GILFRANCISCO [*]

Sobre esse tema abordado nesse artigo, desconhecemos qualquer estudo sistemático sobre a Barra do Cotinguiba e os porquês de tantos artigos publicados na imprensa sergipana sobre a sua navegabilidade, discussão que vinha desde o final do século XIX. Por esse motivo, resolvemos incluí-lo como um capítulo dos apontamentos sobre a fábrica de tecidos Sergipe Industrial.

Durante a segunda metade do século XVI, a costa sergipana era frequentada por traficantes normando do pau-brasil. Era a barra do Rio Sergipe (Barra do Cotinguiba, como então era chamado, fato desconhecido no século XIX, pois o Cotinguiba era apenas um afluente) o ponto preferido por esses aventureiros. As embarcações que navegavam pelo longo curso do Rio Sergipe, que é o principal da bacia e que alcança o Oceano Atlântico na divisa dos municípios de Aracaju e Barra dos Coqueiros.

Barra é uma formação geológica que pode ocorrer nas desembocaduras de canais, estreitos, estuários, rios e outros cursos de água, devido à acumulação de material de aluvião. Neste ponto, é comum haver uma linha de rebentação, devido à diminuição da profundidade. Algumas barras podem formar ilhas, penínsulas, istmos, etc. Também se chama de barras às entradas estreitas dos portos, frequentemente obstruídos por areia ou uma mistura de materiais conforme a composição dos solos.

A Barra do Cotinguiba é formada por três rios: o rio Japaratuba nasce na serra da Boa Vista, na divisa entre os municípios de Feira Nova e Graccho Cardoso e desagua no oceano Atlântico, no município de Pirambu, atravessando áreas agrícolas com cultivos de cana-de-açúcar e coco. O rio Cotinguiba nasce na divisa dos municípios de Areia Branca e Laranjeiras e desemboca no Rio Sergipe, na divisa dos municípios de Laranjeiras e Nossa Senhora do Socorro, tem aproximadamente 50 km de extensão e finalmente o Rio Sergipe, que nasce no assentamento Santa Maria na Serra Negra, em Pedro Alexandre (Bahia) com uma extensão de 210 km. O Rio atravessa o Estado de Sergipe no sentido oeste/leste, separando a Ilha de Santa Luzia, até desaguar no oceano Atlântico, entre os municípios de Aracaju e Barra dos Coqueiros.

Foto: Reprodução

Entre 1910 e 1912 foram publicados na imprensa sergipana mais de três dezenas de artigos, cartas, editoriais, opinião e discurso parlamentar (pró e contra) sobre a questão da navegabilidade da Barra do Cotinguiba. Inclusive, o governo da União através do ministro da Viação, ordenou que para os estudos da obra da Barra, gastasse a quantia de vinte e cinco contos de réis, valor insuficiente para resolver um antigo problema da Barra do Cotinguiba.

Selecionamos alguns desses textos da acirrada polêmica, abordando os seus interesses comerciais e/ou políticos. Só para lembrarmos, que no século XIX houve vários encalhamentos e naufrágios, alguns com vítimas fatais. Vejamos: Em novembro de 1881 o vapor Alagoas da companhia Bahiana, naufragou ao entrar na barra desta cidade, perdeu-se totalmente à falta de maré, que estava vazia. Informa o Democrata que o prejuízo foi avaliado em mais de mil contos, computando o valor do carregamento.

A Província, Recife, órgão do Partido Liberal, nº 109 da edição de 1º de outubro de 1873, registra que ocorreram algumas rescisões contratuais com o governo de Sergipe, sob alegação das dificuldades que os contratantes encontraram para estabelecer a navegação na barra do Cotinguiba, como é o caso da firma Campos Cameron & C.

É antiga a preocupação com os naufrágios ocorridos na Barra do Cotinguiba, pelas autoridades. Todos sabiam e conviviam diariamente com o perigo, mas nunca resolveram o problema. Em 12 de janeiro de 1890, o Republicano nº 52, através da Capitania do Porto do Estado Federal de Sergipe, pelo Secretário Tito Rodrigues Sandes comunicava a todos, especificamente ao comércio marítimo que:

Em vista de pouca profundidade que atualmente se nota na Barra do Cotinguiba, nenhum navio poderá sair a mesma barra se o seu calado d’água por inferior a 11 pés ingleses, afim de evitar-se qualquer sinistro, tornando-se necessário para maior segurança que os comandantes de vapores de reboque façam medir o calado d’água dos referidos navios, quanto tiverem de rebocá-los.

