GILFRANCISCO [*]

José Antônio Nunes Mendonça, nascido em Itabaiana, em 15 de dezembro de 1923, filho de Salatiel Pereira Mendonça (comerciante) e Alzira Nunes Mendonça (professora primária da Rede Estadual) e faleceu em 15 de junho de 1983 em Vila Velha, município localizado no litoral do Estado do Espírito Santo (Região Metropolitana), vítima de parada cardíaca. Nunes aprendeu as primeiras letras com sua mãe. Em virtude da transferência da mãe para a cidade de Aracaju, a família passou a residir na capital sergipana. Nosso homenageado estudou até o terceiro ano primário no Grupo Escolar General Siqueira de Menezes e no Colégio Tobias Barreto, o quarto ano primário, e no Colégio Salesiano Nossa Senhora Auxiliadora estudou a 1ª e 2ª séries do curso ginasial e, a 3ª no Colégio Estadual de Sergipe. Segundo seu único irmão Fernando Mendonça, José Nunes tinha dificuldades no aprendizado da Matemática e isso contribuiu para que o mesmo encerrasse os estudos formais. Contudo, os ensinamentos adquiridos no curso ginasial, despertaram-no ou reorientaram-no para o interesse pela leitura e escrita.

José Nunes Mendonça foi um professor, pesquisador da educação pública sergipana, escritor, jornalista e político sergipano que teve participação nos movimentos estudantis, intelectuais e políticos de Aracaju. Ingressando no PTB – Partido Trabalhista Brasileiro foi eleito Deputado Estadual (1951–1955) e presidente do partido em Sergipe. Professor do Instituto de Educação Rui Barbosa, enfrentou forte campanha difamatória e processo sumário de investigação pela CGI, instalada após o Golpe Civil e Militar de 1964, que o aposentou.

José Nunes Mendonça – Foto: Reprodução

Este intelectual itabaianense, desde o seu tempo de estudante, dirigindo jornais culturais, assumiu, com verdadeiro espírito de combatividade, decidida posição nacionalista. Na célebre “questão do ferro”, lutou corajosamente contra o contrato vergonhoso da Itabira Iron, pela siderurgia nacional. Na luta pelo petróleo que levou Monteiro Lobato a exilar-se teve a mesma atitude corajosa e patriótica, de guardião das massas.

José Nunes Mendonça deixou grande obra de reflexão sobre a educação em Sergipe e de crítica literária, destacando-se Pelo Desenvolvimento de Sergipe (Aracaju: Centro de Estudos Pedagógicos/Livraria Regina, 1961), José Sampaio O Homem e a Mensagem (Aracaju: Livraria Regina, 1962), Velhos Companheiros & Outros Escritos (Aracaju: sem indicação de editor, 1963), A Educação Sexual nas Escolas Libelo Contra a Ignorância e a Maldade (Aracaju: Edição do Autor, 1965, incluindo Pareceres de Garcia Moreno e Imídeo G. Nérice). Em 1993, dez anos depois de sua morte, seu irmão, o advogado Fernando Mendonça publicou o livro Vítima da Ditadura e Mártir da Educação, A Defesa do Professor Nunes Mendonça (Rio de Janeiro: Editora Lumem Júris, 1993), historiando todo o processo de linchamento moral do mestre sergipano.

Foto: Reprodução Capa do livro Velhos Companheiros & Outros Escritos, de José Nunes Mendonça

A Imprensa Estudantil

José Antônio Nunes Mendonça abandonou os estudos secundários para consagra-se no jornalismo local, como crítico literário, polemista, articulista. Juntamente com outros estudantes do Colégio Atheneu e Salesiano (Joel Silveira, Lyses Campos, Paulo de Carvalho Neto, Enoch Santiago Filho, Aluysio Sampaio e Walter Sampaio) passaram a editar e colaborar em vários jornais estudantis. Vejamos alguns desses periódicos: (1938). Voz do Estudante (Órgão Literário Noticioso), Ano I, nº 2, 23 de outubro. Colabora com os artigos Opiniões sociológicas; Crônica. Vejamos um pequeno trecho:

Quando no número anterior apresentei algumas opiniões sobre a sociologia, não faltaram escárnios e zombarias tiveram como é lógico, conhecimento de que em volta de mim zuniam “as moscas da praça pública” de que falava Zoroastro. Não olhei os sarcasmos pela faceta de sua concepção mordaz, e sim pelo prisma favorável, como sendo orquestrações de encômios. Dizia aluem que “ser compreendido é a grande prova de superioridade”. Quando o escritor é igualmente aplaudido, sua mentalidade tem algo de vulgar e já não é um laurel de orgulho, símbolo de sua imorredoura glória, porém uma coroa efêmera que o esquecimento corrói.

A sociologia é a grande ciência que abrange uma infinidade de fatos e se prende a uma complexidade formidável. Entre os sociólogos existem divergências fantásticas entre opiniões que se contradizem e todas dentro da sociologia. Citei um exemplo que dispensa comentários: Durkheim, Asturaro e a maior parte dos sociólogos afirmam ser a moral um fenômeno da sociologia, entretanto Tristão de Athayde e vários classificam a sociologia como subordinada à moral e à lógica, e ainda outros escritores dizem que “a metafísica é a condição essencial da sociologia”!

É lógico, portanto, que ao lançar aquelas despretensiosas opiniões (aliás, feitas de afogadilho) afluíssem críticas pro e contra. Não atenderei a uma nem a outra; seguirei meu raciocínio por considerá-lo acima dos demais. Isto, porém não quer dizer que estudo os fatos sociais, subjetivamente, pois procuro seguir o método objetivo, usando de prolongadas observações.

