GILFRANCISCO é jornalista, pesquisador e escritor. Membro do Grupo Plena/CNPq/UFS e do CPCIR/CNPq/UFS. Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal de Sergipe – UFS. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com

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Fragmon Carlos Borges, orador e jornalista do extinto jornal do Partido Comunista Brasileiro, A Verdade (SE), dirigido por José Waldson Campos, militou como secretário de divulgação e propaganda do partido durante vários anos. Estudioso da questão agrária, o sergipano de Frei Paulo, destacou-se como quadro do PCB de Pernambuco, tendo se tornado, depois de 1959, pessoa chave na direção do semanário Novos Rumos (RJ). Morreu em São Paulo, nos anos setenta, vítima de um infarto fulminante, ao qual certamente não estiveram alheias as tensões da clandestinidade impostas pelo regime militar de 1964. Fragmon Carlos Borges foi anistiado com fundamento no Art. 1º da Lei 6.683/79 de 28 de agosto de 1979.

Primeiros Passos   (foto de Fragmon caricatura)

Fragmon Carlos Borges, diretor da Folha Popular – Foto: Reprodução

Ligado ao grupo jovem de Mensagem dos Novos de Sergipe, do qual faziam parte Márcio Rollemberg Leite, Carlos Garcia, Aluysio e Walter Mendonça Sampaio, Nélson de Araújo, Paulo de Carvalho Neto, Enoch Santiago Filho, Fábio Silva, João Batista Lima e Silva, Lindolfo Campos Sobrinho, Alberto Barreto de Melo, Jenner Augusto, Florival Ramos, José Menezes Campos, Floriano Garangau, José Nunes Mendonça, Armindo Pereira e outros, dedicados às atividades culturais e a política partidária, simpatizantes ou membros do PCB, estavam todos envolvidos nos seguintes periódicos: Mensagem (órgão cultural, 1939), Símbolo (Órgão Cultural, 1939) e Época (Mensário a Serviço da Cultura e da democracia, 1948/1949).

Filho de Francisco Carlos Borges e Maria Lali Carlos Borges, Fragmon Carlos Borges, nasceu a 12 de abril, 1927 em Frei Paulo – SE, era sobrinho do engenheiro civil, formado na Bahia Josaphat Carlos Borges, ex-prefeito Municipal de Aracaju (1946/1947), nomeado pela interventoria Federal do coronel Antônio de Freitas Brandão, indicado pela UDN. Devido às qualidades morais e de caráter, técnico de reconhecida capacidade e propriedade, administrador seguro e cioso de suas tarefas, graças aos seus méritos de bom administrador foi nomeado para dirigir o Departamento Nacional de Estradas de Ferro – Seção Bahia. O Jornal do Povo em sua edição de 22 de abril contestou o seu nome para Prefeito de Aracaju, alegando desconhecer a terra, seus homens e sua força política:

 “O Sr. Josaphat – disse o povo – foi o homem que na campanha eleitoral, há horas tardias da noite, afixou boletins anônimos pela cidade caluniando, em palavras grosseiras um candidato à Presidência da República; foi o homem que rasgou ostensivamente chapas do PCB e do PSD na 9ª seção eleitoral; foi o homem que desafiou ferroviários para brigar, em frente à dita seção; foi o homem que se esforçou, usando, para anular a mesma seção eleitoral, o que afinal conseguiu, sendo de notar que aquela foi à única votação anulada em Aracaju”.

Formação Escolar

Fragmon tinha outros irmãos também militantes comunistas, José Carlos Borges que recebera Menção honrosa por participar do concurso de contos, entre escritores da nova geração do jornal cultural Símbolo, com o conto Neblina. Outro irmão, Carloman Carlos Borges (Frei Paulo-SE, 11 de março, 1931 – Feira de Santana – BA, 3 de fevereiro, 2010)1 foi preso em 28 de agosto de 1951, aos 20 anos, pelo investigador de Polícia Sebastião Dantas Barreto, por ser o mesmo de alta periculosidade e perigoso agente comunista. O histórico da ficha policial diz o seguinte: “Carloman Carlos Borges, é irmão do comunista e agitador Fragmon Carlos Borges, também fichado nos órgãos de Segurança, por subversão, agitação e outros, constando ainda, que o mesmo fez viagem para Moscou em datas passadas, onde tirou curso”.

Carloman estudou o Ensino Fundamental em 1945 na Escola Técnica Comércio de Uberlândia (MG) em 1946 retorna a Aracaju e se matricula na Escola Técnica de Comércio de Sergipe, nos anos de 1959/1960 estuda na Escola Técnica Comércio de Botafogo (RJ) e conclui o curso em 1963 na Escola Técnica de Eletrônica Francisco Moreira da Costa (MG). Em 1968 obteve sua Licenciatura Plena em Matemática pela Universidade de Itajubá (MG), fez Mestrado e Doutorado em Matemática na Universite de Montpellier II, França.  

Fragmon Carlos Borges estudou também em Uberlândia, onde liderou expressivo movimento estudantil. Retornando à Aracaju nos anos 40 trabalhando na condição de representante de uma Companhia de aviação, Linhas Aéreas Brasileiras – LAB, símbolo de segurança, conforto e pontualidade, através da firma Carlos Borges & Cia, situada à Rua Laranjeiras, 87, tendo como sócio Tenison Freire. 2 Homem de atitudes firmes, logo ao retornar ingressa no Partido Comunista, empenhando-se em convicta militância que não demorou surgisse incompatibilidade entre ele e seu sócio na agência. Não sabemos se Fragmon concluíra o curso na Escola de Comércio Conselheiro Orlando, que mudara de nome para Escola Técnica de Comércio que sempre funcionou na Rua Pacatuba, em virtude da existência de alguma pendência, certamente política. O Jornal do Povo, edição de 7 de maio de 1947 publicou a seguinte nota:

Convite à classe estudantil e ao Povo

Ficam convidados todos os estudantes de Sergipe e o povo em geral para assistirem a sessão da Congregação da Escola de Comércio Conselheiro Orlando, quarta-feira próxima, dia 7 as 7 horas da noite, onde será resolvido o “caso” do colega Fragmon Borges.

A Comissão.

