GILFRANCISCO: jornalista, professor universitário, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e da Associação Sergipana de Imprensa – ASI, do Grupo Plena/CNPq/UFS e do CPCIR/CNPq/UFS. Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal de Sergipe. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com
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O hábito de fazer poemas tem uma longa história. Começa com os gregos antigos que, muito antes de nós, já haviam descoberto a importância das artes e da poesia na vida dos homens. Mas a poesia não está só nos livros, nem é feita só de grandes poetas. Os poetas são seres muito especiais que, através da vida, conseguem manter a capacidade de se encantar com as coisas mais simples.
Vanessa Buffone surgiu na terra d’Oxum como um grande acontecimento nas letras baianas, um nome hoje consagrado no circuito dos novos poetas e contistas, pelo acentuado amor às letras, cuja poesia saudável, cheira a primavera, como pétalas de lírios que nos acariciam a alma. Vanessa escreve versos fluentes, vivos, sem fronteiras, libertos como os seus pensamentos. Tudo é pura simplicidade nos seus versos, nascidos todos de motivos leves, cheios de encantos de ternura.
Usando a seu modo uma poesia que tem ritmo próprio, visão mais livre e poética das coisas, Vanessa Buffone traz em sua obra marcas de experimentos com os sons e os significados das palavras, através de instrumentos variados e clareza de raciocínio. Sua contribuição pessoal e sua inovação original fazem com que Vanessa Buffone trace um vivo e vivido retrato com aquele mesmo desprendimento que sempre nutriu sua personalidade.
Essa descoberta em Vanessa Buffone transmuda-se em técnica de prospecção e sondagem nos veios túmidos da linguagem poética. É o próprio poeta que abre perspectivas de criatividade pura, descobrindo em si mesma uma nova experiência. Toda sua poesia respira um fazer de formas modernas, instigantes, um refazer de temas e conteúdo.
Prêmio Braskem (2005) para autores iniciantes com o volume de poemas As Casas Onde Morei, editado pela Fundação Casa de Jorge Amado, com abas da contista Renata Belmonte, Vanessa estreia bem, com um livro simples, mas encantador. A autora conta várias publicações esparsas em periódicos ou mostrando uma parte bem pequena de sua lavra em Os outros poemas que falei, Banco Capital, 2004. Considerando-se as várias facetas da personalidade de Vanessa Buffone – jovem poeta carioca, advogada e radicada na Bahia – há de se entender facilmente como é útil e importante para a literatura baiana essa coletânea de versos tão esperada, somente agora publicada.
O contato aberto com a obra de poetas baianos dos anos 60/70, autores que refletiram sobre os problemas de sua época, uma época marcada por injustiças, repressão militar e desigualdade social, marcou tão profundamente seus primeiros passos literários, pois Salvador dos anos 90 vivia o momento das grandes transformações urbanas, levadas a efeito pelo arquiteto João Filgueiras Lima, conhecido por Lelé.
Os jornais anunciavam diariamente o perfil da nova cidade que surgia com seus edifícios coloridos, passarelas nas grandes avenidas e várias instituições de ensino superior. Nos principais cafés e bares “literários”, via-se com frequência vários grupos de intelectuais. Agora surge o Sopa (Sociedade de Poetas e Amigos) ampliando esse movimento e acolhendo autores dessa geração: Antônio Carlos de Oliveira Barreto, Jotacê Freitas, Elizeu Moreira Paranaguá, Miguel Carneiro, Zeca de Magalhães, Bernardo Linhares, José Inácio Vieira de Melo, Henrique Wagner, Gustavo Felicíssimo e a própria Vanessa Buffone.
O movimento “Sopa”, que acaba de publicar o nº4 do órgão de divulgação, “Sopa Poesia e Afins”, um jornalzinho literário bem transado de 12 páginas, é a mais recente alternativa da poesia baiana nos últimos anos. Alguns dos seus integrantes que migraram de outros grupos ou movimentos, são destaques graças ao talento e habilidade no fazer poético, como é o caso de Miguel Antônio Carneiro, organizador da publicação “Sete Cantares de Amigo”, 2003, e José Inácio Vieira de Melo, organizador de “Concerto Lírico a Quinze Vozes” (uma coletânea de novos poetas da Bahia), 2004 e Vanessa Buffone que coordena o projeto Malungos da Poesia, apresentando a cada noite um grupo de poetas, contistas ou ensaístas amigos, parceiros de vida e de caminhada literária.
Presença marcante na poesia baiana nesse último quinquênio, Vanessa Buffone deu um salto em linguagem: pura poesia que desfia poemas curtos e luminosos, vencendo em um gênero dominado por homens, a poesia – uma luta que não foi fácil, encontrou dificuldades em levar sua obra ao público. Sua obra poética merece a devida atenção crítica, produziu uma poesia com grande coragem, com liberdade, disposta em alargar os horizontes morais de onde vive, canta em poesia a espontaneidade do amor, faz isso muito bem, mas somente o tempo vai mostrar sua grande força.
Vanessa tem versos líricos modernos de forma perfeita que podem interessar a qualquer um, surpreendentes que proporcionam ao leitor a sensação de que está abrindo uma janela para o sol e para uma outra vida. O leitor que se propuser a essa procura haverá de encontrar momentos culminantes em que o mascaramento d realidade física dos corpos se rompe e o verso curto e respiratório da poesia levanta voo como um pássaro.
Além de jovem, linda, bem-humorada, meiga e cortejada, a poeta cria com mãos da mestra e notável segurança de gosto, um dos traços que a singulariza, impõe e se expande pela prática de uma poesia livre, escrita diretamente por linhas tortas, num tempo em que os poetas fogem à berrante cor local, para alcançar as paragens bucólicas e idílicas, provocando reações adversas.
Pertencente à nova safra dos bons poetas baianos, e não ter ainda no grande público a repercussão que merecia, muito mais restaria a dizer sobre esta obra de Vanessa Buffone, que consegue equilíbrio e engrandece com as suas poesias a literatura baiana. Por essa razão, convido você a conhecê-la melhor, e a mergulhar no vasto mar de poesia, cheio de encantos e mistérios, onde às vezes uma gota fala por todo oceano.
Leiam devagar e a descubram¹.
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¹ Jornal da Cidade. Aracaju, 24 de maio de 2006. Jornal da Cidade. Aracaju, 2 de junho de 2006.
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