Neste número ao invés do que prometi, irei esboçar dentro da sociologia, o “por que” escrevo em defesa do espiritualismo e admito a religião, que, como fato puramente social mitiga o sofrimento da humanidade e levam-na a crê em um ídolo, que como fanal e lanço vai guiando e enxugando-lhes as lágrimas, o grande ídolo que segundo Le Bon é o resumo de todas as divindades, – a esperança.

(1938). Voz do Estudante (Órgão Literário Noticioso), Ano I, nº 1, 5 de outubro. Colabora com os artigos: Evolução do Progresso; Carta aberta – Idolatrada; Opiniões Sociológicas.

(1938). Voz do Estudante (Órgão Literário Noticioso), Ano I, nº 3, 10 de novembro. Colaborara com os artigos: Sergipe e o Estado Novo; Aristocracia intelectual – assunto sociológico.

(1939). Símbolo (Direção de um grupo de ginasianos – Representação jornalística de José Nunes Mendonça), Ano I, nº 1. Colabora com o artigo: Fragmentos…

(1939) Símbolo (Órgão Cultural), Ano I, nº 2. Julho. Colabora com o artigo: Volta Eterna.

(1939). Símbolo (Órgão Cultural), Ano I, nº3. 25 de agosto. Colabora com os artigos: De Nietzsche (tradução); A morte de Nietzsche: Vejamos trecho do artigo que escreveu o aluno do segundo ano do curso ginasial:

Mal o século XX iniciara no tempo que edificou as montanhas com grãos de areia e elevou até a dignidade humana a obscura célula dos tempos geológicos, mal ia começando a avançar este século chamado século XX em relação a Cristo, mas que se tinha esperança de nele ruírem os preconceitos do cristianismo, um louco agonizava na esperança de que um dia a terra fosse do super-homem. Esse louco que pregou o super-homem e fez contra a Igreja cristã, como ele mesmo disse, “a mais terrível das acusações que jamais acusador algum pronunciou”, foi Nietzsche, – a maior personalidade do século passado o quiçá de todos os tempos.

Nietzsche, cuja paixão era a pesquisa da verdade; Nietzsche, que deveria se chamar, no dizer de Zweig, “um Filaleto, um fervente apaixonado da Aleteia, da verdade, e no de Lichtenberger o “intelectual e sensitivo, voluntário e apaixonado, pensador, sábio, músico, poeta”, foi o maior facho que se já acendeu no domínio da ética.

Ele sofreu como jamais gênio nenhum sofrera. Daí Will Durant dizer que “raramente um homem pagou preço pelo gênio”. Amou a vida diferente de Epicuro: em lugar da ataráxia, ou fleuma como dizia Filinto, que sufoca a alegria pagã de viver, amou o perigo, a vontade de poder, e a “virtude civilizadora da guerra”, à qual exaltava como um Homero do século XIX. Amou a arte; e tudo nele era arte, era espírito dionisíaco. Desafiou os deuses e flagelou a populaça. Ao contrário dos filósofos que consagravam o melhor de suas forças à destruição do dogmatismo religioso, ele, convicto de que “Deus morreu” e a vida ultra tumular é uma mentira, esmagou a moralidade convencional, os valores sobre os quais Schopenhauer fundou seu pessimismo, afim de nos conduzir para além do bem e do mal, mais além da moral. Investiu contra a piedade, essa fraqueza considerada por Schopenhauer como “princípio de toda moralidade”, porém tão oposta aos nobres ideais, tão contrária à vontade de viver; essa fraqueza que vai de encontro à evolução que é seleção, essa fraqueza desprezada pelos “espíritos dissemelhantes” de Platão, Spinoza, La Rochefoucauld e Kant. Viu no ateísmo, “uma espécie de segunda inocência” que há de libertar o homem das garras da “consciência devoradora”, da “má consciência”, pois o remorso era, para ele, como fora para Spinoza, um não-valor. Santificou o riso e a alegria. Criou a dança em espírito, na expressão de Isadora Duncan.

(1956 Escola Normal (Órgão Escolar das alunas do Instituto de Educação Rui Barbosa), Ano I, nº 1 de 9 de abril. Colabora com o artigo: A Missão da Professora.

O jovem e ilustre diretor da Casa, professor José Bezerra, pediu-nos uma colaboração para o primeiro número do jornal que deseja fundar e manter no Instituto de Educação. Com o nosso caloroso aplauso a essa grande e oportuna iniciativa, de tanta significação educacional, aqui está um pequenino trabalho de reflexão pedagógica, escrito especialmente para o jornal das prezadas anormalidades e a estas dedicado.

A mulher é educadora nata. Na educação da primeira infâmia processada no lar, predomina a influência moderna, prepondera a atuação da mulher. Já se disse que o primeiro banco da escola são os joelhos da mãe.

Na escola como no lar, a ação educativa da mulher é a mais eficaz. Ela penetra, muita mais do que o homem, na alma infantil, nos sentimentos da criança, na sua vida afetiva. Conserva melhor, vida a fora, aquela espécie de caráter infantil que, segundo Kerschensteiner, franqueia sempre o caminho do educador.

Acertada, por isso, fora a ideia de Horáce Mann, de confiar, à mulher, o ensino primário.

Hoje, mais do que nunca, a grande missão da mulher, a missão que mais a engrandece porque no respectivo desempenho, se faz mais útil à sociedade, é a de educar.

Os objetivos da escola elementar não se restringem, nos nossos dias, aos três R (the three R’e: reading, writing, arithmetie), as três técnicas fundamentais – leitura, escrita e cálculo – que constituíam o escopo da escola intelectualista. A escola primária tem de cuidar, presentemente dos 4 H (head, heart, health, hand), como diriam os norte-americanos.