Espancamento 

Texto de autoria do jornalista, pesquisador e escritor, GILFRANCISCO.
Fragmon Carlos Borges – Foto: Reprodução

Em outubro de 1948 o jornalista Fragmon Carlos Borges encontra-se no Rio de Janeiro, enviado como delegado para participar da 1ª Convenção Nacional de Defesa do Petróleo, e desse encontro publica na revista Época dois artigos: O Petróleo e a União Nacional (nº2, outubro/novembro, 1948) e Solução Dutra (nº3, janeiro, 1949). 3 Meses depois, seria preso às dez horas da manhã de 29 de abril, em plena Rua São Cristóvão, Centro de Aracaju quando foi abordado por três indivíduos e colocado em um carro de Praça, em seguida conduzido até o Mosqueiro. Após sofrer tentativa de morte na Praia do Mosqueiro, um povoado afastado do perímetro urbano da capital aracajuana pela Polícia de Sergipe, sobre a agressão ao jornalista Fragmon Carlos Borges, comandada pelo professor e chefe de Polícia, João de Araújo Monteiro.

Assim, o Correio de Aracaju, em sua edição de 2 de maio de 1949, inicia o artigo, “Aumenta a onda de Violência”:

A polícia do professor Monteirinho dando andamento à série de crimes que vem perpetuando por todo o Estado de Sergipe, em flagrantes desrespeito aos princípios constitucionais, levou a feito na sexta feira última, mais uma sórdida investida contra os direitos assegurados pela Carta de 46, atentando, acintosamente contra a vida de um cidadão.

Devido a repercussão das atrocidades em vários estados do país, o senador sergipano Walter Prado Franco (UDN), 4 fez leitura em 3 de maio de uma publicação do jornal Correio da Manhã, denunciando o espancamento do jornalista Fragmon Carlos Borges, pela Polícia de Sergipe. Depois do incidente ocorrido, Carvalho Neto 5 envia carta ao Governador do Estado de Sergipe, Moacir Sobral Barreto, relatando a arbitrariedade cometida por Monteirinho, 6 vejamos um trecho da carta, publicada na edição do Correio de Aracaju de 6 e 10 de maio de 1949:

Chegou à minha residência, barbaramente espancado pela Polícia o Sr. Fragmon Carlos Borges, jovem de minhas relações e descendente de uma das famílias de melhor conceito em nosso Estado. Surrado, humilhado, ocorrido, veio pedir o amparo do velho advogado, seu amigo, nesse angustioso transe de sua vida. Disse-me que o pretexto da surra que apanhara, numa cena horrenda de lampionagem, fora o de se lhe atribuir à ideologia comunista, circunstância que o Diário de Sergipe num preparo prévio, por mais de uma vez, tem assinalada.

Vejamos o texto Espancado um jornalista, em Sergipe, publicado no Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, em 3 de maio:

Aracaju, 2 (Asp.)

O jornalista sergipano Fragmon Carlos Borges, após haver sido preso por ordem do secretário de Segurança Pública e conseguir sua liberdade por intermédio do advogado Carvalho Neto, foi novamente preso sexta-feira última. Os policiais sequestraram o jornalista, conduzindo-o em um automóvel à distante localidade de Mosqueiro, onde dentro de uma mata o espancaram com uma borracha de pneu de automóvel e outros instrumentos. Banhado em sangue, o Sr. Fragmon foi abandonado como morto no local do espancamento. Recuperando os sentidos e vendo que os seus agressores já haviam partidos, conseguiu alcançar a cidade próxima, onde pessoas amigas o socorreram. Sábado, o advogado Carvalho Neto requereu exame de corpo de delito na pessoa do agredido, o que foi feito perante o juiz da vara criminal. Ferimentos e equimoses foram fotografadas e ainda no sábado a vítima, acompanhada do seu colega Paulo Costa, compareceu à Assembleia Legislativa, exibindo aos deputados presentes o seu corpo coberto de ferimentos.

Na edição do dia seguinte do mesmo periódico, a coluna “No Mundo Político”, registra:

Para não escrever mais contra o Sr. Monteirinho.

Aracaju, 3 (Asp.)

O jornalista Fragmon Carlos Borges concedeu uma entrevista à imprensa, exibindo aos colegas o corpo completamente coberto de equimoses. O entrevistado declarou que, enquanto o espancavam, os policiais diziam que a surra era para ele não escrever mais contra o Sr. Monteirinho, Secretário da Segurança Pública.

Entrevistado em 9 de maio pelo Sergipe-Jornal, o advogado Carvalho Neto diz que:

Sergipe guardará indelével, as recordações desse atentado, e estigmatizará na História a autoridade criminosa que o perpetrou. João de Araújo Monteiro e Manuel Ribeiro, 7 inimigos das liberdades públicas, aquele espancamento, este prendendo e lançando em cubículos infectos jornalistas que dissentem da orientação governamental, ambos, como autoridades igualmente criminosas, terão os nomes indelevelmente guardados na recordação da gente sergipana.

O senador Augusto Maynard Gomes (PSP), Interventor Federal no Estado de Sergipe durante o período de 1930 a 1935, assim manifestou ao jornal A Manhã (Rio), republicado pelo Correio de Aracaju de 10 de maio:

Ao que sei, trata-se de um elemento comunista que já vinha às voltas com a polícia, desde que esta teve de intervir no caso de um circo que devia realizar um espetáculo em favor do Congresso da Paz. O proprietário do circo, advertido pela Polícia de que se tratava de um movimento comunista, voltou atrás. Mas os agentes comunistas, inclusive o pseudojornalista, que quiseram restituir os bilhetes vendidos, o que deu motivo a uma queixa do gerente do circo contra os mesmos. É o que sei, por enquanto, sobre o assunto.

Em 18 de julho, o Deputado Coelho Rodrigues (1893-1959, U.D.N. – Piauí, proferiu discurso no Congresso Nacional, sobre a barbárie cometida contra o jornalista Fragmon Carlos Borges:

Sr. Presidente: Infelizmente venho trazer ao conhecimento da Casa fato de suma gravidade que abalou a sociedade de Aracaju: um espancamento bárbaro, praticado por policiais à paisana na pessoa de um jornalista. O Sr. Fragmon Carlos Borges. O crime que apontavam contra o jornalista era de ideologia estranha à democracia brasileira. A maneira de agir da Polícia – o espancamento, tendo antes sido preso sem alimentação – está longe de corresponder a um método de repressão adequada a uma nação civilizada contra quaisquer adversários político, seja por motivo de ideologias exóticas, seja por atitudes policiais. Não podíamos deixar passar este ato sem lançar o nosso protesto perante o país e dirigir um apelo ao General Eurico Gaspar Dutra no sentido de mudar os métodos adotados pelos elementos da Polícia, os beleguins que queiram, por meios violentos, reprimir a consciência daqueles que têm a coragem de defender suas ideologias. As medidas atualmente empregadas só podem trazer frutos completamente diferentes dos que espera a Nação Brasileira. Exibo desta Tribuna a fotografia tirada, do jornalista Fragmon Carlos Borges, depois do espancamento praticado pelos beleguins à paisana, num café de Aracaju, a fim de demonstrar o quanto foi revoltante esse atentado, depois de uma reclusão de mais de 24 horas sem alimentação.