Em 29 de janeiro de 1890, a Gazeta de Sergipe nº 23, publicava sobre a Barra de Aracaju:

Temos em mãos a memória impressa que, sobre o melhoramento da Barra do Cotinguiba e canalização de vários rios do Estado de Sergipe, escreveu o Dr. Eduardo José de Moraes, quando requereu do governo provisório a ratificar do contrato, que ultimamente fez com o governador do Estado.

Trata-se de uma empresa gigantesca e que deve trazer importantes melhoramentos para esta região.

Há um registro no jornal A Razão, nº 47 de 6 de dezembro de 1908, que no dia 22 de novembro sem o menor risco ou obstáculo, entrou no Porto de Aracaju procedente de Liverpool o paquete inglês “Navigator”, de 2.600 toneladas.

A Folha de Sergipe, órgão Republicano, propriedade do deputado Manoel de Carvalho Nobre, edição de 29 de novembro de 1908, através do artigo Pro Sergipe retoma o tema sobre a barra do Cotinguiba, afirmando que os boatos difundidos dentro e fora do Estado sobre os perigos de navegação no Rio Sergipe, fizeram com que passou a barra do Cotinguiba, passasse a ser uma das mais perigosas do norte do Brasil. Consequentemente dificultando o processo econômico do Estado de Sergipe, ao ponto de algumas companhias de navegação se recusarem a transportar cargas e passageiros pela barra, inclusive o Lloyd Brasileiro.

O texto da Folha deixa claro que tais informações divulgadas intencionalmente, só favoreciam a um grupo de empresários. Por falta de vapores concorrentes, motivaram elevação dos fretes na exportação de seus produtos. O artigo é longo e para comprovar a fraude, inclui uma tabela dos preços das passagens:

Maior anomalia se nota ainda, no preço das passagens de segunda classe. O passageiro de Aracaju paga 60$, fazendo um percurso de cerca de 900 milhas, ao passo que o de Maceió, fazendo 1.012, o Recife, fazendo 1.132, pagam apenas 34$, o de Cabedelo, fazendo 1.200, paga 34$, o de Natal, fazendo 1.280 paga 43$, o do Ceará fazendo 1.438, paga 45$, o de Tutoya, fazendo 1.798, paga 48$, o do Maranhão, fazendo 1.953, paga 51$000. Somente o passageiro do Pará, fazendo mais do dobro das milhas percorridas pelo passageiro de Aracaju, isto é, 2.315, paga um preço quase igual, isto é, 62$. Não pode haver maior iniquidade.

O autor da coluna Favos e Travos “Neves”, nesse mesmo jornal, ironicamente registra:

Apesar dos boatos que na ocasião surgiram relativos à entrada do Navigator, ele entrou bonito zombando da pouca água que existia na barra, prestes a transformar-se em uma verdadeira água suja.

A convite do coronel Jucundino Filho, agente da The Harrisson Line of Steamers, o Presidente da Província, Rodrigues Dória visitou no Porto de Aracaju o navio inglês Navigator, comandado por Westorp. Acompanhado de autoridades Baptista Itajahy (vice-presidente), João Maynard (chefe de polícia), Felizola Zucharino (presidente da Associação Comercial) e Aristide Fonte, representando o jornal O Estado de Sergipe, onde foram saldados a bordo pelo comandante da embarcação.

Em 1919, pela Barra do Cotinguiba foram exportados, no mês de junho, gêneros de produção nacional, para diversos pontos do país e do estrangeiro, do valor de 1.495:959$501, que pagaram de direitos ao Estado 123.501$766.

Entre os dias 5 e 6 de novembro de 1970, em plena ditadura civil-militar ainda se discutia à abertura da Barra de Aracaju. Segundo o editorial da Gazeta de Sergipe para se encontrar a saída para o potássio, sal-gema, magnésio e o petróleo, fator que impulsionava a administração do Porto, com os Roialtyes recolhidos na ordem de cem mil cruzeiros mensais. Era preciso de uma abertura para o mar, sob pena de ficar trancada toda sua riqueza, como reservas para os grandes colonizadores do mundo.