Com o enfraquecimento da ação educativa do lar, consequência da divisão do trabalho e da formação dos grupos sociais autônomos e, ultimamente, das profundas alterações de vida trazidas pela industrialização, a sociedade exige que a escola se transforme num órgão educativo por excelência, capaz de suprir as eficiências do meio familiar e de reforçar a ação da comunidade na socialização da criança, em cooperação decisiva e harmônica com a família e os outros fatores socializadores.

Ora os novos objetivos que se incorporaram, em posição de vanguarda, às finalidades da escola elementar, devem ser atingidos que processos pedagógicos que consultam os interesses espontâneos de educando e levem em conta as necessidades do psiquismo infantil, no lidar com a vida afetiva da criança. Reclama, por isso, do educador, compreensão, delicadeza, paciência, tato, simpatia, dedicação, desprendimento, capacidade de sacrifício e entusiasmo, atributos mais encontradiços na alma feminina. Daí porque, na hora presente, a maior missão que a sociedade pode confiar à mulher, a missão mais delicada e mais nobre, mais dignificante e mais útil, é a do magistério primário.

O exercício do magistério, porém, como o de outras ocupações humanas, requer, antes de tudo, vocação. Que vem a ser vocação? Nada mais do que os interesses afetivos e as capacidades naturais que inclinam o indivíduo à prática de uma profissão.

Se a jovem se sente atraída para o magistério, profissão que, de certo, não lhe trará grandes compensações econômicas senão uma “digna autonomia do trabalho”, como diria

Afrânio Peixoto; se possui, além disto, aptidões para o nobre mister: trabalho de feição, ao mesmo tempo, científica, social, econômica e artística, submeta-se ao indispensável preparo profissional, com a convicção de que se estará encaminhando para um verdadeiro apostolado. Um sacerdócio que exige, como bem o disse Claparède, além de qualidades de coração e de espírito, a virtude capital do entusiasmo.

Uma coisa podemos afirmar às queridas normalistas: a profissão pode ser árdua, mal compreendida e mal remunerada, mas confere um razoável status social e proporciona grandes compensações de ordem interior. Não só do pão vive a criatura humana.

Adolescente pródigo

Na edição de 5 de novembro de 1939 do Diário de Notícias – Rio de Janeiro, na coluna Letra – Artes – Ideias, o jornalista e político pernambucano, Osório Borba (1900-1960), autor de vários livros; Dom Bio Zero (1923), Medalhões e Medalhinhas (1925), A Emborcada (1937), através do artigo Auto-biografia registra:

O Brasil precisa tomar conhecimento dum autêntico menino prodigo que vive numa pequena capital provinciana. Jose Nunes Mendonça fala ao undo por intermédio de um dos redatores do seu jornal. Começa por uma referencia feita em linguagem familiar, carinhosamente íntima, aos outros jovens escritores da terra: Lindolfo, o Dernival, o Armindo, o Zé Menezes, o Walter, o Garangau, e o poeta…o grande poeta Zé Sampaio….

Mas o jovem Mendonça passa a falar de si. Antes, numa página anterior, já a revista nos informara que José Mendonça era “um jovem pensador, ou por outra, um garoto de quinze anos”. E que “este garoto apresenta na sua vida intelectual duas frases até hoje. A primeira foi – frase espiritualista. A segunda foi e continua a ser a que se seguiu após uma violenta metamorfose: a frase materialista. E que “em seus artigos publicados, Mendonça se mostra realmente de muita precocidade”.

Mendonça, que tem quize anos, fala-nos de sua formação espiritual:

“A criança, Raymundo, já traz o carater formado desde o seio materno, disse Isadora Duncan. Não acredito nisso. Porém, assim sendo, posso dizer que desde os primeiros momentos de vida,vivi sob a impressão de um destino doloroso: o destino daqueles que só vêem no universo a força inconsciente da matéria”.

Depos nos confidencia-nos:

“Minhas primeiras leituras, sem falar dos contos de fadas encantadas e bruxas mágicas, foram Platão e Homero. Pouco a pouco fui adquirindo uma cultura mais generalizada. Augusto Comte, Spencer, Le Bon, Marx, Voltaire. Ingenieros, Spinoza, Nietzsche, Durkheim e outros tornaram-se-me familiares”.

Nas horas vagas, divertia-se com Goethe, Dostoievski, Dante, Gorki:

“Gorki, Zola, Dostoievski, Balzac, Dante, Goethe e Omar encheram-me as horas vagas. A ilusão científica tomou conta de mim. A visão apolinea e nostado dionisíaco passaram a serparte do meu espírito. Como consequência de tudo isso veiu-me a repugnância pela mediocridade”.

Agora o jovem gênio fala das influências que sofreu:

“Vejo minha reflexão nas biografias de Isadora Duncan, Edgard Poe e Wilde”.

Apressa-se em fazer uma resalva necessária:

“Sendo que ao último sintoma ligado apenas pela única verdade positiva: a dor humana”.

Informa ainda: “Kant e David Humo influiram muito na minha formação. O primeiro fez-me um espírito anti-dogmático. O segundo tornou-me um grande ceticista. Schopenhauer tem exercido sobre im grande influência.”

Outras confidências:

“Sou geralmente um Werther quando deveria ser um D. Juan e assim sucessivamente”.

Agora Mendonça nos comunica um desejo secreto:

“Idealizo às vezes estar com Isadora Duncan. Estar com ela num lugar deserto e cheio de poesia. Eu e ela sozinhos”.

Condescende com os pecados anteriores da dançarina:

“E nesse momento esqueço todos os seus amantes passados. Mas um corvo, aquele mesmo corvo de Edgar Poe, chama-me à realidade com seu trágico e eterno “Nunca mais””.

