GILFRANCISCO [*]

Desde a inauguração da Sergipe Industrial no Bairro Industrial, têm sido constantes as visitas a este estabelecimento, realizadas por políticos, comerciantes e demais interessados na grande novidade da província. Entre os muitos visitantes encontra-se a grande autoridade do Império Luís Filipe Maria Fernando Gastão, conde d’Eu, um nobre francês (1842-1922), tornou-se príncipe imperial consorte do Brasil, com o casamento com a última princesa imperial, Isabel Cristina Leopoldina de Bragança, filha do Imperador do Brasil, Dom Pedro II.

Em junho de 1889, após a posse do gabinete do Visconde de Ouro Preto, o príncipe consorte, Conde d’Eu, saiu em expedição pelas províncias do antigo norte do Império, que tinha o propósito de busca de popularidade e de adesão de novos aliados para a manutenção do regime Imperial. Tratava-se de uma longa viagem na qual iria percorrer as províncias litorâneas do vasto país, passando por todas as capitais entre o Amazonas e a Bahia.

Foto Reprodução Acervo Ana Medina

Depois de dois meses chega a Sergipe, tendo sido recebido com grandes festas, apesar da conjuntura, na qual a monarquia perdia apoio popular. Para esta visita foi organizada três Comissões e entre elas estava José Augusto Cezar Ferraz, gerente da Sergipe Industrial que provavelmente incluiu a sua fábrica no roteiro de S. A. Após percorrer as ruas da cidade e fazer visitas a quartéis, hospitais, escolas e repartições públicas, se dirige a Sergipe Industrial e encerra as atividades programadas no Palácio do Governo. Vejamos o que reproduzimos do jornal A Reforma, dirigido por Apulchro Motta, nº 142, 4 de setembro de 1889:

Recebido à porta principal pelo digno gerente, o incansável José Augusto Cezar Ferraz, Dr. Daniel Campos, médico gratuito dos operários, Eugênio David, diretor técnico e acionista Dr. Thomaz Cruz e o coronel Simão Telles de Menezes, S. A. entrou por entre alas dos operários da obra externas e de grande número de pessoas presentes.

Thomaz Cruz ( 1852-1819) Foto Reprodução Dissertação de Mestrado Maria Lúcia Cruz

Logo à entrada, dirigiu-lhe a palavra o Sr. Francisco José Alves, em nome dos libertados pela áurea lei de 13 de Maio do ano que findou.

Entrando na casa das máquinas, S. A. examinou uma por uma todas as suas oficinas e mais dependência, indagando quanto tempo tinha a fábrica de serviço, quantos teares dispunha para o trabalho, número de pessoas que empregava em seus diferentes misteres. Louvou a boa ordem que observava e admirou a quantidade da produção diária.

Ao chegar S. A. Imperial junto ao maquinário em que trabalhava a intelectual sergipana Amália de Siqueira, todo o movimento da fábrica cessou, como se por encanto, e, em nome de suas companheiras, dirigiu aquela operária – algumas palavras de felicitação ao seu Nobre Visitante.

Concluída a visita, descansou S. A. alguns minutos no gabinete do diretor técnico, onde se havia preparado um elegante Buffet.

Dignando-se de aceitar uma taça de champagne, S. A. foi brindado pelos Srs. José Augusto e Dr. Daniel Campos, e, por sua vez, saudou à prosperidade da Sergipe Industrial.

O mesmo Sr. José Augusto ofereceu em seguida a S. A. um rico álbum de amostras dos produtos da nossa fábrica de fiação e tecidos, como sinal de recordação da Imperial Visita. S. A. agradeceu com especial agrado o presente, pronunciando algumas palavras muito lisonjeiras para a digna direção daquele estabelecimento.

O álbum além de conter em folhas soltas, amostras de todos os tecidos manufaturados na Sergipe Industrial, tinha também três folhas de saudações e cumprimentos a S. A. e à Família Imperial, nitidamente impressa à tinta de diferentes cores e douradas.

A capa do livro era de cetim amarelo, com dorso de gorgurão verde. Na parte principal eram entrelaçadas, em monograma, as iniciais – S – I -, em letras de prata.

Além do trabalho tipográfico, que saiu das oficinas do nosso jornal, concorreram para o bom êxito da obra os artistas nossos coprovincianos Júlio Pinto e Theodulo Lobão.

Concluímos esta parte da descrição, mencionando que todos os operários da fábrica trajavam um avental do produto d’ali, conhecido no mercado pela marca de 13 de maio.