O Coronel José Benedito Montenegro, Superintendente do Porto de Aracaju, informou a reportagem da Gazeta de Sergipe que “os problemas atinentes ao Porto vêm se desenvolvendo por muitos anos, mas, já então sendo processadas as soluções para equacioná-los”. Disse ainda que a administração vinha tomando todas as providências “para pôr em funcionamento o Porto de Aracaju, e para tanto tem promovido, juntamente com o Inspetor Fiscal do Porto de Aracaju, os estudos batimétricos da barra, os quais foram executados pela C.B.C. Além dos estudos batimétricos, foram feitos estudos de sondagem geológica, por intermédio da Geotécnica, firma especializada no ramo, e sediada em Salvador”.

Dizem que a Assembleia Legislativa aprovou urgência para empréstimo de abertura da barra. Chegaram a concluso da não existência de suposta e profunda camada de argila, impermeável à ação de dragagem. Falavam até que o Banco do Brasil sensível ao problema abriu um crédito de Dois milhões de cruzeiros. E tinham previsão de começar os serviços de abertura do canal da barra, em novembro e se encerrar em março do ano seguinte.

Paquete

A navegação iniciada, em sentido amplo, com o domínio da astronomia como meio de orientação, expandiu-se com a invenção da bússola, que se teria dado na China do começo da Idade Média e adquiriu eficiência à medida que se desenvolveram os meios de propulsão dos barcos, desde os remos e as velas até a energia nuclear dos submarinos atômicos.

Paquete é a denominação dada aos antigos navios de luxo de grande velocidade, geralmente movidos a vapor. Estes navios faziam travessias regulares levando encomendas e correios além dos passageiros (eram navios de cargas e passageiros ao mesmo tempo). No século XIX, alguns armadores realizaram contratos com a Coroa da Inglaterra para levar o correio, ganhando o direito de usar o prefixo RMS (Royal Mail Ship).

Em 1837, foi criada no Brasil a Companhia Brasileira de Paquetes a vapor, iniciando a ligação do Brasil à Europa, passou a ser rotineira nos principais portos do Brasil. Temos notícias que entre 1807 e 1901 foram naufragados na Barra de Aracaju, mais de uma dezena de paquetes, entre os quais: Mary (1807), Emma Mathilde (1858), Elida (1867), Dois de julho (1867), Alagoas (1881), Zenóbia (1889), Luzitano (1889), Fantoche (1890), Serpa Pinto (1890) Alagoas (1893), Conselheiro Saraiva (1901).

Portanto, costuma designar paquetes, navios que faziam rotas regulares entre portos, carregando correspondência e mercadorias. Em algumas ocasiões, também transportavam passageiros. Evoluiu do veleiro ao navio a vapor, chegando a atingir 150 metros de comprimentos. Em alguns casos, possuía duas formas de propulsão: hélice e vela. Foi utilizado até o início do século XX.

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A Barra

Como um atestado que se oferece em abono da exposição das nossas necessidades, a barra do Cotinguiba deteve o paquete “Estrella” que transportou o eminente brasileiro Dr. Affonso Penna às plagas sergipanas, fora das dunas, às portas da cidade, que se apresentava para o receber.

Nessas longas horas de enjoo, sobre o inquieto dorso das vagas, o venerando viajante e os ilustres membros de sua luzida comitiva, tiveram tempo e ensejo de considerar sobre as condições da viação sergipana, nula por terra e assim deficiente por mar; e, certo, nas suas notas de viagem, esse incidente terá sido registrado, como uma necessidade digna de reparo.

Para nós que lamentamos sinceramente essa contrariedade na excursão de s. ex., sentimos que ali começa o proveitoso de sua visita ao pequeno Estado sergipano.

Ininterrompidas têm sido as reclamações deste povo aos altos poderes nacionais sobre as dificuldades de comunicação, a causa primordial do nosso atraso.

Somos um dos povos mais produtores da União Brasileira, competimos ao lado do grande Estado de Pernambuco, na exportação do açúcar e da lã, – no entanto todo o nosso trabalho é consumido nas despesas do transporte.

Vezes sem contar tem sido isto exposto e reclamadas providências aos governos, que, indiferentes, se quedam, duvidando talvez que os nossos males sejam tão graves como os inculcamos.

No entanto, s. ex. entrará para o governo agora com a própria experiência das nossas dificuldades.