José Nunes Mendonça vai publicar um livro. O “crítico e pensador” de quinze anos, cujo espírito já passou por duas frases, a espiritualista e a materialista, que formou-se espirito em Kant, Spencer, Voltare, Marx, Nietzsche, divertindo-se nas horas vagas com Shakespeare, Dante, Dostoievski, Goethe e Zola vai publicar um ensaio. Esse livro deve ser uma autobiografia . Ele não encontrará no mundo tema mais empolgante e sensacional do que a história maravilhosa da sua jovem inteligência deslumbrada com o espetáculo da contemplação de si mesma. E o Brasil precisa conhecer o novo sabio de 15 anos, o novo Pontes de la Mirabdola com que já conta sem o saber.

Florentino Menezes

Não temos dúvida da grande influência do professor Florentino Telles de Menezes sobre o jovem José Nunes Mendonça. Aliás influenciaria um grande número de ginasianos, alunos do Ateneu Pedro II, entre os quais Joel Silveira. Vejamos o jornalzinho estudantil Canaan, Ano I, nº 2, setembro de 1934, publica na sessão Crônica das Letras, Jaguanharo Passos que analise o livro do jovem colega ensaista Joel Silveira (1918-2007), Florentino Menezes:

Jamais tive a pretensão de me tornar um crítico literário, porém, as circunstâncias o fazem dando-me autoridade para tal.

É que me é chego à mesa de estudos, acompanhado de dois gentis oferecimentos, um opúsculo intitulado Florentino Menezes, de autoria do jovem Joel Silveira.

É mais um livro na ribalta das letras moças. Simpático; desde o título ao formato.

Li-o de uma assentada, notando de pronto a felicidade do autor na escolha do assunto. O começo do ensaio é um tanto sem atração, porém, da segunda parte em diante vai tomando uma feição mais representativa.

Vejamos o que diz o autor ao se referir as “Notas de um Revoltado”, obra inédita do laureado sociólogo sergipano: “lamento a não saída destas páginas que haviam de ecoar com ecos sinistros, como bombas nas quebradas das montanhas, como o grito da Verdade no cenário hediondo e vil da Mentira”.

Vê-se, nesta frase romântica e entusiástica, o seu estilo singelo, porém convincente.

Em outro capítulo, “Aspectos” o mais feliz e talvez a salvação do seu livro, destacam-se estas frases que são verdadeiros vôos de imaginação psicológica: “Florentino daria um bom revolucionário. Porém, não se assustem. Florentino está muito longe de fazer uma revolução, e se já fez foi abafada por ele próprio… Ele é um revoltado. Nunca um revolucionário”.

É um opúsculo apreciável, no entanto, se sabedor fosse que o autor pretendia fazê-lo vir à lume, ponderadamente aconselharia que não o fizesse, pois, o gênero ensaio requer além de um forte poder descritivo, alguns conhecimentos filosóficos, históricos, científicos e psicológicos.

Retardando-o, pois o autor poderia, quando possuísse uma regular e geral cultura, desenvolvê-lo à altura de sua brilhante inteligência.

Foi uma vitória, porém, precipitada: Uma vitória – precoce. À maneira daquelas em que os generais, depois de rendidos combates, conseguem a almejada vitória, porém sofrendo o igual número de “baixas” do adversário.

Fossem os olhos de uma Grieco ou de um Chiacchio quem lesse às páginas do ensaio Florentino Menezes, certo teria o autor uma péssima crítica, porém, eu, moço também que sou e conhecedor de seus 16 janeiros, assim não o farei. Pelo contrário.

Não chego a coroar-lhe como já o fizeram, porque, sei quão prejudicáveis soem ser os elogios demasiados e mal ponderados, porém, prenúncios. Nunca devemos elogiar demasiadamente os méritos quer intelectual quer materiais de um moço.

Será o seu desnorteio o seu desequilíbrio, a sua desconstrução.

Saindo, pois da galeria daqueles que involuntariamente praticaram esse mal, me furto de lhe dar os loiros, para, nesta crítica, talvez a mais sincera que o autor tenha tido, externar lhe sem artifícios lisonjeiros, o meu lhanozo parabéns.

O jornal A República em sua edição de 11 de agosto fez um comentário na sessão Livros e Autores, sobre a publicação do jovem estudante, Joel Silveira:

Temos sobre a nossa mesa de trabalho, e com gentil dedicatória o estudo e apreciação que o jovem Joel Silveira do Grêmio Literário Clodomir Silva, fez sobre o notável professor de Sociologia, e seu mestre Florentino Menezes.

Joel Silveira pertence à classe dos mais jovens intelectuais sergipanos, se não é o mais jovem.

Florentino Menezes é o título do seu trabalho ora publicado. Em um dos trechos do seu livro, o jovem autor, falando da bondade do mestre, diz: “Numa greve estudantina a primeira palavra é a do Mestre querido, do Mestre-pai, e mais adiante: Clodomir foi assim. O primeiro mais apresentado, mais entusiasmado, com ímpetos mais violentos. O segundo mais calmo, mais sereno, sem ímpetos. Porém o mesmo coração bondoso e grande, tão grande que está em todo o lugar em que necessitem dele, tão grande que chega para todos…

E foi por isso que Clodomir morreu moço.

E será por isso que Florentino terá uma vida de mocidade…”

Parabenizando o jovem intelectual patrício, agradecemos a oferta que nos fez do seu precioso trabalho.

O sociólogo Florentino Menezes, faleceu nesta capital em 20 de novembro de 1959, após imenso sofrimento. Tombou este gigante do pensamento sergipano, pobre, esquecido e injustiçado, como outrora o seu irmão de gênio, Tobias Barreto (1839-1889). Depois de uma longa existência, atribulada pela pobreza e martirizada por profundos sofrimentos, toda ela dedicada à ciência, pois viveu ele, como disse Frederico Heler, “a vida exemplar de um cientista”, finou-se o grande Mestre na humildade, tendo apenas a assisti-lo as suas duas irmãs sobreviventes: professora Leonor Teles de Menezes e dona Dulce Menezes Fontes, e meia dúzia de dedicados amigo, entre estes o seu desvelado companheiro de todas as horas e dileto confidente, o nosso Redator-Chefe, professor Nunes Mendonça, registra O Nordeste, em edição de 21 de novembro.

