GILFRANCISCO [*]

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“Cidadão íntegro, puro, decente. Além de inteligentíssimo, dono de cultura invulgar, mestre inconteste no que se refere à educação. Anísio Teixeira foi um brasileiro raro. Tão extraordinário a ponto de ter sido alvo durante toda a vida de restrições, suspeitas, aleivosias, perseguições, misérias de todo o tipo com que os imundos o perseguiram – sobram imundos no Brasil”.

Jorge Amado

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O Homem

Anísio Spínola Teixeira nasceu em Caetité–BA, (Vila do Príncipe), importante centro econômico, cultural e político do centro-sul baiano, 757 km de Salvador a 12 de julho de 1900. Filho do Dr. Deocleciano Pires Teixeira (médico, importante figura da sociedade local) e d. Ana de Souza Spinola, de inteligência incomum, desde cedo chamava à atenção dos professores da escola dos jesuítas. Anísio fez seus estudos primário e ginasial na sua cidade natal, transferindo-se em 1914 do Instituto São Luis Gonzaga, para o Colégio Antônio Vieira, em Salvador, onde conhece Hemes Lima (1902-1978). Em 1917, o padre Cabral lhe desperta admiração que o influenciaria a abraçar a carreira religiosa. Três anos depois, em carta ao pai anuncia o despertar da vocação religiosa e o desejo de ingressar na Companhia de Jesus, não obtém a aprovação pretendida.

Em 1922 forma-se em Direito pela Universidade do Rio de Janeiro, chegou ao então governador Francisco Marques de Góes Calmon (1924-1928) a quem não conhecia pessoalmente, na condição de modesto candidato a promotor público de Caetité, mas Góes Calmon ofereceu-lhe o cargo de diretor de Instrução Pública e nomeou-o em abril de 1924. Seu nome fora indicado pelo ex-colega Hermes Lima, que servia no gabinete do governador, que “preocupava-o muito o problema da instituição e na procura de alguém para chefiar o respectivo departamento, lembrei-lhe o nome de Anísio. Ele ouviu, fez perguntas, ponderou e expediu o convite”.

Assim, tem início à luta pela educação em Anísio Teixeira, provocando acirrada polêmica seu projeto que contraria o da Escola Única. A situação educacional da Bahia, antes e durante o Estado Novo, era de total abandono. Em 1927 percorreu alguns países como Espanha, França (onde passou quatro meses estudando na Sorbonne), Itália e Estados Unidos para conhecer-lhes o sistema educacional, ao tempo que elaborava sua proposta para reforma educacional na Bahia. Em carta ao pai (1928), Anísio comunica-lhe haver ganhado uma bolsa de estudos: “Quando deixei, no ano passado, a Universidade de Colúmbia, em Nova Iorque, tive uma oferta dos seus diretores, de um ano de estudos em Nova Iorque, as custas da Universidade. Dar-me-iam 1.800 dólares, ou cerca de 15 contos para minha manutenção”. Assim inicia o curso de pós-graduação em Master in Arts, permanecendo até 1929, onde trava amizades e sente-se profundamente influenciado por John Dewey (1859-1952), pedagogo e filósofo americano, incorporando as idéias do mestre. Essa convivência nos Estados Unidos aproximou-o de estrangeiros, mas também de brasileiros, como Monteiro Lobato, que o modificaria radicalmente seu pensamento e torna-se agnóstico.

Retorna à Bahia e renuncia ao cargo de Diretor da Instrução Pública, quando já era governador Vital Henrique Batista Soares, sendo nomeado para ministrar Filosofia e História da Educação na Escola Normal, em Salvador. Em 1931, Anísio assume a Diretoria de Educação do Ministério da Educação e, a convite do Prefeito Pedro Ernesto do Distrito Federal marca sua atuação com o projeto e implantação da rede municipal de ensino, que previa a integração de todos os níveis, desde a escola primária à universidade. Em 1932 casa-se com Emília Telles Ferreira com quem teria quatro filhos: Marta Maria, Ana Cristina, Carlos Antônio e José Maurício. Três anos depois, Anísio transforma a Escola Normal em Instituto de Educação. Em 1936 recolhe-se à vida privada e dedica-se à atividade industrial e comercial – a exploração de manganês, de que se afastaria em 1945.