Ao retornar ao palácio Sua Alteza mostrou-se pesaroso por não poder demorar-se por mais tempo nesta cidade. Sabendo do diretor da Companhia Pernambucana que era de mister estar a bordo até as 4 horas da tarde, declarou que não podia assistir ao jantar que lhe fora preparado, aceitando, todavia, uma ligeira refeição.

Conde d’Eu Foto Reprodução / Internet

Outros visitantes            

A visita realizada as instalações da Sergipe Industrial pelo governador do Estado, que o deixou bastante impressionado pela organização e administração do estabelecimento, também visitou o chalet, que segundo o jornalista que acompanha a Comitiva, registrou na edição da Gazeta de Sergipe. Ano I – nº 62 de 15 de março de 1890, como sendo “obra mais elegante que o Estado possui naquele gênero”. Vejamos:

Visitou ontem a Sergipe Industrial o Governador do Estado, Dr. Felisbello Freire, acompanhado de seu ajudante de ordens, secretário, capitão do porto, oficial de gabinete, comandante da força de linha e inspetor do tesouro.

Felisbelo Firmo de Oliveira Freire Acervo do IHGSE

S. exc. foi recebido à porta principal do importante estabelecimento pelo digno gerente da mesma fábrica, ´sr. José Augusto C. Ferraz, Dr. Eugênio David, diretor técnico das oficinas, guarda livros da Associação Sergipense, e os representantes desta folha que se achavam presentes.

Ao entrar s. ex. na vasta área que separa os armazéns das oficinas, passou por entre alas de trabalhadores externos com os seus instrumentos em punho, que saudaram com vivas ao digno administrador do Estado.

Após ligeiro descanso s. ex. percorreu o edifício em todas as suas dependências, demorando-se e analisar o trabalho de cada máquina, sem ocultar sua admiração pela ordem e asseio dos mesmos trabalhos.

Passou depois s. ex. a visitar o esplêndido chalet que a Sergipe Industrial está preparando para a residência do incansável gerente, que pelo seu zelo, inteligência e dedicação tanto têm concorrido para o engrandecimento daquela empresa.

Realmente o referido chalet é a obra mais elegante que o Estado possui naquele gênero.

Em seguida o Sr. José Augusto convidou s.exc. e todos os seus companheiros para um lanche improvisado, onde trocaram-se diversos brindes.

Durante a visita de S. ex. recebeu a Sergipe Industrial mais as visitas do tenente Xavier Lobo, Dr. Daniel Campos, médico da fábrica, Dr. Acioli, juiz municipal de Riachuelo, capitão Rozendo Garcia Rosa, Dr. Promotor Público da capital, Dr. Enéas Ferreira e o contador da tesouraria de fazenda, Ananias de Azevedo.

Fazendo-se noite, s. ex. foi apreciar o magnífico aparelho de luz elétrica, que serve para o serviço da Sergipe Industrial, quando há necessidade de prolongar-se o serviço pela noite.

S. ex. trouxe da Sergipe Industrial as mais agradáveis impressões.

Capela Sergipe Industrial Foto: Acervo Ana Medina

Realmente, é o estabelecimento mais importante do Estado, pelo número de famílias que dele tiram o seu alimento, pelos resultados pecuniários que dele obtém os seus associados e pela direção ativa, inteligente e moralizada que o impulsiona.

É de crer que S. exc., tendo apreciado de perto, com os próprios olhos, a importância da Sergipe Industrial e as vantagens que o Estado dela tira, continue à dispensar-lhe a consideração que deve merecer dos poderes públicos.

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O Republicano de propriedade de Josino Menezes, tendo como Diretor Joaquim Anastácio de Menezes era um jornal de grande prestigio no Estado. Havia sido fundado em 1º de janeiro de 1889 em Laranjeiras, cujo Redator-Chefe era o historiador Felisbello Freire e Redatores como Silvio Romero, João Ribeiro, Lima Júnior e outros republicanos. O artigo abaixo foi publicado na edição, Ano III, nº5 em 13 de janeiro de 1891:

Fomos, em visita, a esse notável centro de atividade e progresso, que nos maravilhou por seu inteligente e moralizado policiamento introspectivo e diretor, regularidade e boa ordem na execução dos diversos serviços técnicos, e aperfeiçoamento progressivo das manufaturas que prontifica.

O cavalheiro gerente do estabelecimento, Sr. José Augusto Cezar Ferraz, com uma distinção de modos que abona a distinção de sua educação, faz-nos perlustrar toda a fábrica, mostrando-nos explicando-nos pacientemente as diversas seções e mestres do grande maquinismo, que prepara os tecidos de algodão oriundo deste estado.