Sobre Nunes Mendonça escreveu Florentino Menezes:

Possuidor de um talento genial, de uma elevada cultura e de uma consciência iluminada e nobre. Sua visão larga de gênio, nos assuntos da Sociologia elevou-a à altura dos criadores de doutrinas que orientam o pensamento humano, onde dominam os Comte, os Sperncer, os Tarde, os Durkheim que puderam divisar alguma verdade nova e se afastaram dos limites estreitos da mentalidade social dominante.

Discurso Solidário

Segundo informação do Correio de Aracaju, nº 6.146, de 21 de dezembro de 1957, durante a solenidade de colação de grau, dos concludentes do curso Pedagógico, turma de 1957, do Instituto de Educação Rui Barbosa, realizada no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, a professoranda Carmen Dantas Siqueira, oradora oficial do evento, registra em discurso a competência e importância dos seus mestres, especificamente o professor José Nunes Mendonça. Vejamos um, trecho:

De esperança, porque antevemos a realização do nosso sonho: – preparar seres humanos, mediante educação integral, para a vida.

De gratidão é, também, este momento que vivemos. Gratidão aos prezados mestres que, no seu idealismo, nos dirigiram a aprendizagem, transmitindo-nos a fé na missão a que pretendíamos dedicar-nos, o amor à causa a que desejávamos servir.

O reconhecimento manda que proclamemos os seus nomes, como homenagem sincera e comovida.

Ao prof. Nunes Mendonça, mestre e amigo desvelado, não devemos apenas as excelentes lições de Pedagogia e de Sociologia Educacional; a renovação, no espírito e nos métodos, da Escola de Aplicação, que efetuou, como Assistente Técnico, visando a prática de ensino; a criação do curso pré-primário como a mesma finalidade e a introdução do Serviço Social Escolar no Instituto de Educação. Devemos-lhe muito mais. Ele nos mostrou, com o exemplo, que a dedicação e a bondade são virtudes capitais do mestre. Amando suas discípulas e se dedicando com entusiasmo inexcedível à causa da formação profissional do mestre, o prof. Nunes Mendonça ensinou-nos a amar os nossos futuros alunos e a fazer doação de nós mesmas à causa que abraçamos, desenvolvendo-nos a sensibilidade humana, essencial ao exercício da atividade docente. Bem o disse Francisco de Assis: “É dando de nós, que recebemos”. Injustiçado e combatido pelos medíocres e pelos ociosos, o prof. Nunes Mendonça contou e conta com a confiança e a solidariedade das suas ex-alunas – as novas mestras de Sergipe!

A Escola Rural

As escolas rurais sergipanas revelam, ao observador atento divórcio completo entre o ensino, a vida e o meio. J. N. Mendonça

Temos a informações que as Constituições Federais do Brasil de 1824 e 1891 não apontaram em seu texto a educação rural, expondo, assim o abandono dos dirigentes com o homem do campo. Alguns autores brasileiros, afirmam que a educação rural (educação do campo), surgiu, inegavelmente, a partir das lutas e do inconformismo de uma massa de trabalhadores (crianças, jovens e adultos), vinculados aos movimentos sociais camponeses, de luta pela terra e pela reforma agrária. Uma outra corrente, afirma que a educação rural no Brasil foi criada para sua manutenção da oligarquia agrária e predomínio do poder desta elite.

Outro intelectual sergipano que muito contribuiu para a implantação das Escolas Rurais, foi o professor Acrísio Cruz (1906-1969) que atuou como diretor de grupo escolar, como diretor da Instrução Pública, preocupando-se com o ensino e a formação de professor para o meio rural, contou com o apoio do Instituto Nacional de estudos Pedagógico – INEP, empreendendo um plano de construção de mais de 200 escolas rurais, proporcionando melhores condições de moradia ao professor e ao desenvolvimento do trabalho Pedagógico.

Vejamos um trecho do artigo de José Nunes Mendonça A Escola Rural em Sergipe, publicado no matutino O Nordeste (SE), nº1086, de 28 de agosto de 1958:

As escolinhas rurais, instaladas em prédios padronizados, construídas com a contribuição federal e espalhadas em todos os recantos do Estado, principalmente à margem das estradas, dão, à primeira vista, a impressão de que, embora modestamente, o homem do campo está recebendo os benefícios da educação popular que lhe convém.

Desempenhando, porém função puramente alfabetizante, e divorciadas das necessidades específicas do meio, as escolas rurais, em Sergipe, que têm essa denominação apenas por causa de sua localização em áreas rurais, não possuem nenhuma das características de centros educativos. São simples postos de alfabetização, onde, a começar do professor, sem formação sociológica adequada e sem a consciência de sua responsabilidade social, do compêndio didático e da maneira de tratar as matérias do currículo, tudo revela a completa desarticulação com as realidades ambientais, com a experiência e a psicologia do ridícula, e com as ocupações humanas peculiares ao campo.

Na zona rural – “base física real da nossa nacionalidade” com a definiu o talento de Euclides da Cunha – os efeitos dessa escola, simplesmente literária e não acomodadas às necessidades locais, são negativos.

Em 1956, alguns professores sergipanos como Lygia de Carvalho Travassos, Leda Diniz Mendonça e o próprio José Nunes, foram contemplados com bolsas de estudos para realização de curso de especialização e aperfeiçoamento no Centro Regional de Pesquisas Educacionais – CRPE, no rio Grande do Sul. Um ano depois Nunes Mendonça participa no Rio de Janeiro, juntamente com alguns professores sergipanos do Curso de Artes Aplicadas.