Vou ler à Casa a seguinte carta do Dr. Carvalho Neto, ilustre advogado de Aracaju:

                                  

Carvalho Neto – Foto: Reprodução

Distinto conterrâneo e amigo Dr. Moacir Sobral Barreto, d. d. Vice-Governador do Estado:

Impõe-me a consciência profissional, tanto quanto a de simples cidadão, que lhe denuncie, de próprio punho, um fato de suma gravidade, anteontem ocorrido neste Município, fora do perímetro urbano da Capital.

Chegou à minha residência, barbaramente espancado pela Polícia o Sr. Fragmon Carlos Borges, jovem de minhas relações e descendente de uma das famílias de melhor conceito em nosso Estado.

Surrado, humilhado, ocorrido, veio pedir o amparo do velho advogado, seu amigo, nesse angustioso transe de sua vida.

Disse-me que o pretexto da surra que apanhara, numa cena horrenda de lampionagem, fora o de se lhe atribuir à ideologia comunista, circunstância que o Diário de Sergipe num preparo prévio, por mais de uma vez, tem assinalada.

Ora, sr. Governador, para o advogado, diante de um homem surrado, não interessa saber qual seja uma ideologia: – comunista, fascista ou democrática. O que a comove, o que o horroriza, o que o faz bradar, é a certeza de que um seu patrício se acha perversamente espancado, com o corpo lanhado a tagantadas da Polícia.

Foi para situações como esta que lavrei, há anos, no meu livro Advogados – páginas de candente protesto contra as violências dessa espécie, em razão dos quais se depara ao advogado a missão mais árdua do seu ministério. Lá está, enfeixando um longo capítulo.

Eis que surge, porém, para o advogado o mais penoso de sua tarefa.

Quantos dos denunciados são verdadeiramente culpados?

Quantos apenas merecem condenação atenuada? Quantos são inocentes? E pode o advogado, nessa emergência, ficar indiferente ao apelo dos acusados, não lhe dando, como carecem, a mais completa assistência? Pode mesmo recusar o patrocínio ex-oficio? Ser-lhe-á lícito desertar a defesa, quando o réu, neste último caso houve declarado que se não quer defender, ou mesmo que não aceita o advogado nomeado?

É bem de ver que não quaisquer que sejam os óbices a vencer. Na crise atual valha-nos a certeza de que os advogados brasileiros têm sabido manter a refulgência do seu nome na Tribuna da defesa.

Impávidos, altivos, sobranceiros, desinteressados! (Pags. 288-9). Não me desminto, hoje, para fugir aos imperativos do meu dever profissional. O que escrevi, àquele tempo, já era a longa prática de uma vida consagrada ao Direito.

É agora, mais do que dantes, sinto que me não posso afastar desse dever.

O que peço é lei, é foro, é justiça!

Nunca nos lances mais trágicos porque tem passado a nossa terra, eu vira uma cena de tamanha cobardia e crueldade.

Sei que V. Excia., Sr. Governador, de índole pacífica, de educação esmerada, de sentimento cristão, não concorda com tais barbaridades.

Repugna a qualquer homem de bem asselar com o seu apoio à responsabilidade desse crime hediondo.

O físico do cidadão é sagrado e o Estado democrático é organizado para tutelar a integridade desse físico.

Sergipe guardará indelével, a recordação desse atentado, e estigmatizará criminosa que o perpetrou.

Deus ilumine o governo de v. Excia., para que a nossa terra não fique ao desamparo da lei.

Amigo obrigado

Carvalho Neto

Aracaju, 1º de maio de 1949  8

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O Sr. Heribaldo Vieira – Deve V. Excia. acrescentar ao seu discurso que o Dr. Carvalho Neto não é somente grande advogado, mas, também, grande escritor, quer literário, quer de assuntos jurídicos, e foi representante da nossa terra nesta Casa, onde desempenhou sua função como o maior brilho, dando ao nosso pequeno Estado o relevo a que só poderia encontrar na expressão do Sr. Doutor Carvalho Neto, uma das glórias de Sergipe.

O Sr. Coelho Rodrigues – Agradeço o aparte de V. Excia.

Sr. Presidente, para terminar solicitaria a V. Excia. fizesse publicar a seguinte notícia, incerta no “Sergipe-Jornal” como parte de meu discurso, relativamente ao debate havido na Assembleia Legislativa, em que foi acusado o Secretário de Segurança Pública:

Dois discursos incisivos, sérios profundamente meditados, foram proferidos ontem na Assembleia Legislativa do Estado, pelos líderes da U.D.N. e do P.S.D., deputados Seixas Dória e Orlando Dantas.