Em 1946 exerce, pelo período de um ano, o mandato de Conselheiro Superior da Unesco, retorna ao Brasil e aceita o convite do novo Governador da Bahia, Otávio Mangabeira (1886-1960), para assumir a Secretaria da Educação e Saúde, e lidera os debates na Constituinte estadual pela autonomia da educação. Três anos mais tarde inaugura a Escola Parque, com o objetivo claramente definido: ser a escola em tempo integral, inclusive na preparação profissional do educando, através de cursos profissionalizantes. Em 1951 a convite do Ministro da Educação e Saúde, Ernesto Simões Filho (1887-1957), assume a Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal de nível Superior e acumula as atividades da Capes com as de novo dirigente do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP. A CAPES a mais conhecida de suas iniciativas, pioneira, continua sendo uma das mais importantes instituições do Brasil no campo da educação, com programas extensivos de formação para profissionais, e importante trabalho de controle de qualidade do ensino superior no país, em graduação e pós-graduação.

Incompreensões e perseguições

Com toda uma vida devotada à educação pública e à incansável batalha por transformá-la em prioridade, Anísio Teixeira tem sido sem dúvida, a qualidade essencial para dialogar com o presente. Por suas idéias e iniciativas em prol de uma causa pública sempre carente de servidores abnegados e de soluções de longo alcance, como é a educação brasileira, Anísio Teixeira se revela, como diria o amigo pernambucano, Gilberto Freyre, menos um “morto ilustre” a ser louvado e muito mais um contemporâneo com quem a atualidade muito poderia ganhar desde que se dispusesse a ouvi-lo. Desde jovem Anísio Teixeira preocupou-se com duas questões ligadas aos próprios fundamentos de uma universidade: a formação dos docentes e as atividades criadoras em todas as áreas: Ciências Humanas, Ciências Naturais e Exatas, Artes e Letras:

“A universidade e, pois, na sociedade moderna, uma das instituições características e indispensáveis, sem a qual não chega a existir um povo. Aqueles que não as têm, também não

têm existência autônoma, vivendo, tão-somente, como um reflexo dos demais. Com efeito, a história de todos os povos que floresceram e se desenvolveram é também a história da sua cultural, e a história da sua cultura é, hoje, a história das suas universidades”.

Dirigido por Anísio Teixeira de 1952-1964, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Pedagógicas – Inep – levou para lá todo o seu conhecimento, experiência, inteligência, cultura e discernimento, dando-lhe uma dimensão regional, pelo funcionamento de centro no Recife, Salvador, Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre e Rio de Janeiro, juntando homens do quilate de um Gilberto Freyre (1900-1987), Fernando de Azevedo (1894-1974), Abgard Renaut (1908-1995) e Elooch Kunz. Particularmente na Bahia, a contribuição do INEP merece um destaque especial -, O Centro Educacional Carneiro Ribeiro – CECR -, com as escolas parques, iniciou e se constituiu na primeira experiência de ensino integrado brasileiro, com horário nos dois turnos, oficinas, teatro, ensino vocacionado, atualizada biblioteca, sob a liderança enérgica e eficiente de sua irmã D. Carmen Spinola Teixeira. Sempre postulando idéias progressistas, a idealização deste projeto visava dar uma resposta definitiva ao problema da escola primária, que Anísio considerava ser a mais complexa. Como conseqüência, uma nova onda recomeça contra ele, que duramente atingido pelo Manifesto dos Bispos, para retirá-lo do Inep.