Nesse estreito canal, a cuja face os nossos bem-vindos hóspedes passaram enfadonhas horas, nas idas e vindas do paquete “Estrella”, nessa porta que abre para o tranquilo recesso onde se mira a graciosa capital de Sergipe, reside toda história da nossa decadência.

Essa barra isola-nos do convívio do grande mundo e a sua inacessibilidade é o profundo sorvedouro das nossas economias.

Eis, pois, irrefragavelmente expedido, recebendo no limiar do Estado o futuro chefe da nação, o primeiro problema que o governo federal tem a resolver em Sergipe – a viação.

Caberá à certamente ao ex. conselheiro Affonso Penna a missão de decidi-lo pois que s. ex. assentiu-lhe os efeitos, e reflexionou por certo que, das unidades da Federação Brasileira esta que não é a menos produtiva, esta, que é um bem importante centro industrial, está privado da circulação frequente de suas riquezas da troca fácil dos seus produtos impraticabilidade da barra da Cotinguiba.

O problema da viação em Sergipe ex. sr. Eis tudo o que os sergipanos precisam.

(O Estado de Sergipe. Aracaju, nº2202 – 27 de maio de 1906)

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Navio em Perigo

Ontem às 5 horas da tarde encalhou nos bancos da barra do Norte um iate nacional, que pedia socorro.

É para lastimar que em nosso porto não tenha um rebocador para prestar serviços nestas ocasiões, pois, que o único que tem a Capitania do Porto, de há muito tempo que à falta do respectivo credito está encostado na praia da Fundição por falta de conserto.

Seria bom que o Governo do Federal lembrando-se de nossas necessidades neste ponto, desse logo as providências para ser consertado o pequeno rebocador de que tanto carecemos.

(Correio de Aracaju, nº 442 – 14 de agosto de 1910)

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Naufrágio

Confirmamos a nossa notícia da edição passada, sobre o navio que estava em perigo na barra, e que finalmente naufragou.

O sinistro foi motivado, segundo ouvimos dizer, devido ao sinal errado do balão da atalaia, que não cedeu aos movimentos regulares para dar decisão precisa a embarcação, por ter partido uma das adriças.

A carga era de 40 toneladas de carvão de pedra consignada a Peixoto & Cia, em Penedo, e não foi salva.

Compareceram ao lugar do sinistro o Sr. Inspetor da Alfandega e delegado fiscal que deram prontas e necessárias providências para conseguir a salvação da carga.

Os salvados acham-se depositados na Alfandega.

(Correio de Aracaju nº 443 – 17 de agosto de 1910)

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Obra da Barra

Vai para melhor de dois meses que o ilustre Sr. Ministro da Viação, num gesto de rico mal-humorado que despede um mendigo importuno, ordenou que se gastasse a quantia de vinte e cinco contos de réis com os estudos da Barra de Aracaju.

Vinte e cinco contos de réis. Não mais.

Dir-se-ia que o governo da União, em se tratando de serviço que redunde em benefício de Sergipe, não sabe contar além dessa quantia e aperta os cordões da bolsa com mãos crispadas pelos espasmos, do terror de empobrecer ou de ser roubado.

Já, há quatro anos, governando aqui o Sr. Guilherme Campos e governando l[a o seu grande padrinho Affonso Penna, solicitou o nosso governo do da União auxílio pecuniário para socorrer as vítimas da inundação na margem sergipana do São Francisco; e o governo da União, pelo ministério da Fazenda então a cargo do Sr. David Campista, mandou dar-nos vinte e cinco contos de réis.

É a datação máxima de Sergipe anotada pelo governo federal.

Esta irrisão de vinte e cinco contos de réis para estudos sérios de uma obra que é questão de vida e morte para Sergipe, esta irrisão – diga-se a verdade – prova que a nossa representação está acéfala no centro, ou que o centro trata a nossa representação com o máximo desdém.

Uma verba orçamentária, repetida de alguns anos para cá, marca para esse fim quantia muitas vezes maior do que a fixada pelo Sr. Ministro. E se a quantia decretada no orçamento já era escassa, o que dá sua redução se pode dizer se não que é um ludibrio e um escarnio?

Entretanto o forasteiro que aporta aqui admira-se de ver nestas paragens com o capital do mais deserdado dos Estados a mais elegante e faceira cidade do Norte, dandinando ao sol, assentada no seu xadrez, engalanada pelo coral dos seus telhados e pela esmeralda dos seus coqueirais.