Ambos somaram as suas vozes na defesa das liberdades públicas e da integridade física dos seus conterrâneos. Toda a assistência os escutou em silêncio comovida frente a narrativa dos fatos que depõem contra qualquer Governo, por mais déspota, por mais sanguinário que ele seja. Nunca, nos anais do Legislativo sergipano, foram registrados fatos de tamanha gravidade e repercussão política e social, atribuídos a um Secretário de Segurança Pública. Ambos os ilustres deputados vergastaram o atentado sofrido pelo jornalista Fragmon Carlos Borges, concretizado, à luz do sol, num sequestro impar nas páginas do policiamento nordestino. Esclarecendo os seus ilustres pares, disse ainda, o Deputado Orlando Dantas, que tudo fazia crer na responsabilidade do Sr. João de Araújo Monteiro Secretário de Segurança Pública, não só pelos antecedentes verificados, como também, pela ligação funcionam dos agressores com S.S. O líder da U.D.N. inflamado de justos motivos contra mais essa opressão disse, de público, revidando aparte do Deputado Manuel Ribeiro – o mesmo que prendeu jornalistas no regime ditatorial, lançando-os em cubículos infectos, e mimoseando-os com a torpeza da incomunicabilidade – que o Sr. João de Araújo Monteiro não poderia ser acreditado por aquela Assembleia, porque era vezo seu faltar a verdade. E, concluindo, mostrou que os indícios, que são a prova maior que se pode colher contra os desmandos das autoridades policiais, entendidas, e confraternizadas no sentido de anular a prova testemunhal, eram já suficientes para que afastado fosse, incontinente, da Secretaria da Segurança Pública, para o bom nome do Governo de Sergipe, e respeito a uma população espezinhada, o indigitado mandante do sequestro e espancamento do jornalista Fragmon Carlos Borges. O líder do P.S.D., Deputado Levindo Cruz, candidato a um juizado de direito, veio pôr fim à Tribuna, para vergastar também a violência, mostrando, todavia, que era cedo ainda, para se apontar como criminoso o Secretário da Segurança Pública, seu amigo pessoal e uma das figuras destacadas do P.S.D. em Sergipe. Essas duas últimas condições – correligionário e amigo – justificam, perfeitamente, a posição em que se colocou o Deputado Levindo Cruz. O que é certo, porém, e que o público ficou estarrecido ante as denúncias dos Deputados Seixas Dória e Orlando Dantas, acordes os dois no pedido do afastamento do Sr. João de Araújo Monteiro do cargo de Secretário d Segurança Pública, para a devida e livre apuração dos fatos que lhe são atribuídos.

Poderia, outrossim, constasse dos “Anais” do Congresso a fotografia que aqui exibo e da qual não será difícil tirar um “clichê”, pois constitui símbolo da ação selvagem dos beleguins de um representante da autoridade que devia zelar pelo seu nome, perante a Nação, agindo não dessa maneira, pela força bruta, mas pela ação persuasória como legítimo cumpridor da lei.

Longe disso está o Secretário da Segurança de Sergipe.

O Sr. Heribaldo Vieira – Quando esses fatos ocorreram governava o Estado de Sergipe um representante do Partido Republicano. É bom que fique isto assinalado no discurso de V. Excia.

Era o que tinha a dizer (Muito bem, muito bem). 9

Novos Depoimento 

Foto: Reprodução – Capa do Processo de Fragmon Carlos Borges

Segundo depoimento do compositor, produtor e cantor João Melo (1921-2010) no livro João Ventura Cidadão de Aracaju (2005), Fragmon Carlos Borges foi conduzido pelo jornalista e deputado Estadual Orlando Dantas 10 às dependências da Assembleia Legislativa de Sergipe, nas seguintes condições:

O líder popular estava sem camisa, com as costas sangrando; os pés descalços e cheio de hematomas pelo rosto. Orlando Dantas fez a denúncia da atrocidade mostrando que a vítima fora levada num caminhão da polícia até um terreno baldio na praia do Mosqueiro. Ali, depois de seviciado, foi largado. O jornalista Orlando Dantas saiu, junto a Fragmon para buscar assistência médica, sem esquecer-se de deixar o seu protesto naquela casa e o Jornal Gazeta de Sergipe, do dia seguinte, tornou o caso público.

Perseguido pela força policial do governador José Rollemberg Leite, o jornalista do jornal A Verdade, Fragmon Borges foi mais uma vez surrado, na noite do dia 9 de janeiro de 1951. A agressão ocorreu na cidade de Itabaiana, onde existia um dos maiores núcleos do Partido Comunista no estado depois de Aracaju. Cercado por seis soldados do destacamento local que agiram sob o comendo do integralista Major Temístocles Cavalcante, mesmo em desvantagem Fragmon entrou em luta corporal para se defender, até ser acudido pela população local, que ao ouvir os gritos de socorro se dirigiram até à rua, pondo em fuga seus agressores. Conforme reportagem d’A Verdade, em sua edição de 19 de janeiro, esteve:

Acompanhados de vários companheiros de trabalho, o jornalista Fragmon Carlos Borges visitou os jornais da cidade e alguns deputados na Câmara Estadual, onde foi levantado enérgico protesto pelo Deputado Orlando Dantas contra esta nova violência à sua pessoa. Ninguém mais, porém, ousou dizer uma palavra, nem o trabalhista Macedo. Sem dúvida está demonstrando ser um bom aliado do Sr. José Leite e Monteirinho.

Em 28 de agosto de 1951, mais uma vez é preso em Aracaju, juntamente com 14 operários, estudantes e jornalistas, que se manifestavam publicamente pelo regresso dos “nossos” marujos que Getúlio Vargas enviou para os Estados Unidos da América do Norte, com o objetivo de manda-lo morrer na Coreia.

Perseguições

Segundo edição do jornal Imprensa Popular de 16 de setembro de 1952, Rio de Janeiro:

Há um ano a polícia invadiu as oficinas do jornal A Verdade, de Aracaju, prendeu todos que ali se encontravam e incendiou-os. com a abnegada ajuda do povo sergipano, o edifício foi reconstruído, as máquinas recuperadas, outras novas instaladas e estava anunciado para começar a circular no último dia 30 de agosto A Folha Popular.

Neste mesmo dia o prédio foi novamente invadido, roubadas pela polícia máquinas de escrever, livros e tudo de valor que podia ser carregado. O edifício ficou interditado. E, ao mesmo tempo, principiou uma verdadeira caçada humana, em Aracaju e todo o Estado.

Até hoje os beleguins estão desesperadamente empenhados em prender o jornalista Fragmon Carlos Borges, antigo diretor de A Verdade. De acordo com os métodos ianques, sua cabeça foi posta a prêmio. A polícia pratica a ignomínia de prometer “cinco mil cruzeiros, a quem o capturar, morto ou vivo.

Membro do Partido Comunista Brasileiro de Pernambuco na década de 50, quatro anos depois do atentado sofrido, passou a residir no aparelho de Marcos Antônio Coelho e Teresa Coelho, período em que se casa com uma jovem companheira, sendo em seguida preso, torturado e severamente espancado na cabeça.  No final dos anos 50 Fragmon Borges passa a residir no Rio de Janeiro e rompe com o Partido Comunista para viver na clandestinidade, morrendo nos anos 70, vítima de enfarto. Segundo depoimento do jornalista e membro do Partido Aluysio Sampaio “deixara vários filhos, que nasceram de seu casamento com uma companheira de cor”. 11

Viagem a Europa  

Fragmon Carlos Borges viaja com destino a Europa – Foto: Reprodução

Em agosto de 1960, Fragmon Carlos Borges viaja com destino a Europa. Durante a viagem que se prolongará por algumas semanas, Fragmon visitou particularmente a República Democrática Alemã, onde teve oportunidade de observar os extraordinários progressos realizados nos dez últimos anos de existência da RDA, como Estado dirigido por trabalhadores. A visita é oportuna em virtude dos crescentes vínculos econômicos que ligam o Brasil e a RDA.