Arte e Educação

No governo de Otávio Mangabeira, de fecunda e ampla renovação de idéias e valores, deu-se uma verdadeira abertura cultural, graças à atuação de Anísio Teixeira. Renova-se o Museu do Estado da Bahia, sob a direção de José Valladares que recebe do Secretário de Educação e Saúde o maior estímulo para uma série de realizações que marcaram época. Criam-se os Salões Baianos de Belas Artes, estimula-se a arquitetura moderna, fundam-se novos museus e chegam à Bahia, atraídos pelo novo clima cultural, muitos artistas do país e até de fora, como foi o caso de Carybé, Hansen Bahia, Pancetti, Lênio Braga, Udo Knaff e tantos outros. O I Salão ultrapassou a casa dos 25 mil visitantes, reuniu 204 obras, com presença dos pintores E. Di Cavalcanti, Cândido Portinari, Anita Malfatti, Flávio de Carvalho e outros. O paulista José Pancetti, o maior paisagista brasileiro recebe em 1950 um convite do jornalista Odorico Tavares para passar um mês na Bahia, mas ficou em Salvador por quatro anos com despesas custeadas pelo governo, pintando exclusivamente o mar baiano. Pancetti morou em Itapoã, Ladeira da Barra, Mar Grande e Mata de São João, onde teve uma grande paixão.

Em 1948, o escritor carioca Marques Rebello organiza uma exposição didática com 82 obras dos mais importantes artistas brasileiros e estrangeiros: Pronsato, Pettoruti, Axel de Leskoschek, Bonnard, Vlamink, Marie Laurencin, Augusto Renoir, José Pancetti Portinari, Di Cavalcanti, Djanira, Roberto Burle Max, Lasar Segal, Iberé Camargo e outros. Financiada pelo MEC, com catálogos, apresentação dos artistas, precedida de conferências sobre as vanguardas, essa exposição teve grande repercussão na imprensa. Para a Escola parque, Anísio Teixeira convidou vários artistas baianos que pintaram os painéis nos galpões: Carlos Bastos, Carybé, Jenner Augusto (Evolução do Homem), Maria Célia, Carlos Magno e outros.

De propriedade do antiquário José Pedreira, o Bar Anjo Azul, estava instalado num sobradinho da Rua do Cabeça (Largo 2 de Julho) a poucos passos da residência de Carlos Bastos, possuía uma única entrada e uma pequena janela de fundo, com pouca ventilação e luminosidade. Em seu interior havia esplêndida pintura mural e escultura moderna da autoria de

Carlos Bastos e Mário Cravo. Neste pequeno espaço foram organizadas as primeiras exposições de Arte Moderna na Bahia, com as mostras de Jenner Augusto, Maria Célia, Genaro Carvalho e Tiziana Bonazola, época em que o Anjo Azul era freqüentado por Odorico Tavares, diretor dos Diários Associados, o poeta Godofredo Filho, Diógens Rebouças, D. Clemente da Silva Nigra e o próprio Anísio Teixeira.

A cidade achava que ali era um antro, um lugar escuro, tinha gente que não passava pela porta. Segundo depoimento de Carlos Bastos para revista Exu, “era apenas um bar onde intelectuais se reuniam que começou sem ter nenhuma pretensão cultural, mas acabou se tornando um ponto de encontro, um marco, apesar de muito combatido na época. O Anjo Azul é o fim do academicismo e a chegada do moderno”.

Prestigiado mais no exterior que no Brasil, Anísio sempre foi perseguido, sendo suas ações reprimidas e incompreendidas. A ousadia e posição das suas idéias vanguardistas, avançadas para a época renderam a Anísio críticas e oposição, como o financiamento da Boate/Galeria Anjo Azul e de ter empregado Pancetti para pintar a Bahia. Essas transgressões provocaram um verdadeiro escândalo na sociedade baiana. Um fato semelhante ocorreu no governo democrático de Waldir Pires (1987-1988), quando o Secretário de Cultura, José Carlos Capinan, contratou um pai de santo do terreiro da Casa Branca, como assessor para assuntos relacionados ao candomblé.