Mas seus fados não lhe permitem livrar-se do engasgo da sua barra.

As correntes e os ventos ora a cavam e aprofundam, ora a obstruem.

Daí a dificuldade da navegação; a desconfiança dos armadores; a falta de concorrência dos transportes; a carestia do frete; o encarecimento dos nossos produtos; a morosidade na sua circulação; a impossibilidade de leva-los aos mercados consumidores a tempo e a hora de encontrar os preços mais compensadores; e daí, fatalmente, a diminuição da renda da exportação; a redução ou anulação do produto líquido; a impontualidade nos compromissos; o embaraço no comércio resultante do reembolso em dia dos adiantamentos feitos; o mal estar geral, o empobrecimento, o abandono do trabalho, a queda da coragem, a caça ao emprego público, a servilização do caráter, a abdicação dos direitos e sobre tudo isto e preá-mor da omnipotência do governo, um como milímetro gigante assentado na vasa, a marcar a descida até ao lado das águas puras que deslizaram desperdiçadas e inúteis para o mar.

Esperamos, pois, um Deus, que nos mande um desses imprevistos movimentos naturais, que, dispensando os vinte e cinco contos de Sr. Ministro, os estudos da sua engenharia, as suas barcas de escavação, as suas obras hidráulicas, as lotações, os contratos, as intrigas, os pequeninos cálculos políticos, rasgue uma estrada larga e profunda no delta do Cotinguiba para caminho franco da indústria sergipana, para via triunfal do nosso trabalho, para fácil aproximação de quem nos passa conhecer, julgar e estimar, mediante dados de VISU, colhidos in loco, flagrantes de exação e verdade, e não pelos informes de neurastênicos engraçados e escarninhos, de egoístas afeitos aos interesses de outras zonas, dos sergipanos bissextas de que falava Tobias Barreto, que só se lembravam que nasceram nesta terra, quando de quatro em quatro anos (hoje de três em Três) era mister solicitar o diploma de deputado.

(Diário da Manhã. Aracaju, nº6 – 8 de fevereiro de 1911)

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A Barra Navegável

É matéria sobre que convém mister a que diz respeito à navegabilidade da barra do Aracaju.

Por mais que as precauções, aliás, muito justificáveis dos práticos, procurem mantem a nota desfavorável que o canal do Cotinguiba granjeou, a evidência das sondagens últimas demonstra indiscutivelmente que o porto de Aracaju pode ser frequentado, sem perigo, ao menos, pelos paquetes da linha do Norte do Lloyd Brasileiro.

A verificação de um fundo de 16 pés em meia vazante, ultimamente feita pelo vapor Satellite, não é um fato novo, uma descoberta fortuita; ao contrário é uma confirmação de sondagens anteriores procedidas por competentes marinheiros que têm franqueado o canal da nossa barra.

E não é preciso, para sustentar o fácil acesso a vapores de maior calado, mais do que o fato de já ter sido ela transposta pelo paquete Sergipe, demandando 18 pés, e pelos cargueiros da Harrison Line e outras companhias estrangeiras que têm frequentado o porto de Aracaju.

De alguns anos a esta parte nota-se que as correntes do Cotinguiba, mantendo uma direção regular em sua carreira para o oceano, têm aprofundado constantemente o canal.

Auxiliada por circunstâncias naturais, como sejam formação de coroas em sítios por onde se escoavam, em outros tempos, as águas, e a obstrução de outras barras que antigamente concorriam com a chamada barra do Norte, que é o canal atual, a nossa porta marítima adquiriu certa fixidez e tende a cavar no leito arenoso mais profundo sulco.

É claro que, a cada dia que passa melhores vão-se tornando as condições de navegabilidade.

Ora, não há muito mais de dois anos que o paquete Sergipe, da linha do Norte do Lloyd Brasileiro, entrou, procedente de New York, carregado, neste porte, sem encontrar o menor embaraço.

É evidente, pois, que os outros paquetes do mesmo tipo podem frequentar sem perigo o ancoradouro do Aracaju. Podem mesmo fazê-lo, sem risco, navios de maior tonelagem.

Será suficiente estabelecer a vigilância devida, a dragagem oportuna, para que nada fique a temer.

É evidenciada a navegabilidade da barra, não haverá maior incúria do que dormir sobre a introdução dos grandes paquetes do Lloyd no comércio sergipano.