No final do mês de junho de 1959, Nunes Mendonça viaja à capital federal com o objetivo de rever sua mãe, que lá se encontrava há alguns meses, em companhia de seu único irmão Fernando Mendonça, à época funcionário do Bando do Brasil e acadêmico de Direito.

Publicações

A Educação em Sergipe (1958). Sobre esse livro, o desembargador cearense João Dantas Martins dos Reis (1884-1979) em carta ao professor José Nunes Mendonça, publicada no Correio de Aracaju, 31 de dezembro de 1958, diz o seguinte:

Meu caro Nunes Mendonça

Estou com o volume do livro que você acaba de publicar – A Educação em Sergipe, – e com o qual a sua nímia gentileza quis premiar-me. Por uma leitura rápida, vi, de logo, que o seu trabalho, produto da sua marcante inteligência, é de leitura proveitosa, e que ainda vou repetir com maior interesse.

O primeiro capítulo é utilíssimo a todo sergipano que deseja conhecer a situação de Sergipe, no atual momento. Todos os outros pertinem com o problema que diz com a educação, assunto mais para os que se dedicam a esses estudos, mas que a todos interessam.

Pode ficar certo que novamente o lerei, mais cuidadosamente, admirando sempre sua capacidade intelectual, em a qual revela muita leitura, observação e preparo nos assuntos sobre os quais disserta.

Sou-lhe grato pela distinção que teve para comigo.

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Pelo Desenvolvimento de Sergipe (1961). O livro é uma análise do Sistema Educacional de Sergipe, com uma introdução ao estudo do sergipano:

Formar o cidadão, e incutir-lhe o ideal de contribuir para o progresso e a melhora social, ou interesse em participar do esforço comum contra o atraso, a miséria, a fome, o privilégio, a injustiça, a exploração da mulher, a ignorância e a enfermidade é objetivo precípuo da educação para a Democracia, o desenvolvimento e o bem-estar geral.

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Velhos companheiros & outros escritos (1961). O jornalista Alberon Machado, publica artigo no jornal A Cruzada de 15 de agosto de 1963, sobre o lançamento de mais um livro e diz o seguinte:

Lembrou-se ele de velhos companheiros seus espalhados por esses brasis afora, principalmente aqueles que suspiram na ofegância murmural e parafrásica dos verdes rios tranquilos de Sergipe e mandou-se, para que me fosse dado o direito de convivência co as boas letras, um exemplar do referido livro.

Desde a introdução onde o autor de chapéu à mão inclina a cabeça e reverencia nomes como Whitman, Dostoievski e outros vultos que aqueceram a solidão da juventude as últimas páginas em que ele se despede dos leitores co u pedido a quem lhe pode atender de uma Universidade pra Sergipe, que faíscam as cintilações do seu pensamento e se cristaliza o arrojo das ideias.

É um serviço prestado, porque é um grande subsídio à literatura contemporânea, a obra polimorfa do professor Nunes Mendonça.

Nela um dique resiste às investidas contraditórias e as sombras se deslumbram à intercessão dos raios estrelares.

Não buscou em asas de Ícaro as regiões metafóricas da fantasia, pois, no seu livro a verdade estua, enquanto os sofismas se diluem porque não conseguiram existir acontecendo.

Inspirado num feito nobre que cometeu o colento Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, que lhe concedeu, quebrando as algemas da reação social o mandato de segurança impetrado contra o esbulho do seu direito adquirido no concurso que fez para a cátedra de Pedagogia do Instituto de Educação Rui Barbosa. Velhos Companheiros & outros escritos prova que a Justiça não é somente o único amigo que acompanha o homem depois da morte, segundo célebre sentença de imortal filósofo indu; ela também assiste aos vivos, bastando para isso que seja intangível e inconspurcável como a toga que a ornamenta e não vacila para todos os lados com as oscilações da folha do álamo.

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Walt Whitman

Walt Whitman – Foto: Reprdoução

Este ano o poeta completa 130 anos de morto e perpetuou por meio dessa arte um conjunto de ideias e sentimentos que em vez de dividir e frustrar os seres humanos, tendem de modo geral, a uni-los, satisfazê-los e realizá-los. Nenhum autor norte-americano com exceção de Poe e Longfellow, provocou controvérsias tão marcadas como Walt Whitman (1819-1892). Sobre esse poeta, ensaista e jornalista, José Nunes Mendonça publicou artigo no jornal A Estância e na revista da Academia Sergipana de Letras, nº11, abril, de 1946, “Whitman – o poeta universal da América. O poeta Freire Ribeiro (1911- 1975), comentou a Plaqueta de Nunes Mendonça, através de artigo publicado na Folha da Manhã, de 24 de setembro de 1944. Vejamos como ele se expressa:

De há muito que a inteligência ensolarada e numerosa do jovem conterrâneo se vem prendendo à vida de grandes vidas e de grandes cérebros.

Há pouco tempo leu a um interessante trabalho sobre o amargurado Criso do pensamento eslavo, esse gênio torturado que foi Dostoievski. Mas culminam todos os seus estudos e todas as suas observações no desvelamento feliz que nos dá de Whitman, através da sua obra, sua angústia, do seu desespero iluminado no ouvir e traduzir os anseios eternos e as eternas palpitações da vida, – na Natureza e no Homem, no admirável conjunto destas deliciosas páginas.

Esse bardo admirável, esse agigantado poeta da América, só compreendido na sua época pela figura estolar de Emerson, olhou cem anos além do seu meio e com visão profética, falou uma linguagem nova arrepiando os velhos d’alma estagnada, rasgando o bolorismo, o preconceito e o dogmatismo, porque a sua voz era a voz do futuro resplandecente.