Segundo o General J. Almeida Freitas, Comandante da 6ª Região Militar (BA), em artigo “Comunismo de Norte a Sul” (Escola de líderes e a juventude), publicado em O Jornal (RJ) em 04 de fevereiro de 1961, afirma que Fragmon Carlos Borges – Secretário político do Comitê Estadual de Sergipe, estava realizando cursos sobre marxismo-leninismo, de duração de 15 dias a três meses, em Aracaju, num sistema de “Internato rigoroso”.

Em 26 de agosto de 1961, Fragmon é preso na redação do jornal pela polícia carioca. Motivo: ser editor executivo e repórter de esquerda do semanário Novos Rumos, localizado a Avenida Rio Branco, 207 – 17ª andar, Rio de Janeiro. Em 13 de março de 1961 seu amigo e jornalista Rui Facó, escreve a punho sua última mensagem em vida para Fragmon em Buenos Aires, Argentina.

Um ano depois, a Câmara Municipal de Santos aprovou e promulga a seguinte resolução:

                                               Resolução nº 90 de 16 de abril de 1962

Artigo Único – Fica designada Comissão Especial Constituída dos vereadores senhores Aristóteles Ferreira, Anacleto Serafim de Almeida e Júlio Moreno, a fim de oferecer relatório, na forma do artigo 96 do Regimento Interno, sobre a inserção nos Anais da Câmara, da crônica do jornalista Fragmon Carlos Borges, intitulada “João Pedro – soldado da Reforma Agrária”.

Registre-se e publique-se

Paço Municipal de Santos, em 16 de abril de 1962.

Fernando Oliva

Presidente

Paulo Ferreira Lima

1º Secretário

Registrada no livro competente

Secretaria da Câmara Municipal de Santos, em 18 de abril de 1962 – Req. 1043-62

Germano Melchert de Castro

Diretor  12

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Capa João Boa-Morte: cabra marcado para morrer – Foto: Reprodução

João Pedro – soldado da Reforma Agrária

João Pedro da Liga Camponesa de Sapé, na Paraíba, acaba de ser assassinado numa emboscada. Um tiro. Único tiro. Um fuzil nas mãos criminosas de um capanga, pago pelos latifundiários, deu cabo de João Pedro Teixeira. A cabeça e o coração da mais importante organização camponesa do país. Um lutador consciente, corajoso, da reforma agrária, da revolução brasileira.

A notícia de seu assassinato correu mundo. Jornais e rádios de todo o país deram conhecimento ao povo de mais esse crime hediondo dos grandes proprietários de terra, dos usineiros paraibanos. No Nordeste em particular na Paraíba, em Pernambuco, no Rio Grande do Norte e no Ceará, essa notícia provocou uma onda de indignação e de protestos. Por quê.

João Pedro era um velho líder camponês da região. Velho na experiência, velho na luta, pois tinha apenas 40 anos de idade. Estava à frente da Liga de Sapé desde os seus primeiros passos. Dia após dia, mês após mês, ano após ano, João Pedro enfrentou com calma, mas resolutamente as ameaças, os atentados, as violências dos latifundiários. Sua missão era defender os direitos dos camponeses educa-los, organizá-los. Era empunhar e agitar a bandeira da reforma agrária e fazer com que cada camponês empunhasse e agitasse essa bandeira. João Pedro cumpriu honradamente essa grande e nobre missão. Morreu no posto de combate. Não recuou um só passo, nem mesmo diante da morte. Outros atentados ele já sofrera antes. De todos conseguira escapar ileso.

Em resposta a cada atentado, João Pedro se dedicava mais e mais ao seu trabalho. E a Liga cresci. Dois mil associados. As violências e os atentados prosseguiam. Três, quatro mil associados. Os atentados se multiplicavam. Cinco, seis mil associados. Alguns mortos começam a ficar pelo caminho. Aqui, um camponês assassinado dentro de sua própria casa, sob o olhar pânico de sua mulher e filhos. Ali, outro camponês barbaramente trucidado.

Eram semelhantes sadios. Germinavam e davam frutos. Para cada camponês que tombava na luta contra a miséria, milhares de novos sócios eram arregimentados pela Liga. Hoje, a Liga de Sapé conta com 10 mil associados. Todos pagam mensalidades. Todos têm a sua carteirinha. É impressionante o fato de o crescimento da Liga de Sapé estar estreitamente vinculado ao acirramento da luta das massas camponesas, aos choques violentos com os capangas dos latifundiários. Isso se deve não só à combatividade mesma dos camponeses seus filiados ou não, mas, principalmente, à firmeza e decisão com que os seus dirigentes, à frente João Pedro, enfrentaram esses atentados. Deram e dão o bom exemplo. As massas aumentavam a sua confiança nos mesmos e deles se aproximavam. João Pedro não só esteve a frente dessas lutas. Ajudou com o seu trabalho e a sua experiência a organização de numerosas outras Ligas das redondezas. Mamanguape, Santa Rita, Guarabira, Areias, etc. Por todos esses lugares andou João Pedro em seu trabalho incansável de servidor do povo sofredor.

Por isso, a notícia de sua morte, não sendo recebido com surpresa, o foi como um impacto nas consciências de milhares de trabalhadores rurais, de operários e estudantes, que o conheciam tão de perto de tantos anos. E o admiravam. E seguiam o seu exemplo. Por isso o seu enterro não foi uma procissão de angustiados. Foi uma demonstração de força do movimento camponês. Uma manifestação de protesto. Uma afirmação pública de que crimes como esse não ficarão mais impunes. Cerca de seis mil camponeses acompanharam João Pedro ao Cemitério. Milhares de camponeses não trabalharam naquele dia – 3 de abril. A cidade parou. Deputados estavam presentes. Líderes estudantis e operários de várias cidades da Paraíba deslocaram-se para Sapé. Até representante do governador compareceu à ultima viagem de João Pedro. Dizem os jornais que o governador vai doar uma casa à família de João Pedro: uma mulher e onze filhos menores. E um pedaço de terra, pois, João Pedro trabalhava em terra dos latifundiários. Um piedoso gesto cristão. Mas, prender os assassinos, desarmar e prender os mandantes do crime, quem o fará?