Os aparelhos são esplêndidos, nada têm a invejar aos montados em outras localidades industriais do Brasil, o que atestam a qualidade e a quantidade dos produtos que lança ao consumo interno e ao mercado extraestadual.

Progride a empresa, prometendo aos seus associados uma larga inventariação de lucros e vantagens; e assegurando a algumas centenas de proletários um pão cotidiano mui saboroso, porque nenhum outro é mais honrado que o que distribui, e com fartura suficiente para o enlace e formação de famílias novas.

Com escola de operários, são inegáveis os serviços que tem prestado ao ramo de indústria que cultiva; pois que da gente que educa no trabalho não se poupa a disseminara que pode para levar a outras partes a idoneidade no seu gênero de serviço.

Como desafio a uma agitação industrial capaz de engrandecer as rendas públicas; e como propagandista pelo exemplo do poder do espírito de associação, e que em verdade nada tem conseguido: porque até hoje não há linfa possível para o bacilo da tísica moral que consome a coragem sergipana, ante os mil caminhos de riqueza, que se abrem à sua atividade doentia pelos novos empreendimentos e milagres da coesão de ideias e economias individuais.

Depois de si, a Sergipe Industrial ainda não viu lançar-se outra companhia de exportação de trabalho, desta ou outra natureza, embora tenha patenteado as vantagens de comunhão de força e do labor constante.

Tanto mais sentimos este fato estranhável, quanto mais sabemos que os melhores elementos de opulência provocam vivamente a nossa cobiça e atividade nesta terra.

Para a sua mão de obra os sergipanos têm tudo largamente nos três reinos da natureza.

Cultivemo-nos, que hão de chegar à verdadeira pletora financeira.

Corrobora a força desta proposição a prosperidade da Sergipe Industrial, da Associação Sergipense e da Espinheira Saboaria.

A cláusula final destas linhas é um voto pela continuação do desenvolvimento da Sergipe Industrial, para quase se veja se o que desperta a natureza, acordará o espírito do nosso povo para a luta pelo bem-estar e pelo porvir.

Ao trabalho, sergipanos, povo-rei pelo talento e dons materiais da natureza! 

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Outro visitante descrito pela Gazeta de Sergipe. Ano II nº 331 de 18 de fevereiro de 1891, foi o governador Mendes de Morais, militar nomeado por decreto presidencial de 26 de janeiro de 1991 a 27 de maio do mesmo ano. Vejamos:                                   

Assistimos anteontem à visita feita pelo exm. Sr. Dr. Mendes de Morais à fábrica de tecidos e fiação de Cruz & Cia, Sergipe Industrial.

S. ex. em companhia de sua digna consorte das exma. Senhora e cunhada do Sr. tenente-coronel Serra Martins, Dr. exm. D. Ana Monte, professora pública da capital do Dr. chefe de polícia, do tenente-coronel Serra Martins, do chefe da Estação telegráfica e de seu venerando pai, do Sr. José Calasans e do Dr. Barbuda aquele importante estabelecimento, sendo recebido na escola pelo digno gerente da fábrica Sr. José Augusto, o Dr. Daniel Campos, médico do estabelecimento, do Dr. Eugênio David, diretor técnico da fábrica e por nosso colega Apulcro Motta.

Ao transpor a porta que dá entrada para as diferentes seções de trabalho, a banda de música do estabelecimento executou uma brilhante marcha.

S. ex. examinou cuidadosamente toda a oficina, demorando-se a apreciar o trabalho de cada seção.

Terminado o passeio pelo interior da oficina, o Sr. José Augusto convidou a S. ex. e os seus amigos para descansar no esplêndido chalet de sua residência.

Aí foi servido um copo de champagne, brindando a S. ex. o Sr. D. Barbuda.

Aproximando-se a hora de encerrarem-se os trabalhos, foram todos apreciar a luz elétrica e a saída dos operários.

S. ex. ainda deu um passeio pelo bairro Industrial.

Seriam oito horas da noite quando s. ex. resolveu retirar-se, embarcando todos no cais da fábrica, onde se achava postada a banda de música da fábrica.

S. ex. sua exmª. Consorte e toda comitiva volveram penhoradissima pela maneira porque foram tratadas pelo digno gerente da fábrica e sua digna esposa.

De. S. ex. ouvimos que poucos estabelecimentos congêneres hão na União que sobrepõem em elegância, ordem e asseio à Sergipe Industrial.

E, entretanto, por mesquinha vingança foi para aquele estabelecimento que primeiro lançou suas vistas de abutre o Dr. Felisbello Freire!

Ah! onde encontram trabalho mais de 500 pessoas pobres, sendo a maior parte moças honestas.

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[*] É jornalista e escritor. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com