Comparado aos cavaux parisienses o Anjo Azul sobreviveu até os anos setenta, época em que freqüentei com o poeta Carlos Sampaio era ainda conhecido nas grandes noitadas de Salvador, entre os pintores da confraria. Mesmo decadente continuava um paraíso onde se reuniam os gays mais snobs, intelectuais e artistas, para tomar “xixi de anjo” que era servido em piniquinhos de barro. Portanto, o espírito humanista do educador baiano, sabia da perfeita consciência dos valores da arte para a educação, como propósito maior. Por isto nunca relutou em ampliar recursos para os projetos artísticos e de significado educativo.

Escola Parque

Com a redemocratização do país em 1945, Anísio Teixeira retorna às lides do ensino como Secretário de Educação e Saúde do Estado da Bahia, no governo de Otávio Mangabeira (1947-1950), quando ocorre o segundo grande momento de sua atuação e tem início a experiência pragmática da Escola Parque de Salvador, implantada numa encruzilhada dos bairros Pero Vaz (Liberdade), Escola 1, IAPI, Escola 2, Pau Miúdo, Escola 3 e Caixa D’Água, Escola 4, destinadas à formação de crianças e adolescentes do estrato pobre da cidade. Com o suporte de uma excelente biblioteca situada no centro do Campus (Caixa D’Água), o currículo da escola empreendia cultura geral, artes, educação física, habilitação para o trabalho com a aprendizagem de um ofício, além de práticas de vida social, assistência médica, odontológica e alimentar.

A Escola Parque recebeu a denominação de Centro Educacional Carneiro Ribeiro, em homenagem ao grande educador baiano, e desenvolvia um programa de educação integral, com oito horas diárias de atividades escolares, que tem servido de modelo na Bahia e em todo o país. Inaugurada em 21 de setembro de 1950, a Escola Parque estava fundamentada nos ensinamentos do educador e filósofo norte-americano John Dewey, para quem educação é vida, não uma imitação da vida, Anísio Teixeira marcaria com sua presença na renovação da educação brasileira, ao inovar com o projeto e construção da Escola Parque.

Integrada por quatro escolas-classe e pela escola parque, com aproximadamente 4 mil alunos no conjunto, o campus possuía campo de futebol gramado, várias quadras interna e externa, galpões para exposição e aulas de aprendizagem (tapeçaria, cerâmica, alfaiataria, desenho, modelagem, culinária, corte costura, música, dança, sapataria…), concha acústica, teatro, refeitório, cozinha industrial, ônibus, ambulância e um coral. Os alunos chegavam, tomavam banho, escovava os dentes e depois se dirigiam ao refeitório para o café. Nos anos sessenta a farda era de brim azul claro (camisa, com escudo triangular e iniciais E. P., depois substituído por um em forma de círculo com as inicias CECR) e escuro (saia para as meninas e calça para os meninos), sapato vulcabrás, conga ou bamba. Apesar de ter estudado o curso ginasial no Instituto de Educação Isaias Alves – IEIA, antiga Escola Normal (1966/1969), localizado no Barbalho, distante da Caixa D’Água, onde morávamos, sempre pagava carona quando ia para o colégio, em um dos ônibus, exclusivo para os professores e funcionários do Centro Educacional. Lembro-me que os microônibus eram importados da marca Chevrolet, de cor amarela, igualzinho aos das escolas norte-americanas. Passei parte da minha adolescência dentro da Escola Parque: trepando nas mangueiras, abacateiros, jambeiros, jaqueiras, filando a merenda, mexendo com as alunas, às vezes jogando baba em uma das quadras externas ou fugindo da vigilância quando ultrapassava o horário do expediente.2 Tanto professores como monitores, eram todos conhecidos nossos, moradores do bairro, amigo de turma, por isso nossa permanência era tolerada. Aos sábados íamos ao teatro assistir aos shows da jovem guarda local, “O som do Big Bem” com Waldir Serrão e seus cometas, Raulzito e os Panteras (liderado por Raul Seixas) Os Jormas, Os Sombras, Os Príncipes, Gino Frei, José Roberto, Edy Star, os Cremes, the Gentleman, Os Minos, Os Leif’s e Los Gatos (os quatro últimos liderados por Pepeu Gomes) e alguns atrações nacional: Jerry Adriane, Wanderley Cardoso, Wanderléa, Leno e Lilia, Deno e Dino, Vanusa, The Pop’s, Os Incríveis, Waldirene e outros.

