GILFRANCISCO [*]
No Brasil, a televisão seguramente tem uma importância maior do ponto de vista cultural do que nos países adiantados, dada a maior penetração da cultura impressa no país. A primeira transmissão foi realizada em setembro de 1950, em São Paulo, pela PRF3- TV, futura Tupi (hoje SBT). Nos primeiros anos, as transmissões eram ao vivo, improvisadas, ou ensaiadas, como as peças de teatro televisionadas, muito importante na época.
Primeira emissora de televisão baiana, inaugurada no dia 19 de novembro de 1961, veio por intermédio dos Diários Associados, afiliada da TV Tupi. Tudo começou em 1956, quando Assis Chateuabriand (Chatô) fundador da TV Tupi de São Paulo, resolveu adquirir nove emissoras de TV em várias grandes cidades do Brasil, com a intenção de instalar antenas transmissoras em cada uma delas, tendo a finalidade de transmitir a programação da Rede, entre 1960 a 1970 alcançando grande popularidade, com vários artistas do Sul do país que vinham fazer programas semanais, como Luiz Vieira, que tinha um programa semanal de grande audiência “Sou o menino-passarinho com vontade de voar…” Pernambucano de Caruaru (12 outubro, 1928), faleceu a 15 de janeiro de 2020, aos 91 anos.
Outros como Luiz Wanderley, Sergio Bittencourt, Paulo Silvino apresentavam um tema novo que era sobre “OVNIs” até mesmo o apresentador Flávio Cavalcanti realizou por várias vezes o programa musical Um Instante Maestro.
Os Associados possuíam na Bahia além da Rádio Sociedade da Bahia, merecedora de destaque por ser a PRA-4, a terceira emissora de rádio no país a ter um canal internacional de ondas curtas, com faixa exclusiva e transmissores de 100 quilowatts de potência, ouvida no mundo inteiro durante a II Guerra, dois jornais – O Estado da Bahia, vespertino, e o Diário de Notícias, matutino.
A TV Itapoan, único canal da capital baiana, ainda em preto & branco, com uma novela por dia, gravada em videotape, meia dúzia de séries cinematográficas americanas, e a programação ao vivo produzida por gente da casa, – Escada para o Sucesso, de Newton Paes, que lançou para todo o Brasil Cynara e Cybele, mais tarde com o ingresso de mais duas irmãs passou a chamar-se Quarteto em Cy. Os irmãos Caetano e Maria Bethânia também foram lançados através do vídeo da TV Itapoan.
José Jorge e Jorge Santos faziam aos sábados um programa de quatro horas intitulado “JJ Comanda o Espetáculo” no qual lançou nomes como Gilberto Gil, que à época, compunha jingles comerciais. Gil era diretor musical da J.S., a primeira gravadora da Bahia fundada por Jorge Santos, que aproveitando a oportunidade gravou em 1965 seu primeiro compacto simples com as faixas Povo Petroleiro e Coça Coça Lacerdinha, marchinha de gozação com uns mosquitos que invadem Salvador:
Povo Petroleiro
Está jorrando petróleo
Jorrando, jorrando noite e dia
Está jorrando petróleo
Nas terras da nossa Bahia
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Nosso petróleo
É ouro brasileiro
Ele é o orgulho
De um povo petroleiro
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Coça, Coça, Lacerdinha
Coça, coça, coça
Ai que coceirinha,
A coceira é gostosa
Quando morde o lacerdinha.
Morde na mão
Morde na cabeça
Morde, morde sem parar.
No pescoço já no umbigo
Está ficando difícil de coçar.
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A inauguração oficial ocorreu na Praça da Sé, onde foi erigida a partir de 1552, nas suas primeiras fundações, pelo famoso Bispo Sardinha, onde pregavam Antônio Vieira e Eusébio de Mattos, teve sua demolição iniciada em 7 de agosto de 1933. A igreja ficava no espaço compreendido entre a Santa Casa de Misericórdia e o Palácio da Arquidiocese, a antiga Assembleia Legislativa do Estado. A cerimônia foi transmitida ao povo baiano diretamente do Belvedere, defronte do prédio da casa A Primavera.
A atração principal era a família Caymmi, além da prata da casa, como Riachão. Estávamos presentes juntamente com meus dois irmãos, Edimilson e Jacy. Lembro-me que foram colocados oito aparelhos de TV ao redor de uma estátua ou de um poste, numa determina altura para que o povo pudesse assistir a transmissão. A Praça estava lotada. Ficamos até o final do espetáculo, não tínhamos pressa, pois, morávamos próximos, no pé da Ladeira da Praça, no prédio de número 77.
Quando eu tinha 11 ou 12 anos, morando no Bairro da Caixa d’Água, longe do Centro, me associei a uma família de classe média que morava na Baixa das Quintas, ao lado do prédio onde hoje funciona o Arquivo Público do Estado, na época era uma grande serraria. A casa era de andar, recuada e toda gradeada, tinha um quintal enorme todo frutífero. Mamão, manga, jaca, araçá, pitanga, cana e outros frutos. A gente se lambuzava de prazer, não me recordo de brigas. Era uma alegria contagiante. A família era numerosa talvez composta de oito ou nove irmãos, fora os agregados. Lembro-me dos nomes de dois Odilon e Adilson. A residência nos anos oitenta pertencia aos Belov (ucranianos) o navegador solitário que viajou pelo mundo. Em 1998 fui colega no curso de mestrado na Universidade Federal da Bahia, de Olga Belov (já falecida) irmã do navegador.
Diariamente ao retornar do Colégio Severino Vieira, juntava-me aos amigos Eduardo Caetano Leão (Leão) e seu irmão Jorge (Branquinho) íamos à casa de Odilon ensaiar as danças de rock e twist para apresentação nos programas musicais de calouros da TV Itapoan, realizados nas tardes de sábados e domingos. Odilon tinha tudo que precisávamos para os ensaios na garagem: uma radiola Philips e bons Long Play do momento. A radiola era de fabricação Holandesa e tinha um adaptador para os discos americanos que tinham um diâmetro maior do orifício, onde encaixava o disco. Sem esse adaptador era impossível ouvir os discos americanos em radiolas brasileiras.
Na época, os comerciais da TV eram ao vivo, realizados por três garotas propaganda: Susy Cordeiro, Laura e Pilar. Como fazíamos parte dos calouros tínhamos acesso aos camarins, acabamos conhecendo alguns artistas da terra e outras estrelas nacionais. E logo conheci Gilberto Gil, gordinho com uma voz encantadora e um jeito todo especial de compor e cantar. Fui reencontra-lo no início de 1970 pelas mãos do colega Afrânio Deolino de Oliveira antigo amigo da adolescência. Ele recebera de Gil um recado que queria vê-lo e estava na casa da tia, no Bairro Santo Antônio, próximo a Cruz do Pascoal. E fomos numa manhã de sábado revisitar seu amigo. Nos anos 90 fui apresentado por minha namorada professora Diana, a sua ex-esposa Belina Moreira, mãe de Marília que reencontrei no batizado de seu neto Pedro, nome dado pela mãe em homenagem ao irmão e também músico Pedro Gil (baterista do grupo de rock carioca Egotrip), morto num acidente automobilístico em 25 de janeiro de 1990, aos dezenove anos.
A realização em 1962 do Show dos Novos (programa de calouros) cuja abertura era feita por Gilberto Gil, proporcionou a revelação de vários cantores baianos, Tom e Dito, Antônio Carlos e Jocafi, Maria Creusa.
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[*] É jornalista e escritor. E-mail: gilfrancisco.santos@gmail.com
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