Outros assassinatos como esse já ocorreram este ano. Em Sapé mesmo. Numerosos camponeses encontram-se presos em vários municípios. Mas os verdadeiros criminosos continuam soltos. Ou será que as autoridades não sabem quem são os criminosos? Será que as autoridades não conhecem os donos de Sapé? De Santa Rita? De Mamanguape? Não sabem quais são os donos das Usinas Santa Helena, Santa Rita, Santana e São João? Não conhecem os donos das fazendas Uma, Boa Vista, Cidiroba, Açude do Mato, Miriri, Pacatuba, Santo Antônio, Gamela e outras tantas? Não chegam a 10 famílias. Suas Casas Grandes são verdadeiros arsenais. Seus feudos possuem polícia própria. O que acontece é que essas famílias as mais tradicionais e conhecidas em toda a Paraíba, não são donas apenas das usinas e das terras de vários municípios vizinhos a Sapé. São donos dos destacamentos de polícias dessas cidades. São donas dos Prefeitos. São donas dos juízes. Diga-se, a bem da verdade, que há alguns prefeitos e juízes que não estão a serviços desses senhores feudais. Mas são poucos.

Seguros de sua criminosa impunidade esses senhores feudais fazem e desfazem toda a região. Quando seus capangas não são suficientes para expulsar camponeses das terras, mobilizam os destacamentos policiais. Quando os despejos não bastam, passam às prisões, aos espancamentos, às emboscadas. Os casos são numerosos. Lembremos alguns. O velho Pedro Quirino, membro da Liga de Sapé, e morador nas terras do latifúndio João Meireles. Foi preso e terrivelmente espancado pelo simples fato de pertencer à Liga. Usava uma longa barba. Por isso era conhecido por Fidel Castro. A polícia cortou-a à peixeira. Saiu logo da prisão e poucos dias depois, morreu, vomitando sangue em consequência dos espancamentos recebidos. Esse crime ficou impune. João Figueiredo da Silva, morador na Fazenda Açude do Mato, da família Ribeiro Coutinho, porque ficou tuberculoso e não podia trabalhar, teve a sua roça destruída pelos capangas do latifundiário e recebeu ordem de abandonar à fazenda. João Avelino da Liga de Mamanguape, foi assassinado o mês passado. E por último Pedro Fazendeiro, secretário da Liga de Sapé, recebeu dois tiros de emboscada em plena cidade de Sapé, próximo ao Comissariado de Polícia e à Prefeitura. Está hospitalizado.

A causa de tudo isto são o monopólio da terra e a terrível exploração que os senhores feudais impõem aos camponeses e trabalhadores rurais. Vejamos como essa exploração se realiza nas terras da família Ribeiro Coutinho. Por uma quadra de 50 metros o camponês paga 2 a 3 mil cruzeiros. Quando a terra é própria para abacaxi, o arrendamento nunca é menos de 10 mil cruzeiros. Mas essas terras não são arrendadas a qualquer um. Os moradores não podem ter criação nas terras arrendadas. É proibido pelo latifundiário. Mas a proibição é suspensa se o camponês se dispuser a pagar mais 800 cruzeiros pelo direito de possuir um cavalo, 1200 cruzeiros; por um boi. Aqueles camponeses remediados tinham a sua própria casa de farinha. Pois bem. Os latifundiários destruíram todas as casas de farinhas dos camponeses, e construíram uma casa central, onde os camponeses são obrigados a fazer suas farinhas. Por cada cuia (dez litros), dois ficam com o latifundiário. E toda mão de obra utilizada na fabricação da farinha é do próprio camponês! O algodão produzido é de um modo geral, vendido aos próprios latifundiários, que pagam sempre 100 e 150 cruzeiros a menos que o preço da praça. Os pesos, no dizer de Pedro Fazendeiro, têm gravata no pescoço como bacharel. Cada 100 quilos pesam 110 e 120. E o dia de cambão? Em diversas fazendas da família Ribeiro Coutinho, os moradores recebem um pedaço de terra – geralmente meio hectare – com a condição de trabalharem um dia por semana de graça nas terras do latifundiário.

Tomando consciência das cousas de sua miséria, era natural que os camponeses começassem a lutar contra elas. Organizados. Pacificamente. Mas o caráter pacífico da luta não depende dos camponeses. Os latifundiários impõem o terror, a violência e o crime. Para o que contam com o apoio ou a violência e o crime. Para o que contam com o apoio ou a convivência e o crime. Para o que contam com o apoio ou a convivência dos destacamentos policiais do interior. E até de tropas do Exército que, em plena segunda metade do século XX, fazem o papel do capitão do mato, recuado e repudiado no tempo da escravidão. Ainda o ano passado, tropas do Exército cercaram a cidade de Sapé. Uma verdadeira operação de guerra. E dezenas e dezenas de casas de camponeses e operários foram invadidas. Procuravam armas. Mas só encontraram enxadas e foice. Martelos e pás. Instrumentos de trabalho. As armas estavam e estão nas Casas Grandes. Por lá ninguém aparece… Agora mesmo, a cidade de Sapé está ocupada por tropas do Exército. Para quê? Para garantir as vidas dos camponeses contra a sanha criminosa dos latifundiários? Não. Para garantir os latifundiários contra o justo ódio dos que são por ele explorados, espancados e trucidados.

Mas a luta continua e continuará. As violências e os crimes dos latifundiários e seus servidores não serão capazes de impedir que prossiga, cresça e se estenda por todo o país em movimento que começa a ganhar a consciência de milhões. A meia a terra e o canhão serão abolidos. O monopólio da terra será liquidado. E a reforma agrária radical virá, cedo ou tarde, como uma imposição das grandes massas organizadas. Nessa luta, muitos camponeses já ficaram pelo caminho vítimas de emboscadas traiçoeiras financiadas pelos latifundiários. Outros ainda cairão. Mas não tenhamos dúvida: não ficarão impunes esses crimes hediondos dos latifundiários.

Folha da Semana

Mesmo na ditadura, sob o Ato Institucional nº 2 e regime de censura, os comunistas brasileiros, lançaram no final de 1965, por iniciativa de Fragmon Carlos Borges, Joaquim Câmara Ferreira, Orlando Bonfim Júnior e Valério Konder, a Folha da Semana, que permaneceu por mais de um ano, fechado por uma portaria do Ministro da Justiça, Carlos Medeiros Silva, no dia 13 de dezembro de 1966, exatos dois anos antes do Ato Institucional nº 5. Em 27 de julho, o jornal Folha da Semana, no Rio de Janeiro é invadido por agentes do Centro de Informações da Marinha –  CENIMAR.