Um fato inovador da Escola Parque era que todo aluno possuía uma espécie de caderneta de poupança, onde eram creditados valores relativos ao rateio dos produtos produzidos durante o ano letivo, vendidos nas exposições de fim de ano. O crédito era do aluno, podendo a genitora retirar uma pequena importância, após justificativa condizente apresentada à direção da instituição. A feira-exposição realizada anualmente era bastante concorrida, pois estava no calendário turístico de Salvador, época em que vinha dos Estados Unidos da América, um número bastante significativo de visitantes. Apesar de residir na escola, D. Carmen Spinola visitava diariamente todas as escolas-classe.

Manifesto dos Bispos

Para alguns o Centro Educacional Carneiro Ribeiro era um luxo para um Estado pobre como a Bahia, para outros uma ameaça por apontar falhas do sistema educacional e um caminho para sua reformulação. Muitos achavam que atender os projetos de Anísio, seria muito caro aos cofres públicos e talvez por isso tenha deixado no meio do caminho o pensamento de Anísio. Quando ele pensou na escola pública universal de qualidade, escola em tempo integral, ele queria elevar a educação a condições de estado de consciência. onde o povo pudesse ser o gestor do seu próprio destino.

A favor do dinheiro público para a escola pública, Anísio era contra o deslocamento do recurso público para a escola particular, porque a educação é direito de todos e dever do estado. Na época boa parte das escolas brasileiras, inclusive alguns universidades eram ligadas à igreja católica. No momento que o governo destinava as verbas para as escolas públicas, verbas que a princípio também iriam para as instituições de ensino católico, o clero percebeu que a intenção de Anísio era convencer o governo a não mais repassar recursos para essas instituições particulares. Por isso iniciaram uma campanha nacional pelo afastamento de Anísio Teixeira do núcleo da educação brasileira. O dominicano D. Evaristo Arns, foi o principal organizador do processo de retirada de Anísio Teixeira da vida pública. Foram vários artigos publicados por ele na Revista de Cultura Vozes. O próprio Dom Hélder Câmara (1909-1999) o primeiro assistente-geral da Ação Católica Brasileira (1947-1962), em conversa com o Presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976) revelou a posição da igreja, que era no sentido de afastamento do professor Anísio Teixeira, mas reconheceu que aquela altura, afastá-lo seria romper com a intelectualidade brasileira e poderia desestabilizar o governo, de sorte que ele disse ao presidente que sentisse à vontade para deixá-lo no cargo.

Para surpresa de alguns, desenvolve no país o que muitos consideram o maior movimento da intelectualidade brasileira, em defesa da permanência de um funcionário num cargo público, ou seja, em defesa de Anísio Teixeira. Neste momento surge através de manifestos “Em defesa da Inteligência” procedentes de várias entidades: Assembléia Legislativa, Câmara Federal, União Nacional dos Estudantes, União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, todos pela permanência de Anísio.

Morte

Em 1961 Anísio Teixeira assume o cargo de vice-reitor da Universidade de Brasília e no ano seguinte, em consequência da nomeação de Darcy Ribeiro (1922-1997) para o Ministério da Educação e Cultura, o de Reitor. Em 1964, após a deportação do Presidente João Goulart (1918-1976) foi exonerado das funções de reitor da UNB e do Conselho de Educação e aposentado compulsoriamente. Com a implantação da ditadura, Anísio deixa o país, indo inicialmente para o Chile, e depois para os Estados Unidos, onde leciona com professor visitante em várias universidades. Anísio Teixeira retorna ao Brasil em 1966 e é reintegrado ao Conselho Federal de Educação, exercendo paralelamente a atividade de consultor da Fundação Getúlio Vargas. Dois anos depois se afasta do Conselho.