Insistimos, em consequência, no assunto, reclamando a atenção dos representantes de Sergipe nas duas casas do parlamento.

(Diário da Manhã. Aracaju, Ano II, nº 442 – 29 de agosto de 1912)

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A Barra Navegável

Dando agasalho em nossas colunas à carta que nos endereçou o Sr. João de Oliveira, diretor da Associação da Praticagem, nesta cidade, o fazemos com a maior satisfação.

Antes, porém, das observações que sobre ela vamos escrever queremos que fique desde logo bem acentuado que, na campanha, em boa hora por nós iniciada, no sentido de opor óbices às notícias adrede espalhadas de ser perigoso o acesso à barra do Cotinguiba pela sua pouca profundidade, nós não anima a mais mínima animadversão contra a associação de Praticagem, nem é nosso intuito molestar a quem quer que seja.

É nossa convicção, entretanto, baseada em informações que não podemos repelir, que a barra do Cotinguiba está em condições de navegabilidade para qualquer dos paquetes da linha do Norte do Lloyd, a despeito da afirmativa do honrado missivista de que Sergipe, em 1910 galgou os bancos da barra calando 13 ½ pés, tendo também o Satellite entrado em meia vazante encontrando 16 pés de profundidade.

Seja, como afirmamos, a profundidade da barra de 16 pés em meia vazante, seja, como o declarou o órgão oficial, de 16 pés na jusante – o que não sofre contestação é que a porta de Aracaju pela via marítima, em preamar, oferece aos que a demandam um fundo de mais de 18 pés.

E, nestas condições a profundidade é tal que, sem o menor risco para vidas e valores, poderá transpô-la qualquer dos vapores do Lloyd.

É bom insistir, nos aconselha o missivista: mas, com verdade e sinceridades na campanha em prol dos grandes interesses de Sergipe, a que está ligada, primeiro que tudo, a navegabilidade de sua mais importante barra – a do Cotinguiba.

Insistiremos, sim e, como sempre, em deixarmos de ser sinceros e sem faltarmos à verdade.

Para isso, precisamos também do auxílio do ilustre missivista e de seus dignos companheiros, que nos não negarão informes indispensáveis para levarmos a bom termo a nossa campanha.

Assim, pois, prestaria o operoso preopinante real e inestimável serviço aos créditos da barra de Aracaju, si nos informasse, o que acreditamos fará sem demora, qual a profundidade exata da barra, nas suas fases essenciais baixa-mar, maré média e preamar.

E aqui ficamos na perspectiva de sermos atendidos.

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Amo Sr. coronel Apulchro Motta

Afetuosas saudações

Muito entristecido fiquei com a leitura do artigo editorial publicado no nº442 do vosso Diário da Manhã sobre a navegabilidade da barra do Cotinguiba. Poderia dispensar-me de fazer qualquer consideração sobre este assunto depois do que foi publicado, graças vossa bondosa gentileza na edição de 29 deste mês cadente do apreciado Diário sob vossa digna e competente direção; mas ainda por amor a verdade e para que não sejamos acoimados, todos nós da associação de que sou humilde diretor, de inimigos da barra e consequentemente da navegação e engrandecimento deste nosso querido torrão natal, devo vos informar que não é exato que o paquete Sergipe tenha entrado neste porto calando 18 pés, o que não me admira seja publicado por quanto pelas colunas do Correio de Aracaju já foi dito que o Gladiador da Harrisson Linse fez a mesma espanholada calando 25 pés!

O Sergipe entrou neste porto no dia 28 de janeiro do ano de 1910 carregado em 13 e ½, pés de calado conforme podereis verificar da escrituração desta associação.

O jornal oficial do Estado publicou que o Sr. Comandante do paquete Satellite “marinheiro experimentado” sondou, virou e mexeu a barra, enveredou pelo canal, saiu aos bancos, beijou coroas e mergulhou de prumo na mão, e afinal encontrou fundo de 16 pés de calado em completa baixa mar e nesse artigo referido dizeis 16 pés em meia vazante. É bom insistir; mas sejamos sinceros e verdadeiros.

Associação de Práticos em Aracaju, 30 de agosto de 1912 – João Joaquim de Oliveira, Diretor Prático-mor.

(Diário da Manhã. Aracaju, nº 445 de 1º de setembro de 1912)

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[*] É jornalista e escritor. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com