Publicado pelo Jornal Correio da Manhã, a fotografia acompanhava os dizeres:

VISITA – Agentes do CENIMAR visitaram e reviraram a redação. Um choque do CENIMAR, formado por dois oficiais e 5 fuzileiros navais, além de cerca de 10 agentes à paisana, invadiu na manhã de ontem a redação do semanário Folha da Semana, prendendo o contínuo Ubirajara Munis da Silva e confiscando os livros de contabilidade, várias pastas do arquivo fotográfico e o fichário de assinantes do jornal. Após ser alva de um inquérito policial militar IPM, sob responsabilidade da Marinha, a circulação do jornal foi proibida por ordem do ministro da Justiça, Carlos Medeiros Silva.

Arquivo Nacional. Correio da Manhã

BR.RJANRIO PH O.FOT.04840

A Portaria

Considerando que o jornal “Folha da Semana”, segundo evidenciado por informe aprovado na Conferência Municipal Extraordinária do Partido Comunista do Brasil, realizada em Santo André, Estado de São Paulo, tornou-se órgão de divulgação dessa associação política e clandestina; considerando que todo o seu corpo redatorial é constituído de elementos comunistas e homens de esquerda; considerando que mesmo na imprensa estrangeira tem sido reconhecida essa vinculação ideológica da “Folha da Semana” como se vê de “Les Informations Poliques e Sociales” da França; considerando, assim que o aludido jornal é um dos elementos de que se utiliza o Partido Comunista, de existência proibida no País, para conservar-se em atividade e estabelecer contato entre os seus integrantes; considerando mais o que consta do expediente protocolado sob o número 41784, de 1966, RESSOLVE:  1º) Declarar proibida em todo o território nacional a publicação, distribuição e a venda do jornal “Folha da Semana”, editada no Estado da Guanabara; 2º)  Determinar ao Departamento Federal de Segurança Pública, nos termos da Lei e dentro de sua competência, sejam adotadas as medidas necessárias à proibição da publicação e à apreensão dos exemplares do referido jornal, procedendo-se, ademais, na  forma do Artigo 54 da Lei número 2.083, de 12 de novembro de 1953. 13

O Protesto

Em toda a Legislação revolucionária, quer dizer em qualquer dos Atos Institucionais promulgados pelo Executivo Federal nada encontramos, por outro lado que pudesse ser invocado para justificar a deliberação de v. excia. A ausência nesses diplomas de qualquer dispositivo que permitisse a v. s. excia. tomar a violenta sanção que atingiu a “Folha da Semana” vale por uma confirmação de que o próprio chefe do governo considera em plena vigência a Lei de Imprensa. E como sua excelência o presidente da República é o primeiro a proclamar insistentemente o seu respeito pelas leis vigentes, não vemos como possa v. excelência ter ignorado a existência das mesmas ao julgar em seu critério que a “Folha da Semana” merecia ser punida. 14

A Folha da Semana, um jornal independente e combativo, que nunca se recusou a enfrentar os poderosos, desde que estivessem em jogo as causas populares. Além do seu aspecto de jornal de combate, era dirigido pelo jovem Anderson Campos, uma publicação que dava grande importância a fatos culturais. Em sua redação reuniam intelectuais como Leandro Konder, Alex Viany, Aldemar Conrado, Otto Maria Carpeaux, Ferreira Gullar, Sergio Cabral, Fragmon Carlos Borges e outros. Era um jornal para as pessoas que desejavam ser informadas com independência. Até o fechamento pelo Centro de Investigações da Marinha – CENIMAR, saíram 46 números da “Folha da Semana”.

Novas Prisões  

Capa Brasil A Questão Agrária – Foto: Reprodução

Preso por várias vezes, Fragmon foi condenado há três anos juntamente com outros companheiros: Hércules Correia dos Reis, Walter Valadares de Castro, Amado Valentim do Nascimento, Antônio Guedes da Silva, Walter de Sousa Ribeiro, David Capistrano da Costa, Ronaldo Frate, Armando Zilar e Antônio Martini, todos inclusos nos arts. 7 e 9 da LSN. Fragmon teve suspenso os direitos políticos, publicados no Diário Oficial de 27 de fevereiro de 1967, p. 2359.

Por ocasião da prisão do tipógrafo Raimundo Alves de Souza (Batista, Petrônio ou Tanaka), conforme informação nº 220 de 31 de janeiro de 1975, ficha individual, DOI/CODI/São Paulo, consta no item nº5 o seguinte depoimento:

Fragmon Carlos Borges, que era jornalista lhe propusera trabalhos extra remunerados, o que foi aceito, sendo a primeira tiragem “Manifesto Político” panfletos em 4 vias acerca de reunião realizada pelo CC do PCB. Para tanto, o declarante foi conduzido de olhos vendados pelo citado jornalista, até a gráfica clandestina, sita na Estrada do Morro do Cavado, Caminho Anésia, Campo Grande – GB. Novos trabalhos sucederam-se até o fechamento do Diário Carioca em Dez/65. Fragmon “abriu” para Raimundo que era encarregado da feitura do jornal Voz Operária, em seguida convidou-o para tomar conta da referida gráfica e como aceitou a tarefa desta vez foi levado ao local já sem as vendas nos olhos. Ali chegando conheceu Benedito de Tal (Bené) caseiro da indústria e Antônio de Tal, cunhado desse último.

O epigrafado, Antônio e Benedito de Tal montaram-na num subterrâneo para dar maior cobertura no trabalho. Com a morte do jornalista em pauta foi substituído nas funções de coordenador da Voz Operária, por Gutenberg Cavalcanti, que com o seu bom desempenho foi mantido pelo PC até a presente data.