Anísio Teixeira desapareceu em 11 de março de 1971, quando se dirigia da sua residência para se encontrar com a amigo e membro da Academia Brasileira de Letras, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1910-1989) num edifício do Rio de Janeiro, onde morava o escritor. A versão que perdurou por muitos anos foi a das autoridades militares de que chegando ao edifício, Anísio de dirigiu ao elevador e saltou no andar errado. Ao perceber retornou para pegar o elevador, e ao abrir a porta o elevador não estava. O certo é que o corpo de Anísio Teixeira foi encontrado somente no dia 14 no poço do elevador. Segundo depoimento recente do filho Carlos Antônio “numa posição que levanta profunda suspeita de não ter sido na verdade colocado ali, só com a autópsia onde os legistas de início começam a descrever trauma craniano por instrumento cilíndrico, provavelmente madeira, um trauma craniano não sendo compatível com um trauma sobre clavicular que ele também apresentava”. (…) “O que se intrigava na questão de meu pai é a posição do corpo. Meu pai foi encontrado neste poço numa posição que contrariava que era de alguém que havia projetado”. (…) “Na época houve notícias bem formais por conta de autoridades bem relevantes do período, a do Ministro da Guerra que informava que meu pai estava preso pela Aeronáutica e não tinha condições de dizer onde estava no outro dia teria condições de informar. No outro dia meu pai é encontrado com uma identificação da Marinha, identificado como um oficial da Marinha, que na verdade era meu pai. Eu confesso para mim eu considero ainda aberto, acho muito difícil agente conduzir alguma coisa mais concreta, mas contanto que esteja aberto”.

Segundo João Augusto de Lima Rocha, professor da UFBA e estudioso da obra de Anísio Teixeira, meu colega de ginásio, sustenta a versão ainda inédita não publicada, contada por um membro da ABL, já falecido que preparou um depoimento sobre a morte de Anísio e encontra-se sob guarda da instituição, para ser aberta 50 anos depois. A morte de Anísio foi injusta, covarde e desumana. Oficializada sua morte, imediatamente por ordem Jorge Haje, Chefe de Gabinete do Reitor Roberto Santos, suspendeu as atividades da Seção. Lembro-me da aflição e angústia dos seus antigos colaboradores: Edivaldo Machado Boaventura, Ana Maria Mecedes, Iracy Picanço e Zaidê Machado Neto, época em que eu e os demais trabalhávamos na Assessoria de Planejamento, no Palácio da Reitoria da Universidade Federal da Bahia.

Educação Abortada

Disciplinado desde jovem, Anísio fez história pela forma ética e honesta como exerceu os cargos públicos, através dos projetos, anteprojetos e bases para planos de organização dos sistemas educacionais, dão prova da competência e sabedoria do educador baiano. Anísio foi sem dúvida um homem que teve uma influência decisiva numa verdadeira revolução educacional, tudo que hoje no Brasil se discute em matéria de educação remete a Anísio Teixeira. Os educadores atuais não conhecem a obra de Anísio, e sim episódios e momentos isolados de sua vida. Uma grande vida de pensamento e ação, que ousou mudanças num Brasil atrasado. Anísio abriu um caminho para o povo brasileiro ser educado numa escola pública universal. Se as atividades da Escola Parque tivesse tido seqüência, continuidade, se ela realmente tivesse sido erguida como uma verdade verdadeira, completa teria mudado muito o povo brasileiro, teria dado aos brasileiros elementos de liberdade que até hoje não temos.

Um fato pouco conhecido na carreira do educador Anísio Teixeira, é a criação na Bahia da primeira Fundação para o Desenvolvimento da Ciência em 1950 e fez inserir na Constituinte baiana. Este é o primeiro órgão institucionalmente estabelecido num espaço gerencial para as atividades da ciência e da tecnologia em todo o país. Este fato é realmente surpreendente, pouco conhecido e divulgado, certamente porque o brilho de Anísio foi tão grande na área da educação, que sua contribuição para a área da ciência e da tecnologia, para estruturação, disciplinamento das atividades de ciência e tecnologia em nível de governo em nível de estado ficaram inominadas.

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[*] É jornalista, pesquisador e professor universitário. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com