(…) Nunes Mendonça é uma expressão forte dessa nova geração que faz da angústia um cântico e transmuda as trevas da dor humana num clarão de esperança no mundo de amanhã que virá para que todos se abracem em nome do Amor e da Liberdade.

Outro livro de Nunes Mendonça que teve boa repercussão no Estado, foi A Educação Sexual nas Escolas (libelo contra a ignorância e a maldade), publicado em 19 explica Nunes Mendonça na Introdução:

Julgamos-nos no dever de tornar pública nossa defesa, na parte que diz respeito à descabida acusação (acusação de ventilar assuntos de sexologia em nossas aulas e de fazê-lo de modo indecente), sobretudo para mostrar a necessidade de educação sexual nas escolas, principalmente nos cursos de formação de professores primários.

Roger Bastide

Roger Bastide – Foto: Reprodução

Sociólogo francês, à época professor na Sorbonne, em Paris, escritor de renome universal, que em 1938 veio, com outros professores europeus, à recém-criada Universidade de São Paulo para ocupar a cátedra de sociologia, supervisionar a organização da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. No Brasil Roger Bastide (1888-1974) estudou durante muitos anos as religiões afro-brasileiras, tornando-se um iniciado no candomblé da Bahia. Apesar de ser membro da Primeira Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo, o sociólogo francês iniciou-se no candomblé como filho de xangô. Uma de suas obras mais importantes O Candomblé da Bahia (1958). Outras obras publicadas no Brasil merecem destaque: Estudos Afro-brasileiros (1973) e Antropologia Aplicada (1979), ambas publicadas pela Editora Pesrpectiva, Coleção Estudos e As Américas Negras: as Civilizações Africanas no Novo Mundo (1974).

Em 1961 José Nunes Mendonça enviou ao sociólogo francês três exemplares dos seus livros, que enviou-lhe carta agradecendo os recebimentos dos livros:

Le 17 octobre, 1961

Meu caro colega,

Recebi suas três publicações: Pelo desenvolvimento de Sergipe, Sugestões para um plano de reivindicações no setor educacional e A Educação em Sergipe, que me chegaram durante as férias e, por conseguinte, não as encontrei senão na minha volta do Sul da França.

Acabei de lê-las com muito interesse e grande prazer, pois elas apresentam sob uma forma clara, apoiada numa documentação tão rica quanto objetiva, alguns dos problemas mais fundamentais do Estado de Sergipe, comuns a grande parte do Brasil. Pude verificar, eu próprio durante a minha estada em seu grande País, o acerto de algumas de suas críticas, como pude admirar também o heroísmo (a palavra não é muito forte) de algumas dessas professorinhas do interior (pelas quais guardo na lembrança uma admiração sem precedentes). Conheço as dificuldades, os obstáculos – e sei, também, que não poderão eles ser vencidos senão com uma visão lúcida e um plano preciso de ação (naturalmente com prioridade na realização). Desejo de todo o coração que seus livros – que se enquadram na grande e bela tradição de Fernando de Azevedo e de Anísio Teixeira – sirvam eficazmente ao progresso da educação brasileira, em extensão e em qualidade.

Ao lado da parte pedagógica, há neles uma outra que me interessou igualmente: é aquela sobre a ecologia, a sociologia e a cultura de Sergipe. As duas partes devem estar unidas, se queremos que a educação esteja ligada com o meio a ser transformado. Tudo que você diz sobre as áras do seu Estado é para mim apaixonante.

Agradeço-lhe a sua preciosa oferta, e peço-lhe creia, meu querido colega, nos meus melhores e mais devotados centimentos.

Foto: Reprodução Capa do livro Ciências Sociais Estudos Afro-brasileiros de Roger Bastide

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Um Escolanovista Sergipano

Foto: Reprodução Capa do livro Nunes Mendonça – um Escolanovista Sergipano, de autoria da professora Josefa Eliana Souza

Lançado na noite de 30 de janeiro de 2004, às 18 horas na Galeria de Arte Álvaro Santos, o livro Nunes Mendonça – um Escolanovista Sergipano, da autoria da professora Josefa Eliana Souza, trabalho publicado pela Editora UFS em parceria com a Fundação Oviêdo Teixeira, (2003), 231 páginas, resultado da pesquisa desenvolvida como dissertação de Mestrado em Educação (1994-1998), obtido na Universidade Federal de Sergipe –UFS (1994-1998). Orientada pelo professor Doutor Jorge Carvalho Nascimento, a pesquisa tinha título original, Em busca da Democracia: A trajetória de Nunes Mendonça. A professora Josefa Eliana Souza, concluiu seu doutoramento em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002-2006). O livro Nunes Mendonça – um Escolanovista Sergipano trata sobre as ideias escolanovistas que ganharam maior expressão, em Sergipe, na década de 50, período em que a História da Educação foi marcada pela ação de um intelectual que se revelou grande produtor de artigos e livros voltados, quase sempre, para as discussões pedagógicas. Vejamos o texto de José Nunes Mendonça Em defesa do curso pré-primário e das mães sergipanas, publicado no jornal O Nordeste (órgão do PTB, no Estado de Sergipe), edição de 23 de março de 1960:

O ensino normal vem de ser mutilado, a formação do professor primário vem de ser prejudicada, no Instituto de Educação Rui Barbosa, com a extinção do Curso Pré-Primário, anexo à Escola de Aplicação. Suprimiu-o o diretor do Instituto, que não tem absolutamente, competência legal para isso. Iniciativa nossa, quando à frente da Assistência Técnica da Casa, o Curso Pré-Primário foi oficializado por portaria do Diretor Geral do Departamento de Educação, tendo em mira exigências da Lei Orgânica do Ensino Normal.

Filho dileto de nosso idealismo, de nosso amor à criança, de nosso zelo pela formação do professor, o Curso Primário era “a menina dos olhos” do ex-Governador Leandro Maciel, como seria também do atual Governador, dr. Luiz Garcia, se S. Exa. o tivesse visto nos seus dias áureos, sob os cuidados da professora Marlene.

