dezembro de 1922 pela Faculdade do Largo de São Francisco, hoje parte da Universidade de São Paulo – USP. Com o seu ensino humanista, dela saíram também os futuros políticos, jornalistas e escritores. Desde cedo se interessou pelo jornalismo e aos dezesseis anos já colaborava com artigos interessantes como As Paixões Humanas (19/20, novembro, 1915) no Diário da Manhã, de Aracaju, propriedade do Coronel Apulcro Motta.

Na capital paulista dirigiu a partir de 30 de setembro de 1921, o número 1 da revista quinzenal de variedades A Garoa, revista de renovadora linha editorial traduzia a atmosfera típica da cidade que era da garoa. Impressa em papel cuchê, A Garoa era secretariada por outro sergipano, o poeta Cleómenes de Oliveira Campos (1895-1968), tendo J. Prado na redação e ilustração que punha em cena a produção artística do momento, conferido peculiaridades gráficas e textuais inovadoras: Clodomiro Amazonas (A Garoa, nº5, 1921); Ferrignac (A Garoa, nº3, 1921); Victor Brecheret (A Garoa, nº1, 1921); Di Cavalcanti (A Garoa, nº4, 1921); Belmonte (A Garoa, nº12, 1922).  Colaboraram também: Afonso Schmidt e Ribeiro Couto.

Ainda na capital paulista, muito jovem, foi nomeado em fevereiro de 1924, Delegado do município de Jambeiro em São Paulo. Retornando a Sergipe tornou-se famoso por ter presidido o inquérito dos revoltosos comandado pelo então tenente Augusto Maynard Gomes, durante a eclosão do movimento de 13 de Julho de 1924. Na década de 1930 foi Chefe de Polícia na gestão do interventor Maynard Gomes.

O advogado Alceu Dantas foi preso em 19 de dezembro de 1935, no Rio de Janeiro e recolhido a Casa de Detenção. Em seu poder foram apreendidos muitos documentos comunistas “assim como o mapa do projetado levante extremista em Sergipe” afirma as autoridades cariocas.

Conforme publicação no Diário da Justiça, 29 de fevereiro de 1936, Alceu Dantas Maciel, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil (Seção do Estado de Sergipe) sob o nº 23, estava suspenso de exercer suas atividades profissionais, de acordo com N. I do art. 10 do Regimento da Ordem. Alceu Maciel militou na imprensa sergipana onde publicou vários artigos de destaques. Publicou em 1925 o livro A Revolução de 1924.

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Edmundo Noxetti Daltro – Juiz

Edmundo Noxetti Daltro 

São poucas as informação que temos sobre Edmundo Noxetti Daltro. Seu nome aparece na imprensa em 22 de novembro de 1892 no Diário de Pernambuco e reaparece em 8 de janeiro de 1908 num documento quando foi concedida a permuta que requereram os juízes de Direito das comarcas de Laranjeiras e Estância, bacharéis Lupicinio Amymthas da Costa Barros e Edmundo Noxetti Daltro, passando o primeiro a ter exercício na comarca de Estância e o segundo na de Laranjeiras. Em 7 de maio de 1912, reaparece no Jornal do Comércio de Pernambuco. No ano seguinte torna-se sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.

Em 29 de julho de 1934 aparecia no O Estado de Sergipe uma nota que esclarecia em virtude do disposto no art. 65 da Constituição vigente a época, Dr. Edmundo Noxetti Daltro, pediu exoneração do cargo de diretor da Penitenciária Modelo, construída em 1926 no governo de Graccho Cardoso (1874-1950) com projeto e construção de Artur Araújo, uma vez que como juiz, em disponibilidade, está proibido, pelo dispositivo invocado, de exercer outra qualquer função pública. Noxetti deixou traços positivos da sua passagem na administração daquele estabelecimento, procurando, valendo-se dos meios que lhe facultaram, por no verdadeiro caminho de sua finalidade.

Era proprietário de uma Fábrica de cama de ferro, situada na Rua Japaratuba. Faleceu em Aracaju, 14 ou 16 de fevereiro de 1955, há divergência quanto à data entre os jornais A Noite e o Jornal do Brasil.

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Álvaro Fontes da Silva – Juiz

Álvaro Fontes da Silva 

Nascido em Aracaju a 6 de setembro de 1884, filho de Eugênio José da Silva e D. Argemira de S. Pedro e Silva. De família abastarda, começou a vida modestamente como tipógrafo na cidade natal. Tendo estudado no Atheneu Sergipense, depois se matriculou na Faculdade Livre de Direto do Rio de Janeiro, bacharelando-se em Ciências Jurídicas e Sociais em 20 de março de 1922. Álvaro exerceu vários cargos públicos: Chefe de Polícia, Secretário Geral de Estado; Juiz de Direito da Comarca de São Cristóvão e Maruim e Aracaju Presidente do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, Membro do Conselho Penitenciário, Interventor Federal, professor e fundador da Faculdade de Direito de Sergipe. Venerável da Loja Maçônica nos períodos de 1931-1931 e 1940. Como jornalista colaborou no O Estado de Sergipe, Diário da Manhã, Correio de Aracaju, Diário Oficial e no Vespertino, como diretor, além de presidir a Associação Sergipana de Imprensa – ASI (1943-1945).

Na edição de 11 de março de 1943 do Diário Oficial do Estado de Sergipe a Nota “Dr. Álvaro Fontes da Silva”, parabeniza os dois anos da nova fase do Sergipe-Jornal, sob a direção e acrescenta que os círculos de imprensa de Sergipe se congratulam com esse devotado confrade e mais ainda com o próprio Sergipe-Jornal que tem agora à frente dos seus destinos de antigo e intransigente  porta voz da opinião e retilíneo e elucidador do pensamento popular:

“Completou segunda-feira, o seu segundo ano à frente de Sergipe-Jornal, o doutor Álvaro Fontes da Silva, jornalista que sempre honrou as tradições da sua classe e que ora exerce as elevadas funções de Presidente do Departamento Administrativo do Estado.

Embora viesse, anos a fio, servindo à causa pública e à imprensa através das colunas do órgão que hoje dirige, foi tomando a responsabilidade pessoal daquele vespertino que o Dr. Álvaro Silva pode imprimir-lhe feição nova, melhorando-lhe consideravelmente tanto a parte informativa como os comentários e o serviço de colaborações, sem falar na apresentação gráfica, bastante modernizada.”

Advogado brilhante, Álvaro Silva publicou obras sobre Direito. Faleceu em Aracaju a 26 de julho de 1956.

 

Referências

[1]     Sergipe-Jornal. Aracaju, Ano XVI, nº 8.186, de 18 de outubro, 1935.

[2]     Correio de Aracaju. Aracaju, 7 de março de 1935.

[3]     Diário da Tarde. Aracaju, Ano III, nº525, 8 de março, 1935.

 

[*]  É jornalista e funcionário do TCE/SE. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com