Através da Portaria nº 1.359, de 23 de agosto de 2006, publicada no Diário Oficial da União, nº163, p.64, edição de 24 de agosto de 2006, o Ministro de Estado da Justiça, no  uso de suas atribuições legais, com fulcro no artigo 10 da Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002, publicada no Diário Oficial de 14 de novembro de 2002 e considerando o resultado do julgamento proferido pela Comissão de Anistia, na 3ª Sessão realizada no dia 16 de janeiro de 2006, no Requerimento de Anistia nº 2001.02.00942, resolve:

Declarar Fragmon Carlos Borges anistiado “post mortem”, sendo que a reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação mensal, permanente e continuada correspondente ao cargo de Redator 8, em Jornal de médio porte no Estado do Rio de Janeiro, caberá à requerente Doralice Maria de Santana Borges e demais dependentes, se houver, no valor de R$ 6.136,88 (seis mil, cento e trinta e seis reais, oitenta e oito centavos), com efeitos retroativos a partir de 12.09.1992 até a data do julgamento em 16.01.2006, perfazendo um total retroativo de R$1.064.543,85 (hum milhão, sessenta e quatro mil, quinhentos e quarenta e três reais e oitenta e cinco centavos), nos termos do artigo 1º. Incisos I e II da Lei nº 10.559, de 2002”. (Márcio Thomaz Bastos)

Fragmon Carlos Borges publicou o ensaio Origens Histórica da Propriedade da Terra – 1958, na revista Estudos Sociais, maio-junho, 1958, republicado em A Questão Agrária – textos dos anos sessenta, Carlos Marighella, Orlando Valverde, Paulo Schilling, Mário Alves, Rui Facó, Fragmon Carlos Borges. São Paulo, Edit. Brasil Debates, Coleção Brasil Estudos, 1980.  Neste ensaio, primeiro da coletânea, Fragmon Carlos Borges, em polêmica com Roberto Simonsen (1889-1948), industrial, historiador e político brasileiro, analisa o estatuto das capitanias hereditárias e das concessões das sesmarias, apontando seu caráter feudal no fato de que, por meio das “cartas forais, os donatários eram investidos de poderes quase absolutos.

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Alguns artigos publicados

O Petróleo e a União Nacional. Aracaju, Época nº2, outubro/novembro, 1948; A solução Dutra. Aracaju, Época nº3, janeiro, 1949; A Mensagem do Sr. José Rollemberg Leite. A Verdade. Aracaju, Ano II, nº33, 3 de maio, 1950; conquistar a Liberdade de Imprensa. A Verdade. Aracaju, Ano II, nº34, 10 de junho, 1950; Anísio Dário. Bandeira de luta do povo Sergipano. A Verdade. Aracaju. Ano II, nº55, 15 de dezembro, 1950; Como Comemorar o 53º aniversário do Cavaleiro da Esperança. A Verdade. Aracaju, Ano II, nº66, 23 de dezembro, 1950; O Povo defenderá o seu jornal. A Verdade. Aracaju. Ano III, nº71, 9 de junho, 1951; Comerciar com todos os países socialistas imperativo do momento que vivemos. Rio, Voz Operário nº448, 4 de janeiro, 1958; Reatamento de Relações com a União Soviética fonte de divergências no seio do Governo. Rio, Voz Operária, 11 de janeiro, 1958; O problema da terra em Pernambuco. Novos Rumos, 1º de maio/junho, 1958; A grande propriedade territorial latifundiária. Novos Rumos, 2, julho/agosto, 1958; O problema da terra em Pernambuco – a terra dos índios. Novos Rumos, 3-4, setembro/dezembro, 1958; um livro sobre a história e a economia de Pernambuco. Novos Rumos, 6, maio/setembro, 1959; Todos eles procuram a Liberdade, mas apenas uma parte a encontra. Novos Rumos, 21 a 27, outubro, 1960; Defender as liberdades. Rio, Novos Rumos, 9 a 13 de fevereiro, nº157, 1962; Olga Benário Prestes – Personagem de Romance. Rio, Novos Rumos, 9 a 13 de fevereiro nº157, 1962; O Movimento camponês no Nordeste. Novos Rumos, 15, dezembro, 1962.

NOTAS

[1]. A Universidade Estadual de Feira de Santana (BA), criou a Sala Carloman Carlos Borges no dia 25 de maio de 2010. Neste ambiente encontra-se muito material sobre a vida do Professor Carloman, desde objetos pessoais, diplomas, prêmios, além de um rico acervo bibliográfico.

2. A peça publicitária da representação dos interesses da Companhia na capital sergipana apareceu no Sergipe-Jornal, em 28 de abril, 1947.

3. Fragmon Carlos Borges já havia estado no Rio de Janeiro, em novembro de 1946 participando de atividades políticas. Coincidentemente retornou a Aracaju no mesmo voo em que viajou Eronides Ferreira Carvalho.

4. Walter Prado Franco (1908-1957), político sergipano, era filho de Augusto Franco (deputado, senador e governador de Sergipe).

5. Antônio Manoel de Carvalho Neto (1889-1954), nasceu em Anápolis (SE) em 14 de fevereiro e faleceu em Aracaju no dia 27 de abril. Político e bacharel em ciências jurídicas e sociais, em 1911, publicou: Advogados; Legislação do Trabalho, polêmicas e doutrinas; Afirmações do Direito; A defesa do crime; Vidas Perdidas e outros.

6. João de Araújo Monteiro, Integralista, Presidente da Associação Sergipana de Imprensa (1941-1943), Professor (interino) da Escola de Comércio Conselheiro Orlando; Diretor Geral do Departamento da Fazenda (1946), Secretário de Segurança Pública no governo de José Rollemberg Leite (1947-1951), fundador da Faculdade de Direito de Sergipe (1950), advogado trabalhista.

7. Manuel Ribeiro, natural da Bahia, professor de História e Direito, eleito Deputado Estadual, era pai do escritor baiano João Ubaldo Ribeiro (1941-2014).

8. Correio de Aracaju. Aracaju, 6 de maio, 1949.

9. Diário do Congresso Nacional. Rio de Janeiro, Ano IV – nº 136, 22 de julho de 1949.

10. Orlando Vieira Dantas (1900-1982), filho de Manoel Correia Dantas (Governador de Sergipe de 1928 a 1930), Orlando Dantas descendia de tradicional família sergipana, ligada à cana-de-açúcar. Publicou: Vida Patriarcal de Sergipe. Rio, Ed. Paz & Terra, 1982.

11. Aluysio Mendonça Sampaio. Chão Perdido, São Paulo, Edições LB, S/D.

12. A Tribuna de Santos. 19 de abril de 1962. O referido artigo, foi publicado no jornal Novos Rumos, edição de 13 a 19 de abril, nº 165, de 1962,

13. Luta Democrática. Rio de Janeiro, Ano XIII, nº 3940, 14 de dezembro de 1966.

14. Diário de Notícias. Rio de Janeiro, 16 de dezembro de 1966.