Os argumentos com que o diretor do Instituto, dr. Severino Uchôa, pretendeu justificar o seu ato, causariam estupefação e revolta, não os soubéssemos feitos de seus desconhecimentos total dos problemas educacionais, especialmente no que tange aos objetivos do referido curso e à formação do professor primário.

Quanto à declaração do dr. Uchôa, ao jornal A Cruzada, segundo a qual teria ele obedecido a uma “ordem” do INEP, ao extinguir o Curso Pré-Primário, julgámo-la totalmente destituída de fundamento. Não podemos pôr em dúvida a idoneidade técnica do INEP e, além disso, conhecemos o respeito que o seu ilustre diretor, o professor Anísio Teixeira, decota à autonomia dos Estados. O INEP jamais daria aos Institutos de Educação tão errônea quão ilegal orientação, muito menos sob a forma de “ordem”, pois, não se intromete nas administrações educacionais dos Estados, senão para cooperar com as mesmas, quando solicitado.

Reconhecemos no dr. Uchôa uma pessoa inteligente, um esforçado folclorista, um homem de fina verve, de grande senso de humor. Não nos impedem as nossas divergências de reconhecer-lhe e proclamar-lhe os méritos reais. Da educação, porém, força é confessar, entende ele tanto nós, de astrologia… Diretor de um Instituto de Educação desconhece as próprias Leis Orgânicas de Ensino Normal (federal e estadual) que prevê, como condição essencial a um estabelecimento dessa natureza, a existência dos cursos: infantil e primário, para a demonstração e a prática de ensino.

A idade pré-escolar é o período do desenvolvimento humano por excelência para a formação de hábitos mentais e sociais, para os ajustamentos da criança. E, em vista das transformações econômicas e sociais do mundo moderno e da falta de preparo da família para a tarefa educativa que lhe compete, cabe à escola cooperar com os pais, na assistência à criança, porto que não arrogue a si o direito de substituir o lar.

Os cursos infantis, cuja necessidade se faz sentir cada vez mais e cuja existência se impõe nos sistemas escolares, são essenciais nos Institutos de Educação, nos estabelecimentos destinados à formação do professor primário.

Os contatos com meninos em idade pré-escolar são indispensáveis ao aluno-mestre, para a formação de atitude científicas com a criança e o despertar do interesse pelos problemas da primeira infância. Através desses contatos, observam as professorandas o comportamento infantil, estudam os problemas da criança pré-escolar, com eficácia, a sua missão na comunidade.

Merecem reparos, por outro lado, as insinuações feitas pelo dr. Uchôa contra as mães sergipanas, através de uma nota lida em emissoras locais. Não fosse ele um homem de fora, um adventício que não conhece ainda a psicologia do sergipano e os nossos hábitos e costumes, saberia que a mulher sergipana é desvelada, como esposa e como mãe, e não descura os deveres do lar para dedicar-se a vadiagens, conforme insinuou. A mãe sergipana procura os cursos pré-primários, visando ao auxílio da escola para a educação de seus filhos, e jamais como meio de ver-se livres deles, para o ócio ou divertimento.

Sabem as mães sergipanas, que os cursos infantis não são “depósitos de crianças” com a finalidade de facilitar-lhe lazeres fora de casa. Estão elas convencidas do valor educativo e social desses cursos, e neles veem, também, “uma transição suave de lar para a escola primária.

Protestamos, em nome do sergipano, contra tão irrefletida censura, solidarizando-nos a mulher sergipana, injustamente ultrajada.

Houvesse o dr. Uchôa ouvido a douta Congregação do Instituo, onde avultam tantos valores do nosso magistério, certamente não teria perpetrado tão grosseiro erro contra o ensino normal e não teria cometido tão grande injustiça contra a mãe sergipana.

Estamos certos de que o Governador Luiz Garcia mandará restaurar o Curso Pré-Primário no Instituto de Educação, porque cremos nos propósitos de S. Exª. de servir a Sergipe.

Intelectual brilhante, conhecedor dos problemas sociais do nosso tempo, compreende S. Exª. Que “desenvolvimento e educação constituem um binômio de forte interdependência no complexo cultural” e que a eficiente formação do professor primário é problema vital para o ensino. Daí a nossa certeza de que a mutilação que vem de sofrer o ensino normal, no Instituto de Educação, será reparada pelo seu Governo.

Portanto, o livro sobre José Nunes Mendonça tem, também o sentido de tributar homenagem a um mestre marcado pelos confrontos.

N. R.

Não faz muito, a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, mantida pelo INEP, em seu nº 73 transcreveu um trabalho do professor Nunes Mendonça, publicado em O Nordeste, sob o título: Em Defesa do Ensino Normal, no qual combatia o autor pontos de vista do Sr. Inspetor Seccional do Ensino Secundário. Endossou, assim o INEP a argumentação segura do técnico sergipano, contra propósitos revelados, pelo referido Inspetor Seccional, de relação ao Instituto de Educação Rui Barbosa. Agora, volta o professor Nunes Mendonça a defender o ensino normal, confiado no alto descortino do Governador Luiz Garcia e dentro dos mais pacíficos princípios da moderna pedagogia.

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Além de publicar artigos fundamentados sobre problemas de educação e meniniscências de amigos, que o autor cuida com enternecido carinho, com o que se refere ao conhecimento do sociológico Florentino Menezes (1886-1959), dois trabalhos de fôlego se destacam – Whitman – o poeta universal da América e A atualidade de Dostoievski. São ensaios em que o professor Nunes Mendonça põe de manifesto a sua grande cultura e seu percuciente espírito de analista.

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[*] É jornalista e escritor. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com